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14 de novembro de 2018
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18:12

Justiça garante funcionamento de escola que acolhe alunos em situação de rua em Porto Alegre

Por
Sul 21
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Justiça garante funcionamento de escola que acolhe alunos em situação de rua em Porto Alegre
Justiça garante funcionamento de escola que acolhe alunos em situação de rua em Porto Alegre
Comunidade escolar está mobilizada há quatro anos, quando o fechamento havia sido anunciado pela Prefeitura | Foto: Caroline Ferraz/Sul21

Débora Fogliatto

A Escola Municipal de Ensino Fundamental Porto Alegre (EPA), instituição de ensino que acolhe pessoas em situação de vulnerabilidade, em sua maioria jovens e adultos que não tem moradia fixa, está há quatro anos batalhando contra a própria Prefeitura da cidade para continuar de portas abertas. Nesta terça-feira (13), a juíza Carmen Carolina Cabral Caminha, da 2ª Vara da Fazenda do Foro Central, determinou que o município mantenha a escola no mesmo local, garantindo a continuidade do funcionamento da EPA.

A magistrada julgou procedente a ação encaminhada pelas Defensorias Públicas Estadual e da União, confirmando liminar que havia determinado, em 2015, que a escola permanecesse aberta. O debate sobre o tema iniciou em 2014, ainda na gestão de José Fortunati, quando a Secretaria Municipal de Educação (Smed) argumentou que o espaço seria destinado para a educação infantil, área que tem déficit de vagas no Centro da cidade, e que os estudantes da EPA seriam transferidos para o Centro Municipal de Educação do Trabalhador (Cmet) Paulo Freire.

A articulação da comunidade escolar e da população de rua, com auxílio da Defensoria, levou o assunto à Câmara de Vereadores, onde foi realizada uma audiência pública sobre o caso. O assunto ainda foi discutido em grupos de trabalho, levado ao Ministério Público, foi tema de um abaixo-assinado e, com o fim das opções de diálogo, a defensora estadual Alessandra Quines Cruz, em parceria com Geórgio Carneiro da Rosa, defensor da União, ajuizou ação exigindo que o fechamento não acontecesse.

Escola tem perfil diferenciado e oferece EJA para pessoas em situação de rua | Foto: Caroline Ferraz/Sul21

O diretor da Escola, professor Renato Farias dos Santos, disse que a comunidade escolar recebeu a notícia da nova decisão judicial com muita alegria. “Todo mundo está muito feliz aqui, já contamos para os estudantes e nos alegra muito que depois de todas as audiências com professores, direção, pessoas da comunidade, com a Smed também, o posicionamento da juíza tenha sido da importância da continuação da EPA”, afirmou. Ele lembrou que os professores e alunos têm lutado desde 2014 para tentar garantir a continuidade do trabalho.

Na decisão, a juíza destacou que, mesmo reconhecendo a necessidade de ampliação do número de vagas para a Educação Infantil, “o fechamento da escola Porto Alegre para abertura de outra escola, porém de séries infantis, não se mostra razoável”. Segundo ela, fica evidente que o trabalho “singular” realizado na EPA é diferente do CMET Paulo Freire, mesmo que ambos trabalhem com educação de jovens e adultos.

“Em que pese a existência de alguns depoimentos dando conta de que o CMET Paulo Freire teria condições de receber os alunos da EPA, a prova carreada demonstra que as escolas possuem propostas diferentes de acompanhamento com relação aos seus alunos, bem como de base pedagógica. Aliás, mostrou-se incontroverso nos autos o caráter social da EPA, que desempenha um trabalho diferenciado, com turmas reduzidas e integralmente compostas por alunos com as mesmas problemáticas cotidianas”, afirma a juíza Carmen Caminha.

Diversas mobilizações ocorreram em 2014, incluindo uma audiência pública na Câmara de Vereadores | Foto: Elson Sempé Pedroso/CMPA

Além disso, observou que na EPA os estudantes realizam suas refeições diárias, tomam banho e podem levar seus pertences para a escola, incluindo carrinhos de supermercado, o que não seria possível em qualquer outra escola do município. Ela lembrou, ainda, que a EPA foi criada por decreto em 1995 e autorizada pelo Conselho Municipal de Educação em 2000, com o intuito de alcançar o direito à educação às pessoas que se encontram em situação de vulnerabilidade e situação de rua, propiciando tratamento diferenciado.

“Ou seja, em uma escola diga-se, comum, como a CMET Paulo Freire, os alunos da EPA não teriam o acompanhamento necessário, visto que para as pessoas que se encontram em situação de vulnerabilidade social, são imprescindíveis projetos e oficinas diferenciadas, assim como uma estrutura tal que acolha estas pessoas ao chegarem das ruas”, observa a magistrada. Ao longo do processo, foram ouvidos estudantes e professores das duas instituições, além de representantes da Smed e autoridades envolvidas no caso.

Outro argumento utilizado pela Prefeitura, o do suposto baixo número de estudantes da EPA em relação a outras escolas, também não foi acatado por Caminha, que mencionou ser evidente que “as dificuldades escolares e pedagógicas serão imensamente maiores, dos que as escolas em que não possuem atendimento ao mesmo público-alvo”. Agora, o município pode recorrer da decisão em segunda instância, caso apresente algum fato novo em relação ao processo inicial.


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