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19 de julho de 2019
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20:58

PT e Novo são contra venda das ações do Banrisul proposta pelo governo Leite

Por
Luís Gomes
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Sindicalistas e servidores do Banrisul fazem ato contra a privatização do banco, em Porto Alegre |Foto: Caroline Ferraz/Sul21

Luís Eduardo Gomes

É por motivos diversos, mas a oposição ao governo Eduardo Leite (PSDB) e o partido Novo estão preocupados com a ideia de o governo do Estado de colocar à venda todas as ações ordinárias do Banrisul que ainda pode comercializar sem se desfazer do controle acionário da instituição. A oposição critica porque é contra o Estado se desfazer de ações que rendem lucrativos dividendos anualmente. O Novo é contra porque acredita que a venda das ações agora seria prejudicial para uma futura venda do banco.

No dia 12 de junho, o Banrisul emitiu um comunicado informando os acionistas e o mercado sobre o interesse na realização envolvendo a oferta pública de ações excedentes de controle. “A oferta abrangerá ações ordinárias até o limite da manutenção do controle acionário. O Banrisul manterá seus acionistas e o mercado informados sobre quaisquer novos fatos atinentes à matéria em questão”, diz o comunicado.

Nesta semana, veio à tona uma ação ajuizada em 12 de julho por Mateus Bandeira, candidato a governador pelo Novo em 2018, em que ele pede que a venda das ações seja suspensa até que o Estado faça uma avaliação independente dos ativos para evitar prejuízos. Ele argumenta que operações semelhantes foram realizadas em abril de 2018 e acabaram se mostrando “lesivas ao patrimônio público” porque as ações foram vendidas abaixo dos “valores econômicos potenciais”. “A lesão para o erário público com a delapidação desse valioso patrimônio a um preço irrisório é considerável”, diz o texto da ação.

Em 10 abril de 2018, o RS vendeu 26 milhões de ações preferenciais a R$ 18,65 por ação. Em 27 de abril de 2018, foram vendidas 2,9 milhões de ações ordinárias a R$ 17,65 por ação. Somadas as duas operações, foram arrecadados R$ 536,1 milhões. No entanto, em apenas 14 meses, o RS deixou de arrecadar R$ 69,6 milhões em dividendos gerados pelas ações vendidas. Somado isso à valorização da cotação do ativo na bolsa, para R$ 25,08, Bandeira estima que, em apenas um ano, o Estado já deixou de arrecadar R$ 258,3 milhões no período, quase metade do valor arrecadado com a venda. Em abril deste ano, Leite já colocou à venda cerca de 2 milhões de ações, arrecadando R$ 49,5 milhões

Bandeira, que presidiu o Banrisul em 2010, já deixou o Novo, mas a bancada do partido na Assembleia Legislativa também expressa preocupação com a venda porque entende que ela pode ser prejudicial ao Estado. Os deputados acreditam que, sem a privatização, as ações do banco têm um valor abaixo do que poderiam render e que a alienação parcial pode resultar em uma desvalorização de até R$ 3 bilhões do ativo. Além disso, argumentam que, se futuramente o Banrisul decidisse ampliar o número de ações disponíveis, isso resultaria em uma privatização automática, porque a ideia do governo Leite é que, com essa venda, o Estado fique apenas com 50% mais um de todas as ações com poder de controle sobre o banco. Como o governo não deverá abrir mão do controle sem privatizar de fato, isso significa que não faria sentido a instituição procurar crescer por meio do lançamento de ações.

Ostermann quer convocar o governador para esclarecer a venda das ações do banco | Foto: Joana Berwanger/Sul21

Em junho, o deputado Fábio Ostermann (Novo) protocolou na Comissão de Finanças da Assembleia um requerimento de audiência pública solicitando a presença do governador Eduardo Leite, dos secretários de Planejamento e da Fazenda e do presidente do Banrisul para discutir e saber os motivos pelos quais o governo pretende vender as ações. Como não foi colocado em votação antes do recesso parlamentar, o pedido poderá ser apreciado apenas a partir do mês de agosto, quando os deputados retornam ao trabalho.

“A preocupação da bancada do partido Novo decorre da nossa percepção de que, ao vender essas ações de maneira pulverizada e não concentrada com a venda conjunta do controle acionário do banco, o governo vai obter um valor muito menor por estas ações. Se estima que vai obter entre R$ 1,7 e 2 bilhões. Nas estimativas mais otimistas, R$ 2,5 bilhões. A gente estima que o governo estará deixando de ganhar com a venda dessas ações cerca de R$ 3 bilhões, simplesmente por um cálculo de curto prazo para adiantar receitas. Na nossa estimativa, em vez de ganhar R$ 2,5 bilhões, poderia ganhar até R$ 5,5 bilhões se vendesse essas ações num conjunto completo junto com o controle acionário, que é o que a gente defende, mas não uma privatização feita de qualquer forma sem pensar no longo prazo e de uma maneira que, na prática, venha a dilapidar o patrimônio público”, diz Ostermann.

Em sua ação, Bandeira argumenta que o próprio governador disse, em entrevista publicada pelo Estadão em 16 de junho de 2019, que o Banrisul poderia valer até R$ 10 bilhões, questionando assim o motivo de esperar receber apenas R$ 2,4 bilhões pela metade de sua participação atual no banco.

Propositor da Frente Parlamentar em Defesa do Banrisul Público, o deputado Zé Nunes também é contrário à nova rodada de venda das ações. No entanto, como também é contrário à privatização, a preocupação dele é quanto às perdas futuras em termos de dividendos que deixarão de entrar nos cofres do Estado e quanto ao prejuízo gerado aos correntistas. “O que o governo está fazendo é transformar esse ativo do banco em uma espécie de caixa eletrônico em que ele vai passando o cartão e pegando um pouquinho de dinheiro a cada mês. É um processo muito ruim, porque dilapida o banco”, diz. “O Banrisul é como se fosse uma picanha que o governo vai tirando lasquinhas. Daqui a pouco, vai ficar só o espeto e uma parte torrada, e o governo vai acabar justificando que não tem outro caminho que não seja a privatização”, complementa.

Quando a governadora Yeda Crusius fez a primeira venda de ações do Banrisul, em julho de 2007, o Estado ficou com 57% do capital do banco. Com as duas vendas realizadas no governo de José Ivo Sartori e a primeira no governo Leite, caiu para os 49,39%. Se confirmada a venda do restante das ações ordinárias, terá o controle de apenas 25%.

Zé Nunes durante o lançamento da Frente Parlamentar em 2017 | Foto: Guilherme Santos/Sul21

Uma nota técnica elaborada pela bancada do PT na Assembleia diz que a venda e o lançamento de novas ações pela governo Yeda rendeu, em valores atualizados, R$ 1,7 bilhão ao banco e R$ 2,7 bilhões ao Estado, respectivamente. A nota aponta que o Estado recebeu, entre 2007 e 2018, R$ 2,66 bilhões (em valores atualizados) pela sua parte nas ações, um valor que já se aproxima do que obteve com a venda das ações — é preciso incluir nessa conta as ações vendidas por Sartori, o que ocorreu só em 2018. “Em poucos anos, o governo arrecadaria o mesmo valor somente com os dividendos gerados, porque é um banco lucrativo, que tem dado bom resultado”, diz Zé Nunes.

Em 2017, o Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese) fez um levantamento que apontou que, nos primeiros dez anos depois da venda das ações, o Banrisul gerou R$ 2,8 bilhões em dividendos para serem repartidos entre os acionistas, mas recebeu apenas R$ 1,9 bilhão (em valores atualizados na época) pelos 57% a que tinha direito, o que significava, então, uma perda de R$ 843,5 milhões com a venda.

Como exercício, a nota técnica do PT projeta que, se o Banrisul já tivesse apenas 25% das, o que terá caso a venda seja concretizada pelo governo Leite, teria recebido R$ 1,17 bilhões em dividendos nos últimos 12 anos e distribuído R$ 3,5 bilhões para acionistas, valor que teria entrado no caixa do Estado caso ainda fosse dono de 100% das ações. Diante dos resultados registrados, é possível projetar que, antes de completar a segunda década da venda das ações, os dividendos distribuídos já terão superado o valor arrecadado com as vendas.

Para o deputado Zé Nunes, além da potencial perda de arrecadação futura, uma eventual privatização do banco pode ser muito ruim em termos de atendimento à população. Segundo ele, 70% dos atuais correntistas do banco têm renda de até três salários mínimos, uma faixa populacional que pode ser desassistida em caso de privatização. Da mesma forma, a alienação ou mesmo uma gestão mais “pró-mercado” do banco pode levar a instituição a seguir a tendência de fechamento de agências no interior do Estado, sendo que o banco já cumpriria o papel de ser a única instituição financeira presente em diversas cidades do Rio Grande do Sul.

“O discurso dos favoráveis à privatização é que a realidade do setor bancário, dos serviços bancários, está sofrendo uma mudança muito rápida. E é verdade, hoje tu tem um banco dentro do celular, mas os bancos vão continuar existindo, vão continuar fazendo empréstimos. E o banco cumpre um papel social que eles não dão valor”, afirma.

Foto: Luiza Castro/Sul21

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