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22 de julho de 2020
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01:30

Em votação ‘histórica’, Câmara aprova em dois turnos Fundeb permanente e constitucional

Por
Luís Gomes
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Relatora do Fundeb, deputada Professora Dorinha propôs uma parcela maior da União para o Fundeb | Foto: Najara Araújo/Câmara dos Deputados
Fonte: Agência Câmara de Notícias

Da Agência Câmara*

A Câmara dos Deputados aprovou nesta terça-feira (21), em dois turnos, a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 15/15, que torna permanente o Fundo de Desenvolvimento e Valorização dos Profissionais de Educação (Fundeb) e eleva a participação da União no financiamento da educação infantil e dos ensinos fundamental e médio.

O texto-base da proposta foi aprovado em segundo turno por 492 votos a 6, além de 1 abstenção. Os deputados ainda precisam votar um destaque para concluir a votação da PEC, que seguirá para análise do Senado.

Segundo o parecer da relatora, deputada Professora Dorinha Seabra Rezende (DEM-TO), a contribuição da União para o Fundeb crescerá de forma gradativa de 2021 a 2026, de forma a substituir o modelo cuja vigência acaba em dezembro.

Muito emocionada, a relatora, elogiada unanimemente como “decisiva” por parlamentares da oposição, disse na tribuna que o país “nega o direito à educação, um país que esquece a sua infância.” Segundo a parlamentar, o relatório construído vai “marcar a história deste pais”.

Assim como diversos oposicionistas, ela elogiou a “dedicação” do presidente da Câmara, Rodrigo Maia”, nas negociações que possibilitaram a aprovação do texto. “Não é ideal, mas mostra um caminho possível para a educação”, afirmou. Segundo ela, o relatório foi “construído a partir de um consenso possível”.

“Essa é uma noite que realmente podemos chamar de vitoriosa”, disse a deputada Professora Rosa Neide (PT-MT). Soraya Santos (PL-RJ) destacou que a bancada feminina e o “partido da educação” estavam unidos e “comprometidos com o relatório”. Para Marcelo Freixo (Psol-RJ), o trabalho da relatora “foi uma contribuição histórica para a Educação pública em nosso país”.

Nos próximos seis anos, a parcela da União deverá passar dos atuais 10% para 23% do total do Fundeb, por meio de acréscimos anuais. Assim, em 2021 começará com 12%; passando para 15% em 2022; 17% em 2023; 19% em 2024; 21% em 2025; e 23% em 2026.

Os valores colocados pelo governo federal continuarão a ser distribuídos para os entes federativos que não alcançarem o valor anual mínimo aplicado por aluno na educação. Da mesma forma, o fundo continuará recebendo o equivalente a 20% dos impostos municipais e estaduais e das transferências constitucionais de parte dos tributos federais.

Em 2019, o Fundeb distribuiu R$ 156,3 bilhões para a rede pública. Atualmente, o fundo garante dois terços dos recursos que os municípios investem em educação. Os repasses da União, que representam 10% do fundo, não entram no teto de gastos (Emenda Constitucional 95/16).

Centrão e Guedes

O início da sessão da Câmara para votar o Fundeb, nos primeiros minutos da tarde, foi tumultuado. Sem a aprovação da PEC, pela lei, o fundo seria extinto em 31 de dezembro e a educação básica e pública do país entraria em colapso, já que o Fundeb garante 63% das verbas para área. Cerca de 45 milhões de estudantes dependem diretamente dos recursos do fundo.

Apesar de o relatório da deputada Professora Dorinha ter sido objeto de amplo debate ao longo de muitos meses, os líderes do governo e do Centrão obstruíram a sessão do Plenário no início da sessão, que foi suspensa e retomada no início da noite, após reunião dos lideres partidários e posterior acordo que permitiu a vitória da educação do país.

Antes, o deputado Jorge Solla (PT-BA) rejeitou argumentos do deputado bolsonarista Carlos Jordy (PSL-RJ), segundo o qual a informação de que os governistas eram contra o Fundeb é fake news. Solla mencionou a política “de destruição” e “irresponsável” do governo Bolsonaro em relação à educação. “Vamos aprovar o Fundeb, sim, apesar de vocês”, previu Solla antes da suspensão da sessão.

Leônidas Cristino (PDT-CE) denunciou a “política deletéria de desmantelamento deliberado” da educação promovida pelo governo.

Como na votação do auxílio emergencial, após tentar travar a aprovação da PEC, os deputados governistas fizeram discurso tentando capitalizar a vitória da sociedade dizendo que o Executivo apoiava o texto. Foi o caso de Vitor Hugo (PSL-GO). Segundo ele, Bolsonaro considera a educação uma “prioridade” e estava “preocupado” com a votação.

Depois de todos os debates, que o governo ignorou ou boicotou, o ministro da Economia, Paulo Guedes, às vésperas da votação, divulgou contraproposta à PEC. Ele era contra aumentar o fundo e defendeu ainda que a PEC comece a vigorar somente a partir de 2022, e não em 2021, o que paralisaria a educação brasileira no ano que vem. O governo fracassou na tentativa.

No fim, com indicação de ampla maioria da Câmara favorável ao projeto, o governo se viu obrigado a recuar.

Desigualdades regionais

Dos 13 pontos percentuais a mais que a União deverá colocar no Fundeb, 10,5 pontos deverão complementar cada rede de ensino municipal, distrital ou estadual sempre que o valor anual total por aluno (VAAT) não atingir o mínimo definido nacionalmente. A intenção é diminuir desigualdades regionais no recebimento do apoio.

Após acordo com o governo, pelo menos metade do dinheiro deverá ser destinado à educação básica ‒ se for o caso, inclusive para escolas comunitárias, confessionais ou filantrópicas. Segundo a relatora, a medida terá grande impacto, já que a educação infantil concentra a maior demanda não atendida pela rede pública no País.

Além do montante colocado por estados e municípios no Fundeb, o cálculo do VAAT deverá levar em conta os outros recursos direcionados à educação, as cotas estaduais e municipais de arrecadação do salário-educação e o complemento da União segundo os critérios atuais (valor anual por aluno).

Lei futura deverá definir vários detalhes sobre o Fundeb, inclusive o cálculo do VAAT, para o qual a PEC já define parâmetros. Outra regra determina que, no mínimo, 70% dos recursos extras poderão pagar salários dos profissionais da educação ‒ hoje, esse piso é de 60% e só beneficia professores ‒, e pelo menos 15% terão de custear investimentos nas escolas.

Ainda em relação aos professores, uma lei específica definirá o piso salarial nacional para a educação básica pública. A partir da vigência da futura emenda constitucional, fica explícito que o dinheiro do Fundeb não poderá ser usado para pagar aposentadorias e pensões.

Gestão e qualidade

Os outros 2,5 pontos percentuais que a União deverá colocar a mais no Fundeb serão distribuídos às redes públicas que cumprirem requisitos de melhoria na gestão previstos em lei e atingirem indicadores de aprendizagem com redução das desigualdades, nos termos do sistema nacional de avaliação da educação básica.

Entretanto, conforme o texto aprovado, essa parte do repasse extra da União começará apenas em 2023 (no equivalente a 0,75 ponto), será ampliada ano a ano e atingirá a integralidade dos 2,5 pontos a partir de 2026.

Os entes federativos deverão usar os recursos do Fundeb exclusivamente em sua atuação prioritária definida na Constituição: os municípios cuidam da educação infantil e do ensino fundamental; e os estados, do ensino fundamental e médio. Assim, o dinheiro não poderá ser aplicado, por exemplo, em universidades.

Para cumprirem o montante mínimo de 25% dos impostos investidos anualmente em educação, também conforme a Constituição, estados e municípios poderão contar somente com 30% do total repassado pela União. Nenhum ente federativo poderá reter os repasses vinculados ao Fundeb, sob pena de crime de responsabilidade.

Em relação aos tributos de estados e municípios que compõem as fontes do Fundeb, foi aprovado destaque, apresentado por nove partidos, que alterou o parecer da deputada Professora Dorinha. Assim, continuam de fora os recursos oriundos da compensação da União pela desoneração das exportações prevista na Lei Kandir (Lei Complementar 87/96).

Regulamentação

A lei que regulamentará o novo Fundeb deverá levar em conta as metas do plano nacional de educação; o valor anual por aluno investido em cada etapa e modalidade; a transparência e o controle social dos fundos; e o conteúdo e a periodicidade da avaliação dos indicadores de qualidade.

Esse regulamento definirá ponderações relativas ao nível socioeconômico dos estudantes e à disponibilidade de recursos vinculados à educação e o potencial de arrecadação de cada ente federativo.

Quanto ao padrão mínimo de qualidade do ensino, a referência será o custo aluno qualidade, constante no Plano Nacional de Educação (Lei 13.005/14), com o objetivo de encontrar o financiamento necessário por estudante para a melhoria da qualidade da educação no Brasil.

Dados centralizados

O substitutivo da deputada Professora Dorinha determina a centralização dos dados contábeis, orçamentários e fiscais da União, dos estados, do Distrito Federal e dos municípios. O objetivo é garantir a rastreabilidade e a comparação dos dados para divulgá-los ao público.

No caso de uma reforma tributária, o texto prevê que deve ser garantida, em cada exercício financeiro, a aplicação dos montantes mínimos em educação por estados, municípios e União equivalentes à média aritmética dos últimos três anos, independentemente da extinção ou substituição de tributos.

Uma lei deverá regulamentar a fiscalização, a avaliação e o controle das despesas com educação nas esferas estadual, distrital e municipal.

A partir da publicação da futura emenda constitucional, os estados terão dois anos para vincular parte dos repasses do ICMS para os municípios a indicadores de melhoria nos resultados de aprendizagem e de aumento da equidade.

Atualmente, os estados repassam parte do ICMS arrecadado (25%) às cidades. A PEC diminui o total repassado proporcionalmente às operações realizadas no território de cada município e aumenta o mesmo tanto no repasse que nova lei estadual deverá vincular às melhorias na educação.

Princípios

No artigo da Constituição que define os princípios do ensino, a PEC inclui a garantia do direito à educação e à aprendizagem ao longo da vida.​

*Com informações de Eduardo Maretti, da RBA.


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