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12 de setembro de 2018
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18:58

Mães pedem revogação da Lei de Alienação Parental: ‘Não vamos tolerar mais ameaças’

Por
Sul 21
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O objetivo do evento é chamar a atenção para as injustiças provocadas pela Lei de Alienação Parental que, através da inversão de guarda, abre precedentes para o convívio forçado com agressores. Foto: Joana Berwanger/Sul21

Giovana Fleck

“Ele forçava a gente a beijar o piu-piu”. “Precisava de injeção no bumbum para eu ficar bonzinho”. “Saiu uma baba branca, e a agente vomitava”. Nesta quarta-feira (12), essas e outras frases de crianças vítimas de pedofilia foram dispostas no canteiro central em frente ao Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJ-RS). A intervenção ocorreu durante o ato ‘Proteger nossos filhos não é crime’, convocado por coletivos e ONGs relacionados à maternidade e à proteção da infância.

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O ato ocorreu simultaneamente em 17 países. O objetivo é chamar a atenção para as injustiças provocadas pela Lei de Alienação Parental que, através da inversão de guarda, abre precedentes para o convívio forçado com agressores. A lei, sancionada no Brasil em 2010, é um reflexo dos estudos do psiquiatra Richard Garner – que estabeleceu o conceito de Síndrome da Alienação Parental com objetivo de impedir que, em casos de divórcio, um cônjuge sabote a relação do outro com os filhos.

A síndrome nunca foi reconhecida por nenhum órgão médico no mundo. Ainda assim, ganhou espaço em instâncias judiciais na América Latina e na Europa. No Brasil, após a aprovação da lei, mães de todo o país passaram a se unir para denunciar genitores que, pela lei da alienação parental, acabam impunes e obtêm reversão de guarda em casos de abuso sexual infantil e violência doméstica.

Em 2017, o mesmo evento foi realizado também em frente ao TJRS. No entanto, as mães entrevistadas pelo Sul21 na época afirmam que pouco ou nada evoluiu em seus casos. Foto: Joana Berwanger/Sul21

Em 2017, o mesmo evento foi realizado também em frente ao TJ-RS. No entanto, as mães entrevistadas pelo Sul21 na época afirmam que pouco ou nada evoluiu em seus casos. “Retrocedemos”, resume uma das mulheres. “Precisamos nos posicionar e falar pelas crianças que não são escutadas”, diz uma das manifestantes. “Estamos aqui porque já ouvimos de juízes que deveríamos calar nossas bocas. Nos reduzem a meras procriadoras, como se nós, mulheres, servíssemos para colocar os filhos no mundo e permanecer trancadas dentro de casa, sujeitas a abusos. Essa é uma lei machista, misógina e que abre precedentes para todos os tipos de violência contra as crianças.”

Os coletivos redigiram um manifesto, que foi entregue ao presidente do TJ-RS, desembargador Carlos Eduardo Zietlow Duro. ” [Queremos] garantir que as vítimas de violência recebam um tratamento digno, tomando todas as medidas relevantes para promover a sua recuperação física e psicológica e reintegração social; [além de] eliminar dos ordenamentos jurídicos as leis que perpetuam a prática da violência contra mulheres, meninas e adolescentes, bem como garantir que a violência e a humilhação não sejam reproduzidas em ambientes institucionais”, pedem, no documento.

Joanna Marcenal

“Joanna foi mais uma criança revitimizada dentro deste sistema. Pedimos justiça para ela, sua mãe e tantas outras que enfrentam realidades tão extremas quanto”, declara uma das manifestantes durante o ato em frente ao TJ-RS. Foto: Joana Berwanger/Sul21

Apontada como primeira vítima da Alienação Parental, Joanna Marcenal perdeu a vida aos cinco anos de idade. A menina teve a guarda disputada entre os pais após a separação do casal. Seu pai, André Rodrigues Marins, ausente durante os primeiros anos de vida de Joanna, reapareceu em 2009 – após mais de dois anos sem visitá-la. Ele entrou na Justiça com um processo para reverter a guarda da filha, que acabou enquadrando a mãe da menina, Cristiane Ferraz Marcenal, na Lei de Alienação Parental.

De acordo com a denúncia do Ministério Público, Joanna foi mantida dentro da casa de André e de sua madrasta com as mãos e pés amarrados e deixada no chão por horas e dias suja de fezes e urina. Ela morreu de meningite após ter ficado quase um mês em coma e ser atendida por um falso médico. Cristiane só pode ver sua filha pouco antes da menina falecer.

O caso reinicia sua fase de instrução e julgamento no Tribunal de Justiça do Rio na quarta-feira (12). André foi preso por determinação do juiz Guilherme Schilling, ainda em 2010, e envidado para a penitenciária Bangu 8. A madrasta permaneceu livre, mas responde por omissão. O processo também julga a participação da médica Sarita Fernandes Pereira, coordenadora do setor pediátrico do hospital onde Joanna foi atendida, e de Alex Sandro da Cunha Silva, estudante de medicina que se passou por médico.

“Joanna foi mais uma criança revitimizada dentro deste sistema. Pedimos justiça para ela, sua mãe e tantas outras que enfrentam realidades tão extremas quanto”, disse uma das manifestantes durante o ato em frente ao TJ-RS.


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