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27 de julho de 2018
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20:19

Com elogios a Sartori e aplausos do empresariado, Marina dobra aposta em candidatura ‘anti-polarização’

Por
Luís Gomes
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Marina Silva participou de evento na Federasul, em Porto Alegre, nesta sexta-feira | Foto: Itamar Aguiar / Agencia Freelancer.

Luís Eduardo Gomes

A pré-candidata da Rede à presidência da República, Marina Silva, participou na manhã e no início da tarde desta sexta-feira (27) da reunião-almoço promovida pela Federação de Entidades Empresariais do Rio Grande do Sul (Federasul), em Porto Alegre. Na palestra e na coletiva a jornalistas que marcam o evento, ela tratou de retomar o discurso de 2014 em que se coloca como alguém que não faz parte da “velha política”, reivindicando uma posição de anticorrupção que a diferenciaria da polarização histórica entre PT e PSDB. Se no segundo turno de 2014 ela esteve com Aécio Neves (PSDB) e durante todo o período entre as eleições adotou uma posição de antagonismo ao seu ex-Partido dos Trabalhadores, agora adota uma crítica veemente ao fato de que o tucano Geraldo Alckmin esteja coligado com o Centrão, grupo de partidos ao qual ela se referiu como o “condomínio que estava com a Dilma” — ainda que parte desses já estivessem lado a lado com o PSDB em 2014.

Na coletiva que antecedeu a sua palestra, as questões voltaram-se principalmente para como se dará a sua campanha sem coligações, com pouco tempo de TV e ainda sem ter anunciado um vice. Marina se posiciona como a candidatura anti-sistema, cita o “mecanismo” da série de José Padilha ao criticar a articulação realizada no Congresso para a distribuição do fundo partidário e do tempo de TV, o que, segundo ela, foi feito pelos partidos citados na Lava Jato para se preservarem no poder, argumentando que as regras que passam a valer nessa eleição beneficiam, sobretudo, MDB, PT, PSDB e DEM. “O Alckmin terá 10 dos 20 minutos do tempo de TV, assim como a Dilma tinha 12 dos 30 minutos”, disse. “Eu vou ter oito segundos. Vai dar para dizer Marina de manhã e Silva de noite”, brincou.

Mas a pré-candidata da Rede diz não estar preocupada com o pouco tempo de TV ou com a falta de coligações, pelo contrário, acredita que andar sozinha é o que lhe permite propor a maior das alianças, com 200 milhões de brasileiros. “Eu acho muito interessante quando eu vejo esse discurso dizendo que, independentemente de ter pessoas que têm a intenção de votar em você, você não tem viabilidade econômica, porque você não tem dinheiro, porque você não tem tempo de televisão, porque você não tem um leque de alianças com aqueles que levaram o Brasil para o buraco. Eu não acho que isso seja um passivo, talvez isso seja um grande ativo. Não estar com aqueles que criaram os problemas é uma demonstração de que talvez sejamos a melhor possibilidade de ajudar a resolver os problemas, porque eu não acredito que aqueles que levaram o Brasil para o fundo do poço possam tirá-lo. Acho que podem levar mesmo para o poço sem fundo”.

E o vice?

Com alianças ou não, o fato é que Marina Silva ainda precisa definir com quem comporá essa chapa para enfrentar os grandes partidos. Questionada se poderia se aliar a Ciro Gomes (PDT), que frequentemente, inclusive durante a sua passagem por Porto Alegre nesta quinta-feira (26), diz que ambos mantêm conversas rotineiras, Marina não é enfática em negar, nem em assumir essa possibilidade. Reconhece as conversas e acrescenta que também tem conversado com Álvaro Dias (Podemos), pois o que uniria todos é o fato de não terem sido denunciados pela Lava Jato, mas finaliza dizendo que todos podem seguir o seu caminho no primeiro turno. Sobre um eventual segundo turno, é taxativa: “O segundo turno a gente discute no segundo turno”.

Quando a discussão entra no tema de seu vice ainda não anunciado, a ex-senadora mais uma vez diz não ter preocupações, pois “ninguém anunciou nome ainda”. Ela destaca que a Rede tem mantido conversas com o PV, partido com o qual já se sabe que serão compostas alianças estaduais, e também elenca nomes internos do partido, a quem chama de “ouro da casa”, que ajudariam a “complementar” o seu perfil. Destaca entre eles o economista Ricardo Paes de Barro, o deputado federal Miro Teixeira e o atual presidente do Flamengo, Eduardo Bandeira de Mello. “O critério [para escolha do vice] é programático, pessoa com qualidade técnica, com vida ética e que me ajude a fazer essa jornada, que seja um perfil complementar ao meu”.

Marina Silva foi acompanhada pelo deputado federal João Derly, principal nome da Rede no RS | Foto: Itamar Aguiar / Agencia Freelancer.

Nesta semana, a Rede definiu que irá apoiar a candidatura de Eduardo Leite (PSDB) ao governo do Estado, rompendo a aliança formada com o governador José Ivo Sartori (MDB) em 2014. Ainda assim, elogia o mandatário pela sua honestidade, o mesmo traço que destaca no candidato que a Rede apoiará agora, ainda que ambos sejam de partidos envolvidos nos esquemas que abomina. “Nós caminhamos junto com o Sartori. Eu não generalizo as coisas, nem todas as pessoas do PT, do PMDB, do PSDB são iguais. A crítica que eu faço é exatamente daqueles que se corromperam, daqueles que trocam projeto de País por projeto de poder, mas nem todas as pessoas são assim. O Sartori não está envolvido em corrupção, imagino que esse jovem também não esteja”, diz Marina, quase reconhecendo que pouco sabe sobre a articulação coordenada pelo deputado federal João Derly (Rede) que aproximou seu partido do tucano. Uma das raras figuras políticas que acompanhou a sua palestra, e certamente a de maior expressão, foi o ex-senador Pedro Simon (MDB).

Mágoa com o marqueteiro

Ao longo da coletiva e da palestra, fica claro que as eleições de 2014 deixaram mágoas que ainda acompanham Marina, quatro anos depois. Ela cita nominalmente o marqueteiro João Santana, que coordenou a campanha de Dilma na ocasião, e em outro momento também refere-se às “mentiras do marqueteiro”. Contudo, acredita que as eleições de 2018 poderão ser diferentes, pois, segundo ela, dessa vez as pessoas sabem da verdade.

“Em 2014, as pessoas não sabiam da verdade. Agora, as pessoas sabem. Sabem o que aconteceu entre o Aécio e o Joesley Batista. Não porque alguém disse, mas porque ouviram numa gravação. Sabem o que aconteceu com o marqueteiro mentiroso João Santana, não porque um adversário denunciou, mas porque a Lava Jato comprovou”, diz.

Marina diz que a sua preocupação é com o que as pessoas farão com essa verdade, mas confia que, apesar das desvantagens no tempo de televisão e do fundo partidário, prevalecerá o desejo de mudança. “Não serão os 8 segundos que impedirão o povo brasileiro de mudar se ele quiser. Aliás, já vi pessoas em condições bem piores que as minhas. O Mandela estava preso e conseguiu o que queria alcançar. O Gandhi não tinha força nenhuma e conseguiu o que queria enfrentando o império britânico. Eu tenho bons exemplos na história”.

À direita ou à esquerda?

A conjuntura mudou muito nesses quatro anos, mas Marina dobra a aposta no discurso de que governará com os melhores, sejam eles do PSDB, PT, MDB ou de qualquer lado. “Se ganhar, vou governar com os melhores. Não tenho preconceito contra as pessoas boas do PT ou do MDB, tanto é que, em 2014, aqui eu caminhei com o Sartori e com o Pedro Simon”, disse, voltando a elogiar o governador.

A ideia que defende é de um governo de proposição, em que a maioria no Congresso seria formada por adesão programática, numa superação da lógica de distribuição de cargos. Não vai, porém, além da confiança na virtude dessa ideia e de que também cabe aos eleitores a oportunidade de renovar o Congresso para explicar como lidará com o “condomínio” que foi de Dilma e agora é de Alckmin.

Marina terminou a palestra elogiada por Simone Leite (esq.)  Foto: Itamar Aguiar / Agencia Freelancer.

Na palestra aos empresários, abriu sua fala com reiteradas menções à necessidade de controle dos gastos públicos, de enfrentamento ao “endividamento grave”. Mais tarde, ressalvou que o ajuste que defende não é em detrimento dos investimentos em saúde, educação e segurança.

Marina, contudo, não diz como irá conciliar ajuste e investimentos em ciência e tecnologia, algo que também defende, mas que despencaram desde que o governo Temer implementou a chamada lei do Teto dos Gastos. Sobram conceitos em sua fala, mas faltam especificidades. O tom monocórdico é superado em momentos em que ela deixa a sua própria história entrar no discurso. Quando fala que sabe da importância da educação porque foi alfabetizada apenas aos 16 anos ou quando diz que as adversidades políticas do momento são poucas para quem já superou cinco vezes a malária, hepatite, leishmaniose e a contaminação por mercúrio, chumbo e ferro, é nesses momentos em que é aplaudida pela plateia.

Ao final, ganhou o elogio da presidente da Federasul, Simone Leite, ex-candidata ao Senado, em 2014, pelo PP — um dos partidos mais envolvidos com a Lava Jato: “A Marina defende o que a gente defende, o bem comum”.


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