Reforma política e publicidade: no que é preciso prestar atenção na campanha eleitoral de 2018?

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Sul 21
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Cavaletes de campanha eleitoral de 2014 nas ruas da Capital. Foto: Ramiro Furquim/Sul21.com.br

Giovana Fleck

Historicamente, as candidaturas no Brasil sempre tentaram se fazer presentes na vida do eleitor. Seja por meio de jingles-chiclete, cavaletes que ocupam mais espaço nas ruas do que os pedestres, quilômetros seguidos de muros estampando rostos e números de candidatos ou outdoors com frases chamativas. Para além das urnas, a propaganda eleitoral se mistura com a cultura popular.

Alguns publicitários ficaram marcados pelos cases de sucesso que reverberam na memória dos brasileiros, como Paulo de Tarso com o “Brilha uma estrela” (o famoso “Lula lá”) e José Raimundo de Castro com o “Ey, Ey, Eymael”.

No entanto, 2018 será diferente. A campanha começou, oficialmente, na quinta-feira (16), após a conclusão dos registros das candidaturas. Entre as mudanças para este pleito estão as novas delimitações de publicidade previstas na reforma política, sancionada pelo presidente Michel Temer em outubro de 2017, um dia antes do prazo máximo previsto pela Justiça Eleitoral para que novas regras fossem implementadas.

Entre as principais diferenças, além da própria regra de financiamento – que proibiu doações empresariais -, está a nova regra de corte que define a exposição dos candidatos no rádio e na televisão, além da regulamentação de impulsionamentos pela internet e a manutenção do corte de tempo de campanha pela metade, de 90 para 45 dias. “O centro das mudanças promovidas pela reforma para essa eleição ficou em dois pontos: no financiamento e na propaganda. Os dois caminham sempre juntos em uma campanha, a grande máxima, no entanto, permanece. Quem tem mais dinheiro acessa mais pessoas”, define a advogada eleitoralista Maritânia Dallagnol.

Cláusula de desempenho

Segundo Maritânia, o mecanismo conhecido como ‘cláusula de desempenho’ foi estabelecido dentro da reforma para fortalecer a representatividade dentro do sistema democrático. “Muitas siglas acabam sendo criadas sem fundamentos ideológicos ou sem uma proposta a ser seguida. Seguem questões ocasionais, de interesse de grupos – viram um balcão de negócios. Essa é uma regra bem-vinda, que visa o fortalecimento da representatividade”.

A cláusula exige que partidos atinjam um percentual mínimo de votos ou elejam nove deputados em nove estados para ter acesso à divisão das verbas do fundo partidário e ao tempo de rádio e TV. Tal fator contribuiu para interesses de coligações e negociações de apoio a determinados candidatos, já que exposição pode significar a sobrevivência das legendas ao serem pautadas pela opinião pública.

A regra, no entanto, terá evolução gradual com o passar das eleições. Em 2018, a exigência será de 1,5% dos votos válidos distribuídos em ao menos nove estados. Deverá atingir a porcentagem máxima estabelecida pelo Executivo em 12 anos – 3% em 2030.

No caso dos debates, a exigência ficou menor para os presidenciáveis. As emissoras terão de convidar candidatos filiados a partidos que tenham ao menos cinco deputados federais. Antes, a exigência era nove parlamentares.

Durante a programação normal, no primeiro turno, as emissoras de rádio e televisão têm que veicular dois blocos diários de 25 minutos. Se houver segundo turno, serão dois blocos diários de 10 minutos.

A exigência também deve influenciar as estratégias das legendas que ficam ameaçadas pela nova regra. Maritânia ressalta que, com receio de perder recursos do fundo partidário e tempo de TV, partidos sem uma militância ativa e com candidatos à presidência e aos governos pouco conhecidos devem direcionar seus nomes mais fortes para disputar vagas na Câmara. O cálculo feito é que nomes mais conhecidos vão atrair mais votos e, assim, poderão eleger uma bancada mais numerosa.

Foto: Bernardo Jardim Ribeiro/Sul21.com.br

De 90 para 45 dias

Assim como na campanha de 2016, o período total destinado aos candidatos será menor. Em vez de 90 dias serão 45 dias. “É uma regra que colabora para a ideia de que campanha tem que ser mais barata. Mas reduzir custo de campanha pode significar um custo para a democracia, já que tempo menor de exposição beneficia aquele candidato que já tem espaço na mídia”, alerta Maritânia. Ou seja, na prática, fica mais difícil para nomes novos se elegerem.

Ainda assim, a advogada explica que a reforma deixa brechas para a maneira como será interpretada a propaganda na internet. A regra estabelece que os candidatos não podem patrocinar conteúdo em páginas ou sites de terceiros, mas não há restrições quanto ao impulsionamento em seus próprios perfis. “A lei deixa a internet quase que como um ambiente livre. Desde que não se ofenda ninguém, pode-se fazer propaganda.”

Em reportagem publicada pelo Sul21 em junho, candidatos ao governo do Rio Grande do Sul como Mateus Bandeira (Novo) e Roberto Robaina (PSOL) já mostravam como se utilizavam de estratégias nas redes sociais para alavancar suas candidaturas. Com os menores índices de intenção de votos nas pesquisas – 2,1% e 3,7 %, respectivamente – ambos vêm concentrando suas abordagens em vídeos para provocar maior interação com o público.

Maritânia também destaca que, ao contrário do rádio e da televisão, pela primeira vez os candidatos poderão fazer campanhas na internet no dia da eleição. “Isso pode destacar estratégias interessantes”, diz, em referência a uma possível mudança de posição, mais agressiva.

Quanto às notícias falsas, que podem ser utilizadas como estratégia de disseminação rápida de ideias, a advogada afirma que vê a aplicação das regras eleitorais com “preocupação” para barrar esse tipo de conteúdo. “A Justiça Eleitoral vai ter que ter um olhar muito atento para isso. É algo que pode definir regras mais rígidas em uma atualização posterior da reforma.” Ainda assim, ela destaca que a lei é clara ao diferenciar ‘notícia falsa’ de ‘fraude’. “A fraude é tudo aquilo que ganha uma aparência de verdade para enganar o eleitor. Já a notícia falsa implica em desinformação, ou disseminação de boatos. São coisas julgadas de formas diferentes”, resume.

É importante atentar para o fato de que o WhatsApp não pode ser usado para enviar propaganda sem consentimento prévio.

Gráfico: Giovana Fleck/Sul21

E nas ruas?

As proibições são claras para cavaletes, murais, faixas, bandeiras e cartazes: esses materiais não podem ser colocados em vias públicas, exceto em mesas para distribuição de material, desde que não atrapalhem o trânsito e os pedestres.  As campanhas não podem distribuir brindes ou presentes e está vetada a participação de artistas em comícios, assim como o uso de bonecos e outdoors eletrônicos.

Os partidos e as coligações só poderão utilizar alto-falantes ou amplificadores de som nas suas sedes ou em veículos, das 8h às 22 horas. Carros de som e minitrios só poderão ser usados em carreatas, caminhadas e passeatas ou durante reuniões ou comícios, observado o limite de 80 decibéis. O horário para o uso de aparelhagem de sonorização fixa é mais flexível, das 8h à meia-noite, podendo ser prorrogado por mais duas horas quando se tratar de comício de encerramento de campanha.

Os adesivos com propagandas de candidatos podem ser colados em automóveis, caminhões, bicicletas e motocicletas. Adesivos microperfurados podem ser fixados em toda área do para-brisa dos carros particulares. Caso o adesivo seja colado em outra posição do veículo, ele não pode ultrapassar a dimensão máxima de meio metro quadrado.

A distribuição de material gráfico será feita até a véspera do primeiro turno, em 6 de outubro. Um dia antes, em 5 de outubro, será permitida a divulgação paga, na imprensa escrita, e a reprodução, na internet, do jornal impresso, de até dez anúncios de propaganda eleitoral, por veículo, em datas diversas, para cada candidato, no espaço máximo, por edição, de 1/8 (um oitavo) de página de jornal padrão e de 1/4 (um quarto) de página de revista ou tabloide.

Quanto aos resultados da reforma, Maritânia observa que ainda falta clareza e objetividade, especialmente para que os eleitores dominem as novas regras. “Me parece que nós não conseguimos atingir aquele objetivo de fazer uma objetiva reforma política. Fica-se numa reforma pontual da legislação eleitoral. Da forma que está, irá privilegiar candidaturas com poder econômico, o que não contribui para uma renovação efetiva. Ela tende a manter o status quo“, afirma.


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