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8 de fevereiro de 2019
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18:27

Nota do Ministério da Saúde vai contra reforma psiquiátrica e permite eletrochoques

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Sul 21
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Nota do Ministério da Saúde vai contra reforma psiquiátrica e permite eletrochoques
Nota do Ministério da Saúde vai contra reforma psiquiátrica e permite eletrochoques
Reforma psiquiátrica promove cuidado em liberdade | Foto: Guilherme Santos/Sul21

Da Redação*

Desde o golpe que afastou Dilma Rousseff da presidência em 2016, o governo de Michel Temer vinha tomando decisões referentes à política de saúde mental, álcool e drogas que iam contra o determinado na Lei da Reforma Psiquiátrica, de 2001. Agora, uma nota técnica divulgada no início da semana pelo novo Ministério da Saúde explicita as ‘mudanças na Política Nacional de Saúde Mental e nas Diretrizes da Política Nacional sobre Drogas’, incentivando internações hospitalares – inclusive de menores de idade – e permitindo eletroconvulsoterapia (eletrochoques).

O texto foi elaborado pela Coordenação-Geral de Saúde Mental, Álcool e Outras Drogas do governo de Jair Bolsonaro (PSL) e “esclarece” as medidas que já foram implementadas entre 2017 e 2018. A nota explica e legitima alterações que já ocorrem na prática e que representam o desmonte da reforma psiquiátrica.

O documento estimula o fortalecimento das internações em hospitais psiquiátricos e das comunidades terapêuticas – criticadas por muitos militantes anti-manicomiais por serem, em sua maioria, instituições religiosas e que trazem a abstinência como solução para o vício em álcool e drogas.

Em junho do ano passado, o Conselho Federal de Psicologia divulgou um relatório sobre as violações encontradas em 28 nessas comunidades. Após serem vistoriadas em outubro de 2017 em ação conjunta do MPF (Ministério Público Federal), do Conselho Federal de Psicologia e do MNPCT (Mecanismo Nacional de Prevenção e Combate à Tortura), foi identificado que ocorria privação de liberdade, trabalhos forçados e internação de adolescentes e castigos físicos.

Também fica explicitada a posição contrária à legalização das drogas e a crença na abstinência como forma ideal de tratamento – em oposição à redução de danos, defendida na Reforma. A eletroconsulsoterapia é citada como um possível ‘aparato terapêutico’ que pode ser oferecido pelo SUS para a população, e fica explicitado também que não há “restrições absolutas para o atendimento de pacientes menores de idade nos Serviços da RAPS”.

Audiência pública debateu política de saúde mental no Estado em 2016 | Foto: Guilherme Santos/Sul21

Há anos, com a reforma psiquiátrica, os governos promovem o fechamento dos hospitais psiquiátricos e a criação de leitos em hospitais gerais para pacientes com sofrimento psíquico. Agora, a nota volta a incluir oficialmente os hospitais psiquiátricos como parte das RAPS, defendendo que devem “ter qualidade para receber pacientes para internações humanizadas e com vistas ao seu retorno para Serviços de base territorial, assim que possível”.

Resposta do governo

Segundo reportagem do Estado de S. Paulo, o ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta disse não conhecer o documento. O texto é assinado pelo Coordenador Geral de Saúde Mental, Álcool e Outras Drogas do Ministério da Saúde, Quirino Cordeiro, que defendeu a necessidade de se orientar os gestores sobre a política de saúde mental quando questionado sobre a eletroconvulsoterapia.

Desmonte local

Em novembro de 2018, governo de Michel Temer cortou o repasse de R$ 77,8 milhões destinados aos Centros de Atenção Psicossocial (CAPs) em todo o país, afetando 25 estabelecimentos no Rio Grande do Sul. A decisão foi considerada por especialistas como o início do desmonte da reforma psiquiátrica.

Alguns meses antes, em Porto Alegre o prefeito Nelson Marchezan Jr. (PSDB) inaugurou os primeiros leitos do Hospital Santa Ana, instituição construída em parceria com a Associação Educadora São Carlos (Aesc), para internação de adolescentes com dependência química. De acordo com a Secretaria Municipal de Saúde (SMS), a iniciativa faz parte de uma reformulação da rede de atendimento psicossocial, mas movimentos ligados ao tratamento humanizado da saúde mental temem que possa se tratar de um retorno à lógica manicomial.

No Rio Grande do Sul, já houve iniciativas contrárias à Reforma desde 2015, quando o ex-governador José Ivo Sartori (MDB) foi duramente criticado pelos movimentos por colocar à frente da Coordenadoria de Saúde Mental Luiz Illafont Coronel, que defendia a lógica de internações e o fortalecimento dos residencias terapêuticos. A gestão de Sartori voltou a direcionar pacientes para o Hospital São Pedro. Um dos momentos mais emblemáticos do início da administração passada foi a proibição de entrada do público ao hospital, onde ocorria a apresentação da nova política de saúde mental.

*Com informações do Estadão e da Ponte


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