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8 de fevereiro de 2018
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09:45

Defensora de mulher lactante presa com 8g de maconha diz que decisões não têm respeitado marco legal

Por
Sul 21
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População de presas no Brasil cresceu 700%, mais da metade cumpre pena por crimes relacionados à Lei de Drogas | Foto: Luiz Silveira/Agência CNJ

Fernanda Canofre

Na última sexta-feira (02), a decisão da presidente do Supremo Tribunal de Justiça, Laurita Vaz, de negar o habeas corpus a uma mulher, mãe de cinco filhos, presa com 8,5g de maconha, viralizou nas redes. A notícia foi publicada como uma nota de poucas linhas, em uma coluna do jornal O Estado de S. Paulo. Na decisão, a ministra reitera o entendimento do Tribunal de Justiça de São Paulo, que ordenou a prisão preventiva: “a Paciente não logrou êxito em comprovar a imprescindibilidade de seus cuidados em relação aos seus filhos”.

O pedido da Defensoria Pública de São Paulo era para que a prisão fosse alterada para domiciliar. O que está previsto no Marco Legal da Primeira Infância, para mulheres com filhos menores de 12 anos. O mesmo entendimento serviu, por exemplo, para reverter a prisão de Adriana Ancelmo, mulher do ex-governador do Rio de Janeiro, Sérgio Cabral (PMDB), em dezembro do ano passado, em uma decisão de Gilmar Mendes. No caso da ré de SP, as cinco crianças têm entre 14 anos e dois meses de vida.

Por meio de assessoria, o STJ diz que a substituição do tipo de prisão, segundo o artigo 318 do Código de Processo Penal, não é automática. Seria necessário que a mãe comprovasse que sua “presença no lar” é imprescindível, o que a ré não teria conseguido fazer.

A defensora que atende o caso da mulher discorda. “O artigo 318 não fala da demonstração da imprescindibilidade da mãe. Ele fala que, no caso do pai ser preso, ele precisa demonstrar que é ele quem cuida da criança. Não fala nada sobre a mãe. O STJ está criando requisito que a lei não trouxe”, diz Maíra Coraci Diniz.

Segundo Diniz, cerca de 30% dos habeas corpus ingressados no STJ são apresentados pela Defensoria Pública paulista. Neste caso, a decisão tramitou um pouco mais rápido que o normal, porque ela mesma pediu urgência, preocupada com a situação das crianças. O bebê, que era amamentado apenas no peito, não se adaptou ao leite artificial e precisou de atendimento médico. Os outros quatro filhos tiveram de ser espalhados por casas de parentes.

Ela lembra que, na audiência de custódia, a mulher ainda tinha a blusa molhada do leite que vinha do peito. Ré primária, ela foi presa no início de janeiro, quando tentava entrar num presídio com maconha escondida dentro de um bolo de chocolate. A droga seria para o companheiro, também preso por crime previsto na Lei de Drogas. A criança tinha, então, um mês de vida.

O STJ, porém, cita que para o TJ-SP, “além de a mulher ter indicado uma tia como responsável pela criança (de um mês), ela tem o direito de realizar o aleitamento dentro do presídio – o que afastaria, a princípio, a necessidade de conversão da prisão preventiva em domiciliar”.

Apesar da recomendação de diversas organizações e de súmulas recentes do STF e do próprio STJ, a defensora afirma que é difícil ver decisões judiciais que sigam a recomendação e priorizem prisão domiciliar para mães.

“O que os juízes andam falando é que o fato de ter filhos não dá salvo-conduto para que a pessoa responda em liberdade. Primeiro, que não é liberdade, porque a pessoa estaria em prisão domiciliar. Segundo, o que a Constituição Federal fala é que tem que considerar o melhor interesse da criança, naquele momento. Não se avalia o interesse da sociedade ou da presa, mas da criança”, explica ela.

Enquanto a mulher segue presa, aguardando resultado de recursos, os filhos seguem divididos. A tia que foi apresentada como alguém que poderia ficar com o bebê, foi chamada no momento da prisão, como único contato que a mãe tinha.

A defensoria sustenta que o caso é o chamado crime impossível. Além de não ter antecedentes, a mulher portava uma quantia pequena de droga (8,5 g) e estaria apta para receber a aplicação de redutor de pena. Ou seja, tomando por base decisões recentes das Cortes superiores, o crime não seria passível nem de prisão.

Nos últimos 16 anos, o Brasil viu o número da população de mulheres presas crescer 700%. Estima-se que cerca de 80% das mais de 44 mil presas, hoje, são mães e as principais responsáveis por manter casa e família. Pelo menos 60% delas está presa por crimes relacionados ao tráfico de drogas.


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