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27 de julho de 2018
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01:16

Ciro diz que foi surpreendido por apoio do centrão a Alckmin, mas que não cogitava acordo

Por
Sul 21
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Durante convenção do partido, Ciro foi aplaudido e ouviu gritos de “presidente” | Foto: Joana Berwanger/Sul21

Fernanda Canofre

Em Porto Alegre para lançar a candidatura de Jairo Jorge ao governo do Rio Grande do Sul pelo PDT, Ciro Gomes parecia calmo e à espera das perguntas sobre uma possibilidade de apoio a sua campanha, que vinha sendo cogitada há semanas e se desfez na manhã desta quinta-feira (26). Cinco partidos do chamado centrão do Congresso Nacional – PP, DEM, Solidariedade, PR e PRB – oficializaram aliança com o ex-governador de São Paulo, Geraldo Alckmin (PSDB), e deram à coligação dele 20 minutos de propaganda eleitoral. O candidato que Ciro vê como situação, pelo apoio ao governo Michel Temer (PMDB) desde o início, e que ele diz acreditar que seja seu adversário no segundo turno das eleições de outubro.

“Sempre achei isso, pode entrar na internet e recuperar toda minha opinião, porque eu sou vivido e sei como funcionam as coisas”, respondeu ele sobre o porquê da aposta no tucano e não no deputado federal Jair Bolsonaro (PSL). “Quando você vê um tatu em cima do toco, nos pampas, aposta, alguém botou ali. Por quê? Porque tatu não sobe em toco. Então, quem botou o Michel Temer na linha de sucessão do Brasil? Fui eu?”, ironizou ele se referindo ao porquê Alckmin seria o representante do governo atual.

Mesmo assim, ele admitiu que a iniciativa do anúncio do acordo entre centrão e PSDB o pegou de surpresa. Até a semana passada, o pedetista vinha tendo reuniões com alguns dos partidos. Em coletiva, Ciro tentou minimizar a questão. Segundo ele, a aproximação com as legendas que se dizem centro nunca esteve “em seus cálculos”, depois de ser procurado por eles, aceitou conversar por “estar com um olho na eleição e outro no dia seguinte”. O primeiro contato teria partido para o lado pessoal, de acordo com ele, com ACM Neto, presidente do DEM e prefeito de Salvador, cobrando uma declaração de Ciro o chamando de “anão moral”. Segundo o candidato do PDT, a declaração foi em defesa de Lula em quem “ACM teria ameaçado bater”.

“Eu disse a ele que nossa conversa só iria prosperar se fosse a partir de futuro. A partir daí começamos a falar de programa, por proposta do Rodrigo Maia e do ACM Neto, eu mandei nossos assessores econômicos e as divergências ficaram absolutamente intransponíveis”, afirma ele. Entre elas, estavam posições sobre reforma trabalhista, venda da Embraer e privatização da Petrobras. “Apertamos as mãos, como cordiais adversários e cada um seguiu seu caminho”.

À Folha de S.Paulo, o presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia (DEM), um dos articuladores das conversas, disse que a opção por Alckmin seguiu “agenda convergente”, porque Ciro poderia “dividir o grupo”. Para o pedetista, os dois lados teriam dificuldade em explicar uma aliança a essa altura. “O que precisa ser feito no Brasil, que eu penso, não combina com o que eles pensam”. Questionado sobre como pretende governar, caso seja eleito e tenha que dialogar com o centrão, ele disparou: “Quantos minutos você acha que vai demorar para me apoiarem, eu com o governo na mão?”.

“Eu gostaria muito de ter o PSB”. Foto: Joana Berwanger/Sul21

PSB e PCdoB estão na mira do PDT

Ciro acenou que ficaria honrado em ter Márcio Lacerda, pré-candidato ao governo de Minas Gerais pelo PSB e ex-prefeito de Belo Horizonte, com quem trabalhou no Ministério da Integração Nacional, no primeiro governo Lula, como vice. Ele descartou a possibilidade de uma chapa com Marina Silva (Rede) na mesma posição, segundo ele, porque “não teria a falta de delicadeza de convidar uma pessoa tão grande para ser vice”. Ainda assim, ele diz que os dois “têm conversado bastante”. A mesma cordialidade que reservou à deputada estadual Manuela D’Ávila (PCdoB): “Não posso diminuir uma ilustre opositora”.

Porém, a aproximação aos dois partidos parece ser um dos focos da campanha do PDT. Sobre o PSB, que nas eleições de 2014 tinha Marina como candidata, Ciro diz que “não há negociação”, porque o próprio partido estaria com um racha.

“Eles têm uma posição que a seção de Pernambuco desejaria um acordo com o PT e a de São Paulo com o PSDB. Várias outras seções não queriam nem uma coisa, nem outra e queriam candidato próprio. Depois da desistência de Joaquim Barbosa (ex-ministro do Supremo Tribunal Federal), ficaram sem candidatos e os procuramos para manifestar nosso vívido interesse no campo da esquerda democrática que está preservado da Lava Jato”, afirmou ele. “Eu tenho pra mim que todo entendimento que é feito na frente do povo vale. Tudo que não puder ser confessado na frente do povo não vale. Portanto, quero dizer, com risco de amanhã ter outra frustração, que eu gostaria muito de ter o PSB”.

O presidente nacional do PDT, Carlos Lupi, que acompanhou a agenda, confirmou o interesse. “Dos partidos médios, estamos conversando muito fortemente, permanentemente com o PSB e com o PCdoB. Tem outros partidos pequenos com os quais temos conversado também e vai depender do andar desse processo”.

Campanha diz não se preocupar com polêmicas

Lupi desmentiu informações publicadas na imprensa de que a campanha estaria recomendando que Ciro cuidasse declarações, para evitar polêmicas. “Acho que tem muita gente que tem preocupação com o crescimento da candidatura do Ciro, que é um fato real. As pesquisas vão mostrar isso, a nossa diária tem mostrado isso. Hoje, ele virou um player nesse jogo político”, afirmou ao Sul21.

Na semana passada, o Ministério Público de São Paulo anunciou que estava abrindo inquérito policial por injúria racial devido a uma declaração de Ciro Gomes sobre o vereador Fernando Holiday (DEM/SP), um dos membros mais conhecidos do Movimento Brasil Livre (MBL). Ciro disse em entrevista: “Você imagina esse Fernando Holiday, o capitãozinho-do-mato. A pior coisa que tem é o negro que é usado pelo preconceito para estigmatizar, que era o capitão-do-mato no passado”.

Holiday chamou a comparação de “racista” e disse que “finalmente” Ciro responderia à Justiça. Na terça-feira (26), em entrevista ao programa Pânico, da rádio Jovem Pan, outro membro do MBL, o pré-candidato a deputado federal pelo DEM Kim Kataguiri declarou que as duas candidaturas que o grupo quer derrotar são as do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e de Ciro.

“Esses delinquentes juvenis terão o destino que o lixo tem diante do tempo da História. Por agora, de um lado é desconsiderá-los, de outro, denunciá-los. É isso que tenho tentado fazer”, disse o pedetista à reportagem. “Eu tenho um estilo de fazer política com transparência, às vezes, certas elites temem isso e cuidam de desqualificar isso. Eu sempre direi ao povo o que eu penso. Posso tentar ser um pouco mais malicioso, um pouco mais hábil, mas eu tenho 60 anos, nada sai da minha boca sem eu ter vontade de dizer”.

Deputados federais e estaduais do PDT acompanharam presidenciável durante agenda | Foto: Joana Berwanger/Sul21

‘Esquerda só se reúne à força’

Ciro reconheceu avanços dos dois partidos que dominaram a disputa principal da política brasileira desde a redemocratização. O PSDB com o Plano Real, do qual ele diz se orgulhar de ter participado junto a Itamar Franco. E o PT com as políticas de distribuição de renda, que diminuíram a miséria e ajudaram 40 milhões de pessoas a ascenderem de classe social. O problema, para ele, seria a partir do momento que o partido transformou isso em “projeto de poder”.

“Não é que eu tenha prazer com isso, mas é impossível que nós, brasileiros, não aprendamos uma lição. O Lula está na cadeia. O maior líder popular do país está na cadeia. Se não aprendermos essa lição, nós que vamos pagar muito caro. Só nos últimos três anos, esse modelinho [econômico] fechou 13 mil indústrias no Brasil, parte delas aqui no Rio Grande do Sul. O Brasil está com 13,7 milhões de desempregados, com 32,2 milhões de pessoas na informalidade, correndo do rapa, tentando viver de bico, desorganizando comércio formal, teve 62,5 homicídios nos últimos 12 meses, absoluta desmoralização do poder em termos de estado de direito democrático, 63 milhões de brasileiros estão com o nome sujo no SPC”, aponta.

Ciro defende que “a culpa” de tudo isso seria de uma política econômica que segue desde o primeiro governo de Fernando Henrique Cardoso (PSDB). Ainda que tenha salientado que vê o PT como “adversário” e não “inimigo”, ele disse achar difícil que haja uma união da esquerda no primeiro turno.

“Fora da cadeia, a esquerda só se reúne à força, pelo que eu tenho visto”, afirmou, em referência a um ditado antigo. O pedetista disse que é “lamentável” que seja assim, num momento em que “a política está naufragando” por culpa de uma aliança que sustenta Temer e o PMDB.

Jairo Jorge promete palanque para todos os partidos da coligação

O ex-governador Alceu Collares posou com Jairo Jorge e Ciro | Foto: Joana Berwanger/Sul21

Quando avistou o ex-governador gaúcho Alceu Collares, na sala da presidência da Assembleia Legislativa, Ciro partiu para abraçá-lo e o saudou como “meu líder querido”. Em seguida, em gravação de um vídeo para a internet, disse que “vai ajudar a tirar o RS dos grilhões do governo federal”. Ao lado de Jairo Jorge, ex-prefeito de Canoas, Ciro criticou os acordos com a União que acentuaram a situação de crise atual.

O candidato do PDT ao Piratini diz que percorreu 100 mil km desde o ano passado, visitando os 497 municípios gaúchos e ouvindo cerca de 28 mil pessoas, na construção da candidatura. Até o momento, a coligação “Frente Rio Grande Tem Solução” conseguiu costurar apoios com partidos como Avante, Podemos, PV, Solidariedade, PMB e PPL.

“Eu e o Ciro Gomes pensamos da mesma forma. Nós temos que ter um pacto de respeito no primeiro turno e um pacto de reciprocidade no segundo turno. Um pacto de respeito com as forças progressistas, as forças transformadoras, as forças que querem mudança e quem não estiver no segundo turno, apoia quem estiver”, afirmou Jairo.

Os partidos que fazem parte da campanha puxam também uma fila de presidenciáveis. Jairo garantiu que abrirá seu palanque a todos. “Vou abrir o palanque para todos os candidatos que estão conosco. Eu tenho o Podemos, que tem Álvaro Dias, tenho o Partido Pátria Livre (PPL), que tem o João Vicente Goulart, temos o Ciro, que obviamente é meu candidato, mas vamos abrir para todos. Foi isso que pactuei e, se por ventura tivermos outro partido que se some, também abriremos o palanque”.

Jairo Jorge ao lado de seu candidato a vice, o empresário Cláudio Bier |(PV)Foto: Joana Berwanger/Sul21

No mesmo dia do lançamento oficial de sua campanha, o Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF4) anunciou uma decisão que bloqueou as contas do candidato por “indisponibilidade solidária de bens”. O processo investiga o contrato de uma empresa para teleagendamentos de consultas do SUS, pela prefeitura de Canoas, quando ele era prefeito. A ação teria como objetivo garantir a reposição ao erário público, caso o processo conclua que houve irregularidade. Na coletiva, Jairo repetiu o mesmo que disse na nota oficial do partido, “que estava tranquilo” e deixaria o Judiciário conduzir a questão.

Poucos minutos depois, ao lado de Ciro Gomes e Collares, ele subiu ao palco do Teatro Dante Barone, lotado pela militância do PDT e decorado com flores vermelhas. Com nomes da executiva nacional do PDT, ao lado de seu candidato a vice, o empresário Cláudio Bier (PV) e de deputados do PDT gaúcho, como Ciro Simoni, Enio Bacci, Eduardo Loureiro, Gilmar Sosella, Pompeo de Mattos, lançou oficialmente sua candidatura ao governo gaúcho.


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