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17 de junho de 2018
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16:04

‘Quando o eleitor vira fã’: Até que ponto o Facebook pode influenciar as eleições de 2018?

Por
Sul 21
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“Apelo emocional e campanha por determinadas causas ganham força”, diz pesquisador. (Foto: Guilherme Santos/Sul21)

Giovana Fleck

“Não farei acordo com o diabo para ter tempo de TV”. A frase é do deputado federal Jair Bolsonaro, candidato à presidência pelo Partido Social Liberal (PSL). Para o deputado, sua maior mídia de campanha é a internet, especialmente o Facebook. “Propaganda hoje é feita com isso aqui [mostrando um celular]. Tivemos o exemplo nos Estados Unidos, ninguém acreditava no Trump, mas ele ganhou”. Na quinta-feira (14), ele visitou São Luís (MA) e, durante sua passagem, deixou claro que não se intimida por pesquisas de intenção de voto e que uma estratégia voltada para as redes sociais será dominante durante sua campanha.

“Eu acho que o Bolsonaro tem que propagar mesmo uma ideia de que o voto passa muito pelo uso e compartilhamento de informação de dispositivos móveis, dado que ele é sem dúvida nenhuma um candidato com menor musculatura política, sem aliança e com redução do espaço”, pondera o coordenador do Laboratório de Estudos sobre Imagem e Cibercultura da Universidade Federal do Espírito Santo, Fabio Malini. “Claro que existe uma euforia em torno da internet. Algo até muito maior que na eleição anterior. Ela faz com que mais pessoas se engajem em uma candidatura com pouco espaço para que as críticas sejam parte da opinião pública.” 

Crescimento de interação entre perfis e a página de Bolsonaro no Facebook. Fonte: Crowdtangle/Facebook

Graças à nova lei eleitoral (13.488/2017), a regra do jogo mudou. Se, por um lado, foi mantida a proibição de propaganda eleitoral em sites e blogs, por meio de banners, por exemplo, o artigo 26 da lei autoriza o “impulsionamento de conteúdos”, termo diretamente relacionado a publicidade no Facebook e outros sites de sua rede, como o Instagram. O mesmo artigo inclui como forma de impulsionamento “a priorização paga de conteúdos resultantes de aplicações de busca na internet”, ou seja, beneficia diretamente o mecanismo de pesquisa do Google.

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Ou seja, mesmo que as redes sociais pareçam um campo mais democrático para o debate político, a regra do dinheiro continua valendo; quem tem mais ganha mais alcance. Certo? No caso de Bolsonaro, porém, não é isso que parece funcionar. No último mês, nenhum post de sua página oficial no Facebook recebeu qualquer incentivo monetário e, ainda assim, teve mais de 41 milhões de visualizações – mais do que o dobro de seu principal adversário nas pesquisas, Lula, que aparece com 18 milhões de visualizações.

Quando o eleitor vira fã

Para Malini, Bolsonaro vai além do discurso de ordem e declarações contra os direitos humanos. O que o diferencia dos outros candidatos, verdadeiramente, seria sua inserção na subcultura do ‘fandom‘ – em que fãs reconhecem sua identidade através de uma figura e em uma comunidade. “É o acrônimo do fanático – o pequeno fanático, podemos dizer – em que se desloca o elemento de fanatismo e se difere da militância”. Na militância, se constrói uma causa. No fandom, se constrói um ídolo. “E isso parte da ideia de que o comportamento do eleitor deve ser de aceitação, custe o que custar”, completa Malini.

O pesquisador chama isso de uma “hipervalorização seletiva”. “A nossa sociedade valorizam a relação de identidade nessas plataformas, o apelo emocional ganha espaço, assim como o esforço por determinada causa.”

Além disso, há outro fator envolvendo o nome do presidenciável: seu alcance por intermédio da imprensa. A densidade do nome de Bolsonaro aparece de forma relativamente alta, se relacionada com posts de grandes veículos brasileiros. Uma entrevista realizada com o deputado federal rendeu ao Correio Braziliense um alcance 265 vezes maior do que a maioria de suas postagens. Vídeos da TV UOL e postagens em sua página oficial e na página UOL Notícias também aparecem entre os posts que mais atingiram pessoas usando chamadas com o termo ‘Bolsonaro’. Somados, os 22 posts das páginas ligadas ao UOL em que o nome do pré-candidato aparece, apenas no último mês, somam mais de 1 milhão de interações com o público e quase o dobro de visualizações.

Páginas que melhor se posicionaram com o uso da palavra “Bolsonaro” em seus posts. Fonte: Crowdtangle/Facebook

“Os candidatos, em sua relação com a imprensa, sempre vão tentar conseguir alguma frase de efeito para não esfriar sua campanha. Isso cria situações que possam gerar influência pública, criando uma rede de veículos que servem de escada para suas candidaturas e ecossistema de disseminação dos seus conteúdos”, afirma Malini. Para ele, a busca de atenção pelo clique é evidenciada pelo apelo emocional nos títulos de vídeos ou reportagens, o que contribui para essa relação identitária. “As pessoas tendem a clicar em conteúdos que se alinhem com suas ideologias, e a ideologia de Bolsonaro está bem descrita, os veículos sabem e trabalham com isso e isso se adequa com o formato corporativo da internet.”

Rio Grande do Sul

Entre março e junho de 2018, as páginas dos oito pré-candidatos ao governo do Rio Grande do Sul somaram mais de 387 mil curtidas. A página mais popular, no entanto, é do candidato com a menor taxa de intenção de voto. Mateus Bandeira (Novo) mantém seus mais de 100 mil seguidores em um crescimento de 25%. Se mantiver essa evolução, Bandeira terá uma base de seguidores equivalente a todo o município de Uruguaiana até as eleições. Porém, segundo o Instituto Paraná Pesquisas, o candidato detém apenas cerca de 1% das intenções de voto em cenários estimulados.

Gráfico de interações das páginas dos candidatos de nos últimos três meses. Fonte: Crowdtangle/Facebook

O pré-candidato pelo Novo, por exemplo, apresenta crescimento de quase 40 mil interações de um mês para o outro. Uma das principais postagens que contribuiu para o fenômeno foi a publicação de um vídeo intitulado “Populista, Autoritário e Mentiroso” – onde avalia o episódio do suposto tapa que Ciro Gomes teria dado no youtuber Arthur Duval, outra figura na corrida eleitoral, porém como pré-candidato a deputado estadual pelo Democratas.

O episódio fiou marcado pelo termo “pescotapa”, o qual apareceu, com suas variações, em grandes canais de mídia. Com a chamada “Ciro dá pescotapa em blogueiro”, o site BR18, ligado ao Estadão, somou 5 mil interações a mais do que sua média nos últimos meses. Assim, se utilizados de forma estratégica, palavras-chave “virais” podem promover conteúdos de forma orgânica.

Dentro das páginas dos pré-candidatos, Malini explica esse fenômeno afirmando que é algo quase imposto pela própria reformulação da lei eleitoral.  “O fundo partidário tende a reforçar as oligarquias políticas no jogo brasileiro. Ou seja, partidos com maior inserção como o PT, o PSDB e o atual MDB sairiam à frente. Só que a estrutura das redes sociais faz com que, muitas vezes, a atuação desses partidos tenha menos relevância do que partidos menores, em que as pessoas tendem a ter um engajamento maior.”

Atrás de Bandeira, o principal colocado em nível de interações é o vereador Roberto Robaina (PSOL). Com 2,7% das intenções de voto, a estratégia do vereador é de atingir grupos locais, divulgando textos que informam comunidades quanto a segurança pública, privatizações e transporte público – principalmente. No entanto, há destaque para o vídeo em que descreve a história de um de seus adversário no pleito, o deputado Luiz Carlos Heinze. A publicação ‘Quem é Heinze, o candidato do PP ao governo do RS?’ é um dos vídeos mais vistos na página de Robaina, com 63 mil visualizações e publicado no final de março, quando o candidato registrou leve crescimento em interações.

Mas, afinal, até que ponto essas interações são relevantes nas urnas? Para Malini, a resposta está na maneira como esse conteúdo é apreendido pelo público, seja de maneira positiva ou negativa. “É uma eleição de radicais, em que estas ideias estão espalhadas, repercutindo. As campanhas eleitorais, em si, provocam um tipo de esgotamento. A ideia de compartilhar uma noticia não é algo da internet, é da natureza do sistema de informação de massa – mas hoje é muito mais rápida e com maior alcance do que há anos atrás”. Porém, de acordo com ele, é algo quase impossível de se prever, já que essas mudanças ocorrem de forma quase instantânea. “Mas é interessante observar essas tendências, os porquês. Mas, de fato, só o resultado das urnas pode dizer quem ganha eleição.”


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