Eleições na Argentina|z_Areazero
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25 de outubro de 2019
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16:23

‘O povo argentino entendeu que o neoliberalismo só traz danos e perda de direitos’

Por
Luís Gomes
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Claudio Morresi foi secretário de Esportes do governo de Cristina Kirchner e agora é candidato a deputado federal | Foto: Arquivo Pessoal

Luís Eduardo Gomes
De Buenos Aires

Claudio Morresi, 57 anos, é um dos candidatos que encabeça a lista de postulantes a um mandato de deputado federal da Frente de Todos, chapa de Alberto Fernández e Cristina Kirchner, nas eleições deste domingo (27). Ex-ministro de Cristina e militante do campo dos direitos humanos, Morresi conversou com o Sul21 nesta sexta-feira (25) sobre o desempenho do atual presidente, Maurício Macri, e o cenário político do país.

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Ex-jogador de futebol durante 12 anos, com passagens por diversos times grandes do país, Morresi foi secretário de Esportes do governo Cristina Kirchner, o que equivaleria ao cargo de ministro de Esportes no Brasil — a pasta não é um Ministério na Argentina. Entre os títulos que colecionou na carreira, estão os de campeão da Copa Libertadores e do Copa Intercontinental com o River Plate, em 1986.

Mas a militância de Moressi precede a chegada ao governo e até mesmo a carreira futebolística. Em 1976, quando ele tinha 13 anos, o irmão de 17 foi desaparecido pelo regime militar. “Como milhares de argentinos”, pontua. “A partir desse momento, participo das lutas por memória e justiça”. Foi essa a trajetória que o levou a militar no campo dos direitos humanos.

A seguir, confira e entrevista do Sul21 com Claudio Morresi.

Sul21 – Como está a Argentina está hoje em termos de direitos humanos?

Claudio Morresi: Houve um retrocesso impulsionado pelo governo ao não acompanhar as políticas de memória e justiça. É um governo que se relaciona muito melhor com os setores que acompanharam no campo econômico e com alguns métodos o que acontecia no tempo da ditadura. Quiseram implementar algumas leis, como a de “Dois por um”, mas foi tal a resposta do povo argentino que tiveram que recuar.

Sul21 – Qual foi essa lei de “Dois por um”?

Morresi: Era uma lei que beneficiava os genocidas. Cada ano que estavam na prisão, contabilizaria por dois. Isso faria com que saíssem da prisão muito antes.

Sul21 – Como foram os atritos de Macri com as organizações de direitos humanos?

Morresi: Macri constantemente tem desvalorizado e tratado de fazer desaparecer as políticas de direitos humanos. Também tratou de desvalorizar todos os organismos que são reconhecidos no mundo por políticas de memória e justiça com frases ofensivas, com o fato de não recebê-los, com o fato de fotografar-se e apoiar algumas ações das forças de segurança que claramente violam os direitos humanos. Recebeu e apoiou um membro das forças de segurança que assassinou uma pessoa pelas costas, depois tem tudo que ocorreu no sul, com o tema de Santiago Maldonado [manifestante argentino pelos direitos indígenas que desapareceu e foi encontrado meses depois morto em um rio]. Muitas ações que demonstram que ele está em outro campo na luta dos direitos humanos.

Claudio Morresi (esq.) no tempo de jogador do River Plate | Foto: Arquivo Pessoal

Sul21 – No Brasil, Bolsonaro também se elegeu com uma bandeira “anti-direitos humanos”. É possível comparar os dois?

Morresi: Eu acredito que há um elo condutor nos pensamentos tanto de Bolsonaro e de Macri como de alguns outros líderes de países neoliberais, digamos assim, de direita, de alguma maneira apoiados em políticas repressivas e que atentam contra os direitos das maiorias e beneficiam minorias privilegiadas que compõem com eles. De alguma maneira, acordam com sua forma de pensar e atuar, consequentemente.

Sul21 – Sobre o cenário político, como tu avalias o pleito de domingo?

Morresi: Acreditamos que a maioria do povo argentino entendeu que essas políticas neoliberais só produzem dano, retrocesso, perda de direitos, e claramente vai apoiar Alberto Fernández, que vai em busca de ações e decisões que vão beneficiar as maiorias e talvez cortem privilégios de algumas destas minorias, mas será um país mais justo e igualitário quando isso ocorrer.

Sul21 – Quais serão os principais desafios de Fernández?

Morresi: Criar a possibilidade de que haja trabalho para a grande quantidade de argentinos que estão sem trabalho, tirar de abaixo da linha da pobreza as mais de cinco milhões de pessoas que Maurício Macri colocou lá e avançar na reacomodação da economia. A dívida que nos deixa o macrismo é algo impensado, irreal, vai custar muito sacrifício do povo argentino para poder pagá-la. Vai ter que haver uma grande negociação para ver de que maneira se poderá pagar, o que vai se poder pagar e de que forma, porque a Argentina não pode sacrificar gerações para benefício econômico de um grupo que levou os dólares que ingressaram com o empréstimo do Fundo Monetário Internacional (FMI).

Sul21 – Para finalizar, quais as perspectivas para o futuro da Argentina?

Morresi: Vamos viver tempos difíceis, mas o esforço será grande e será justo. Acredito que isso também vai se irradiar por outros países da América. Tenho grande fascinação e admiração pelo Brasil, esperamos que isso também cresça no Brasil e que um grande presidente que tiveram, que é Lula, possa ser libertado e conduzir o povo prontamente.

A equipe do Sul21 viajou a Buenos Aires para a cobertura das eleições presidenciais graças a um financiamento coletivo dos nossos leitores.


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