Últimas Notícias > Política > Areazero
|
15 de março de 2019
|
01:32

Um ano depois, milhares vão às ruas e perguntam: “quem mandou matar Marielle?”

Por
Sul 21
[email protected]
Organizadoras estimam que dez mil pessoas tenham participado de ato em homenagem a Marielle | Foto: Guilherme Santos/Sul21

Débora Fogliatto

“Marielle presente, virou semente”. As palavras que ecoaram nas ruas do centro de Porto Alegre nesta quinta-feira (14) não poderiam ser mais representativas do ato que marcou um ano da morte da vereadora carioca Marielle Franco. A partir das 17h30, a Esquina Democrática foi tomada por milhares de militantes de todas as idades, tanto ligados ao PSOL – partido da vereadora, que puxou o ato – quanto a outros partidos, movimentos sociais, estudantis, LGBTs, sindicatos e associações, muitos carregando a imagem do rosto de Marielle e inspirados por sua história.

Por todo o país, manifestações ocorreram exigindo justiça e respostas acerca do assassinato de Marielle e do motorista Anderson Gomes. Dois dias depois de ter sido preso o homem que atirou na vereadora, a pergunta que a multidão agora faz é: quem mandou matar Marielle? Já se sabe que há ligação com as milícias do Rio de Janeiro, as quais têm sido alvo de Marcelo Freixo, “padrinho” político de Marielle, há anos. Durante o ato, diversas falas e músicas destacaram também a ligação da família Bolsonaro com as milícias cariocas.

“Tão importante quanto quem puxou o gatilho é saber quem mandou matar a Marielle Franco, qual foi a organização criminosa, que já sabemos ser vinculada com as milícias do Rio de Janeiro. Mas [quando a mataram], não imaginavam que as sementes de Marielle ocupariam as ruas quantas vezes fossem necessárias até conseguirmos justiça”, colocou a deputada federal Fernanda Melchionna, colega de partido de Marielle.

Deputada federal Fernanda Melchionna mencionou pautas defendidas por Marielle | Foto: Guilherme Santos/Sul21

Ela mencionou que a melhor forma de honrar o legado de Marielle é lutar pelas lutas que ela lutava, o que passa pelo enfrentamento ao “governo autoritário de Bolsonaro”, destacando que ela era uma mulher negra, lésbica, trabalhadora e periférica. Durante todo o ato, placas com o escrito “rua Marielle Franco” eram exibidas pelos manifestantes, no que se tornou um ato de resistência contra a extrema-direita após deputados quebrarem a placa original feita no Rio de Janeiro. “Não adianta rasgar placa, porque elas se multiplicarão”, constatou Fernanda.

“A melhor forma de honrar nossos mortos é não só derramar nossas lágrimas – porque as lágrimas são necessárias, e nesses dias é impossível não chorar com as lembranças –, mas a melhor forma é lutar com mais força, mais garra, mais capacidade de enfrentamento, para dizer que nós honraremos a história. E nós exigimos saber quem mandou matar Marielle Franco. A história nos exige coragem e nós responderemos com coragem”, completou Fernanda, que foi vereadora em Porto Alegre por três mandatos, ovacionada pelo público que lotava a Esquina Democrática.

Diversas falas feitas no carro de som antes do ato sair em caminhada lembraram também das lutas de outros nomes importantes do movimento negro, como Dandara dos Palmares, e a escritora Carolina Maria de Jesus, que completaria 105 anos hoje. As falas foram intercaladas com performances culturais, dentre as quais a apresentação dos Poetas Vivos, na qual dois jovens negros declamaram um poema sobre o racismo no Brasil.

Centenas de placas de “ruas” homenageando Marielle foram levantadas no ato | Foto: Guilherme Santos/Sul21

Destacando a importância das manifestações artísticas para o povo negro, Carla Zanella, integrante do coletivo Juntos, do PSOL, afirmou: “é assim que a negritude resiste, é assim que a gente permanece vivo”. O refrão da escola de samba Mangueira, que homenageou Marielle e outros “heróis esquecidos da história”, foi citado por ela e cantado algumas vezes ao longo do ato.

Outro importante nome do PSOL gaúcho, a deputada estadual Luciana Genro falou do “genocídio cotidiano das pessoas negras nas favelas”, citando a luta de Freixo e Marielle contra as milícias. “Sabemos que a família Bolsonaro sustenta politicamente as milícias”, apontou. Já a vereadora Karen Santos, também do PSOL e única parlamentar negra na Câmara de Porto Alegre, destacou a importância de se disputar a opinião pública, “que está cada vez mais dominada pela barbárie”, e a necessidade de se reorganizar diante do momento político atual.

Caminhada

Quase todas as falas eram encerradas com a frase “Marielle, presente”, que eram completadas pela plateia com “hoje e sempre”. Também foi cantada a música “por Marielle quero justiça, eu não aceito presidente da milícia”, além de críticas ao projeto de Reforma da Previdência proposto por Bolsonaro e à polícia militar. Em certos momentos, os manifestantes também entoavam: “Marielle perguntou, eu também vou perguntar, quantos mais têm que morrer para essa guerra acabar?” e “pisa ligeiro, pisa ligeiro, quem matou a Marielle atiçou o país inteiro”.

Manifestantes destacaram ligação de Bolsonaro com milicianos  Foto: Guilherme Santos/Sul21

Por volta das 19h, os manifestantes começaram uma caminhada pela avenida Borges de Medeiros, puxada por uma faixa da setorial de mulheres do PSOL com os dizeres “não seremos interrompidas”. Havia ainda faixas em que estava escrito “Marielle gigante” e “lute como uma mulher”, além de uma que simulava a placa de rua com o nome de Marielle. As organizadoras do ato estimam que dez mil pessoas tenham participado da marcha.

Quando o ato já passava pelo viaduto da Borges, a deputada estadual Sofia Cavedon (PT) também se manifestou no carro de som, mencionando a história de opressão contra negros, indígenas e mulheres no Brasil. “Esse projeto de violência agora tem um presidente da República, que estimula crianças a usar armas. Mas nós não vamos permitir que nos submetam a esse projeto de violência e morte”, afirmou.

Ao chegar na José do Patrocínio, os manifestantes começaram a entoar “quem apoia pisca a luz”, convidando os moradores da região a se posicionarem sobre o assunto. Por toda a quadra entre a Borges e a Loureiro da Silva, pelo menos uma dezena de janelas começaram a piscar de imediato, empolgando ainda mais os militantes.

O ato seguiu pela rua até dobrar na República, onde havia pessoas sentadas nas mesas colocadas nas calçadas de diversos restaurantes e cafés da Cidade Baixa, das quais algumas aplaudiam o ato, outras olhavam com indiferença, e alguma filmavam. De lá, seguiram pela General Lima e Silva até retornar para a Loureiro para chegar ao Largo Zumbi dos Palmares, que justamente homenageia um importante símbolo de luta do povo negro. A mobilização foi encerrada ao som do samba-enredo da Mangueira: “Brasil, chegou a vez de ouvir as Marias, Mahins, Marielles, malês”.

Veja mais fotos:

Deputada Luciana Genro no ato que pediu justiça para Marielle | Foto: Guilherme Santos/Sul21
Foto: Guilherme Santos/Sul21
Foto: Guilherme Santos/Sul21
Foto: Guilherme Santos/Sul21
Foto: Guilherme Santos/Sul21
Foto: Guilherme Santos/Sul21
Foto: Guilherme Santos/Sul21

Leia também
Compartilhe:  
Assine o sul21
Democracia, diversidade e direitos: invista na produção de reportagens especiais, fotos, vídeos e podcast.
Assine agora