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19 de setembro de 2019
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23:14

Deputados de esquerda e direita se unem contra venda de ações do Banrisul, mas divergem sobre privatização

Por
Luís Gomes
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Evento reuniu deputados de PSL, PDT, PT, Novo, MDB,  PSOL e Solidariedade. Na foto, da esquerda para direita: Vilmar Lourenço (PSL), Juliana Brizola (PDT), Edegar Pretto (PT), Fábio Ostermann (Novo), Sebastião Melo (MDB), Zé Nunes (PT), Pepe Vargas (PT), Fernando Marroni (PT), Luciana Genro (PSOL) e Giuseppe Riesgo (Novo). Ainda participaram Tenente-Coronel Zucco (PSL), Sofia Cavedon (PT) e Neri, o Carteiro (SD) | Foto: Luiza Castro/Sul21

Luís Eduardo Gomes

Deputados de sete partidos participaram no início da tarde desta quinta-feira (19), na Assembleia Legislativa, em Porto Alegre, da apresentação de um manifesto contra a venda das ações do Banrisul. Mesmo com o anúncio da desistência do negócio feito horas antes pelo governador Eduardo Leite (PSDB), os parlamentares mantiveram o evento como forma de marcar posição e registrar a estranha aliança, que colocou lado a lado Luciana Genro (PSOL) e Fábio Ostermann (Novo), Tenente-Coronel Zucco (PSL) e Juliana Brizola (PDT), bem como quase toda a bancada do PT na Casa. Nas palavras de Luciana, uma “unidade de ação pontual”, visto que uniu defensores e opositores ferrenhos da privatização do banco.

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A operação de venda das ações do Banrisul foi comunicada ao mercado no dia 9 de setembro. Caso fosse concretizada, o Rio Grande do Sul abriria mão de todas as ações possíveis até o limite para não perder o controle acionário do banco. No manifesto, os parlamentares dizem que o Executivo não deu transparência ao processo, citando como exemplo o fato de não ter enviado representantes para uma audiência pública realizada, em 4 de setembro, pela Comissão de Economia, Desenvolvimento Sustentável e Turismo para discutir o tema. Eles argumentam que o governo estaria “dilapidando o patrimônio público” com perdas “bilionárias” caso levasse o processo adiante.

Capitaneados no evento de leitura do manifesto pelo deputado Sebastião Melo (MDB), os parlamentares classificaram a iniciativa como uma “demonstração de maturidade” do Parlamento gaúcho contra o que consideraram que seria um mau negócio para o Rio Grande do Sul, uma vez que o governo pretendia vender quase 100 milhões de ações por um preço abaixo do esperado.

Zé Nunes (PT) saudou a maturidade dos parlamentares no debate sobre a venda das ações | Foto: Luiza Castro/Sul21

“Nós temos uma visão de que a venda das ações, independente do preço, levaria o Estado a ter apenas 25,08% do capital do banco por si só é um enfraquecimento do Banrisul. É algo ruim para o banco e com resultados negativos para a sociedade gaúcha, inclusive com influência sobre os dividendos do banco. Ano passado, foram R$ 300 milhões colocados no caixa do governo pelo Banrisul. Outros têm o entendimento de que a forma está equivocada. Quer dizer, vender as ações do banco com um valor insignificante perante o seu valor patrimonial é entregar patrimônio público”, disse o petista Zé Nunes.

O deputado destacou que os parlamentares há muito tempo já vinham alertando que o governo pretendia fazer um mau negócio. “Isso é importante, o parlamento demonstra maturidade, que tem condições de dialogar e que os interesses do Estado do Rio Grande do Sul, sob óticas diferentes, estão em primeiro lugar”, afirma.

O deputado Sebastião Melo comparou a situação à venda de um carro usado. “Quanto tu está muito desesperado, tu procura um picareta de carro e ele diz assim: ‘se tu me der 50% de desconto, eu compro teu carro, te dou o dinheiro e vai resolver o teu problema’. Nas ações do Banrisul, o que percebeu o mercado: o governo estava um pouco desesperado para fazer dinheiro”, disse.

Sebastião Melo (MDB) argumentou que o Estado precisará fazer o debate sobre a privatização do Banrisul | Foto: Luiza Castro/Sul21

Contudo, o emedebista elogiou o governador pelo recuo. “É da grandeza política quando você comete um erro, você avalia mal uma situação, voltar atrás. Eu quero cumprimentar a decisão do governador de cancelar, porque ele ia estar queimando um ativo que não é dele, é de todos os gaúchos. Você imagina uma ação que pode ser vendida por R$ 27, por R$ 28, eu vender ela por R$ 18,50, bota isso em 100 milhões de ações, nós teríamos R$ 2, R$ 3 bilhões, e um valor maior do que vai vir com as privatizações da CEEE, da CRM e da Sulgás. Então, não podia fazer isso”, afirmou.

Privatização segue no horizonte

O deputado Fábio Ostermann (Novo) também avaliou que o governo tentou vender as ações “na base do desespero” para tapar buracos na folha salarial do Rio Grande do Sul. No entanto, destacou que o seu partido segue defendendo a venda total do banco. “Mas não é qualquer privatização. Tem que ser uma privatização que garanta um valor adequado pelas ações. Afinal, é um ativo valiosíssimo que o Estado do RS tem na sua mão e estava à beira de cometer uma temeridade, inclusive correndo o risco de cometer uma improbidade, dado o tamanho dano potencial que isso geraria aos cofres públicos”, disse.

Ostermann diz que estimativas apontam que, se fosse vendido o controle acionário do banco, as ações do Banrisul poderiam valer o dobro do projetado inicialmente pelo governo e algumas vezes o valor proposto no final do processo. “Nesse momento de crise, se torna especialmente importante que a gente faça uso desses ativos valiosos que temos em mãos para poder lidar, por exemplo, com uma amortização do nosso estoque da dívida que corrói anualmente a nossa capacidade de recuperação e investimento. A gente estima que, se o Estado vendesse por valores de mercado o Banrisul, a gente teria, por ano, cerca de R$ 500 milhões a mais do que mantendo o Banrisul, porque a gente teria cerca de R$ 700 milhões a menos para pagar de serviço da dívida, que certamente compensariam os cerca de R$ 200 milhões que tem sido a média de rendimentos que o Banrisul tem trazido para o governo do Estado”, afirmou.

Fábio Ostermann (Novo) avaliou que o governo tentou vender as ações ‘na base do desespero’ | Foto: Luiza Castro/Sul21

Pela manhã, o governador Leite afirmou que o governo agora não pretende voltar a oferecer as ações do Banrisul a curto ou médio prazo e que não via espaço para a privatização do banco. Durante a tarde, Sebastião Melo disse acreditar que, se o governo colocar de novo o mesmo modelo de venda das ações, irá voltar a fracassar. No entanto, ponderou que o Estado precisará realizar o debate sobre a privatização, ainda que não tenha se posicionado sobre o assunto nesta quinta. “Eu não tenho um juízo de valor formado. Não é murismo, eu quero formar posição ao longo do debate”, disse.

O emedebista lembrou que, durante as negociações entre o governo de José Ivo Sartori (MDB) e a Secretaria do Tesouro Nacional para a adesão do Rio Grande do Sul ao Regime de Recuperação Fiscal, estava claro que o governo federal só aceitaria um acordo com a inclusão da privatização do Banrisul como contrapartida do Estado. “O governador (Leite) vem dizendo que o governo Bolsonaro mudou de ideia em relação a isso e aceitaria o acordo sem a privatização. Bom, é outro governo, vamos ver. Agora, com esse episódio da venda das ações, pode voltar à tona esse questionamento. A pergunta é: devemos privatizar o banco ou não? Acho que temos que entrar nesse debate se o Banrisul público é estratégico ou não é, se pode entregar ele que não vai ter nenhum problema na economia. Esse debate tem que ser feito, não simplesmente privatiza ou não privatiza”.

Para o petista Zé Nunes, “não há dúvida” de que o governador Eduardo Leite tem o desejo de privatizar o Banrisul. “Quando ele se viu em uma posição de risco na eleição do ano passado, de uma forma oportunista apresentou um compromisso de não venda do Banrisul. Mas nós sabemos que, no DNA do governador e do governo, está a vontade de vender o banco. Isso não tem dúvida. Desde o processo de indicação dos diretores do banco, todo o debate sobre o salário dos diretores do banco, nós temos muito claro que o governo pretende vender o banco. É um governo daqueles neoliberal clássico moderno. Nós vamos ter que fazer uma luta que não será fácil, mas pretendemos nos articular de todas as formas para que isso não seja votado no Parlamento”, disse.

No dia 11 de setembro, o deputado Sérgio Turra (PP) apresentou uma Proposta de Emenda Constitucional (PEC) que propõe a retirada da Constituição estadual da obrigatoriedade de realização de plebiscito para a privatização do Banrisul, da Corsan e da Procergs.


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