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18 de setembro de 2018
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10:50

Atingir objetivos da ONU implica em uma profunda transformação dos sistemas agroalimentares

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Sul 21
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Atingir objetivos da ONU implica em uma profunda transformação dos sistemas agroalimentares
Atingir objetivos da ONU implica em uma profunda transformação dos sistemas agroalimentares
Painel na UFRGS ‘A Contribuição da Agricultura e da Alimentação para Alcançar os ODS’. Foto: Luiz Munhoz/Divulgação

Bruna Karpinski

Conciliar a diversidade existente entre diferentes etnias e populações é um dos desafios para o cumprimento dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) estabelecidos pela Organização das Nações Unidas (ONU). Entretanto, para alcançar as 17 metas e cumprir esta agenda até 2030, será preciso uma profunda transformação dos sistemas agroalimentares. Esta necessidade de mudança foi consenso na manhã desta segunda-feira (17), em debate realizado no primeiro dia da III Conferência Internacional Agricultura e Alimentação em uma Sociedade Urbanizada. O evento se estende até sexta-feira (21), na Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), em Porto Alegre.

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“Reafirmamos que sim, precisamos de uma transformação, que não é uma revolução porque precisa ser pensada, organizada e justificada. Tem que respeitar a diversidade das situações e, ao mesmo tempo que a gente respeita a diversidade, tem que pensar o todo”, aponta o pesquisador francês Patrick Caron, presidente do Painel de Alto Nível de Peritos do Comitê de Segurança Alimentar Mundial da ONU. Ele foi um dos palestrantes do painel A Contribuição da Agricultura e da Alimentação para Alcançar os ODS. Para ilustrar o caminho, recorreu ao conceito de “revolução arco-íris”, utilizado na África após o Apartheid, que consiste em unir todas as formas e cores.

O pesquisador francês Patrick Caron. Foto: Luiz Munhoz/Divulgação

Em entrevista ao Sul21, Caron ressaltou que, embora as trajetórias de transformação sejam diferentes de um lugar para outro, porque o contexto e as expectativas são diferentes, é preciso um olhar mais abrangente, com objetivos consistentes e bem definidos. “Isso não vai acontecer de forma espontânea, requer planos cuidadosos. É preciso pensar em mecanismos políticos”, afirma o pesquisador, lembrando que este é um trabalho de longo prazo. Segundo ele, o caminho precisa ser traçado por meio de acordos locais, regionais, estaduais, nacionais e globais que sejam intersetoriais e inclusivos.

O pesquisador francês também destaca a necessidade de articular ações públicas e privadas para promover esta transformação profunda, além da definição de indicadores mais específicos para mensurar impactos e avaliar o desempenho dos sistemas alimentares. Somente assim, acredita Caron, será possível avançar em justiça social e na mudança de hábitos que vão desde o manejo mais sustentável dos recursos naturais na agricultura até uma alimentação mais saudável.

Investimentos precisam ser responsáveis

“Não vamos ver uma transformação na direção que queremos se não tivermos investimentos mais responsáveis. Temos que amarrar restrições, utilizando diretrizes internacionais para tomada de decisão”, alerta o pesquisador italiano Jamie Morrison, líder do Programa Estratégico de Sistemas Alimentares Sustentáveis da Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura (FAO), que também participou do debate. Um dos desafios, acredita o especialista, é garantir que o investimento seja adequado para promover igualdade e inclusão.

Segundo Morrison, os aspectos culturais e econômicos interferem tanto na valorização dos produtos locais como na penetração dos alimentos processados e/ou importados. Um dos entraves é a atual estratégia de comércio dos alimentos, que contribui para um impacto negativo na alimentação já que prevê uma dieta cada vez menos diversa.

Entre as consequências de um sistema alimentar que não é eficiente, citou o sobrepeso e a obesidade como questões preocupantes nos países em desenvolvimento. Morrison pontua ainda a necessidade de identificar os impactos negativos dos sistemas alimentares e de pensar em políticas baseadas em nutrição.

Para o pesquisador, os investimentos feitos nos sistemas alimentares atualmente são uma resposta às oportunidades que são criados pelas mudanças dos hábitos alimentares, baseados no comportamento do consumidor. Da mesma forma, as preocupações são traduzidas pela demanda por produtos mais saudáveis, que estimula novas práticas de compra e ações do mercado e do setor privado para estas novas oportunidades.

Primeiro dia de Conferência na UFRGS. Foto: Luiz Munhoz/Divulgação

Soberania alimentar como ferramenta de luta

Doutora em Ciências Sociais e assessora da Secretaria de Mulheres da Confederação Nacional dos Trabalhadores Rurais Agricultores e Agricultoras Familiares (Contag), Vilênia Porto Aguiar defende que a soberania alimentar é ferramenta de luta contra o sistema hegemônico. Assim como Caron, também ressaltou a importância do respeito à cultura e à diversidade dos modos de produção e de comercialização.

Entre as alternativas, Vilênia sugere a agroecologia como modo de produzir e viver da agricultura para pensar em sistemas agroalimentares realmente sustentáveis. Entretanto, frisa que isto implica em relações respeitosas entre homens, mulheres e natureza, respeitando sempre a diversidade. “As mulheres precisam ser reconhecidas como sujeito político, social e econômico que contribui para a soberania alimentar”, pontua.

Ao lembrar que o trabalho das mulheres na produção de alimentos é “silencioso, invisível e desvalorizado pela sociedade, mesmo quando elas assumem posições de liderança”, reivindica mais políticas públicas com abordagem de gênero. “As mulheres têm menor acesso a terra, a financiamentos, a assistência técnica, mas continuam lutando pelo reconhecimento de sua identidade”, disse.

Para Vilênia, a conferência internacional ocorre em um importante momento político no qual os governos fizeram uma drástica redução de políticas sociais que fortalecem o desenvolvimento rural e a agricultura sustentável.


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