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11 de abril de 2019
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10:41

100 dias de Leite: entidades cobram que ações acompanhem promessa de diálogo

Por
Luís Gomes
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Leite visitou o CPERS em fevereiro para sinalizar que está disposto a dialogar com todas entidades representativas | Foto: Joana Berwanger/Sul21

Luís Eduardo Gomes

Ao completar os seus 100 primeiros dias, o governo de Eduardo Leite (PSDB) reivindica uma marca: a abertura ao diálogo. Foi o que o governador defendeu em coletiva de imprensa concedida nesta terça-feira (9) a respeito de seu mandato. “Mantivemos uma agenda de diálogo que ajuda a viabilizar um bom ambiente de progresso”. Também é o que diz o secretário-chefe da Casa Civil, Otomar Vivian (PP), quando solicitado pela reportagem a fazer uma avaliação do início do governo. “Ao completar 100 dias do governo Eduardo Leite e Ranolfo Vieira Júnior, acho que executamos com êxito a principal tarefa ao que governo se lançou, criar um ambiente disposto ao entendimento e a progredir”, disse. Mas será que o governo está de fato promovendo o diálogo? Em matéria publicada nesta quarta-feira (10), o Sul21 ouviu a opinião de deputados iniciais sobre a nova gestão. Dessa vez, a avaliação fica por conta de entidades representativas.

Presidente do sindicato dos agentes da Polícia Civil (Ugeirm), Isaac Ortiz avalia que, na área da segurança pública, há de fato uma evolução no diálogo entre governo e trabalhadores, o que, segundo destaca, passa pela articulação do vice-governador e secretário de Segurança Pública, Ranolfo Vieira Júnior (PTB), que é delegado aposentado e chefiou a PC durante o governo de Tarso Genro (PT). “O atual secretário é um homem que conhece a segurança pública. Temos uma interlocução que a gente não tinha no governo passado. Conseguimos levar as nossas demandas, o governador tem nos recebido. O diálogo melhorou muito”, diz Ortiz.

Ortiz avalia como positiva a presença do delegado Ranolfo Vieira Júnior no governo | Foto: Maia Rubim/Sul21

Ele ressalva que há pontos em que o governo precisa dar sinais melhores. A Ugeirm mantém como uma das suas principais reivindicações junto ao governo estadual o fim da superlotação das carceragens de delegacias, o que faz com que, nos últimos anos, tenha sido uma cena comum no Estado presos mantidos algemados em viaturas, a cadeiras e até a lixeiras. Este é um problema que tem se repetido na gestão Leite. Contudo, ele ressalva que ao menos um canal de diálogo foi aberto e que os servidores da Civil querem contribuir para a melhoria dos indicadores de segurança no RS. “Pelo menos já estamos sendo recebidos e estamos conversando”, diz.

Quando Leite esteve na sede do CPERS, em 6 de fevereiro deste ano, foi a primeira vez em quase quatro anos que o sindicato dos professores e funcionários de escolas do Rio Grande do Sul conseguiu uma audiência direta com o governador do RS — José Ivo Sartori só recebera o sindicato no início da sua gestão. No encontro, Leite aproveitou para tocar a sineta, símbolo das manifestações dos professores nas últimas décadas.

Contudo, a presidente do sindicato, Helenir Aguiar Schurer, cobra do governo mais do que dizer que está aberto ao diálogo. O CPERS questiona, por exemplo, que após 100 dias ainda perduram indefinições em questões básicas da educação estadual, como calendários escolares e turmas que ainda não foram homologados, o que faz com que professores estejam dando aulas sem saber se permaneceram trabalhando com os mesmos alunos ao longo do ano. “Quando não há homologação das turmas, há uma incerteza se os professores e funcionários ficarão. O que a gente pode avaliar é que não temos condições de avaliar de forma mais correta porque está deixando muito a desejar na área da educação pela confusão que ainda temos nas escolas”, diz.

Helenir também critica o governo pela manutenção da política de fechamento de turmas e realocação do quadro de pessoal da Secretaria de Educação, o que faz com que, em algumas escolas, professores que atuavam na biblioteca tenham sido transferidos para a sala de aula, fazendo com que os espaços sejam fechados. Cita também a redução da disponibilidade de orientadores e supervisores nos colégios. “Tem escolas em ambientes violentos que funcionam em três turnos, mas têm orientação em apenas um deles. Como um diretor vai escolher se precisa de orientação de manhã, de tarde ou de noite? Tu não pode poupar recursos quando tu desorganiza a estruturação ideal da escola”, diz.

A última cobrança de Helenir para o governo é em relação ao pagamento dos salários dos servidores. “Na campanha, o governador Leite dizia que o atraso era uma questão de gestão. Nós estamos aguardando o posicionamento do governo para voltarmos a ter dia para receber. De preferência, dentro do mês, como manda a Constituição”.

Helenir (dir.) avalia que o governo precisa ir além do discurso | Foto: Joana Berwanger/Sul21

O Sindicato dos Engenheiros do Rio Grande do Sul (Senge-RS) também faz uma avaliação crítica do início do governo. “A nossa avaliação é de inconformidade com a praticamente paralisia do governo do Estado nesses 100 dias. A gente sempre entende que 100 dias é um período curto, mas, no mínimo, o governante tem que dar um indicativo de questões relevantes, planos futuros para o desenvolvimento do Estado, principalmente num estado como o nosso, que está quebrado e com dificuldades muito sérias”, diz José Luiz Bortoli de Azambuja, vice-presidente.

Para Bortoli, o governo está muito focado na aprovação da Proposta de Emenda Constitucional (PEC) que retira a obrigatoriedade da realização de plebiscito para a privatização das estatais Companhia Estadual de Energia Elétrica (CEEE), Companhia Riograndense de Mineração (CRM) e Sulgás. “Lamentavelmente, parece que o enfrentamento da crise parece ter uma única receita, parece que a única solução é vender as nossas empresas, que nós aqui do sindicato consideramos estratégicas para o setor do energia”, diz. O Senge é uma das entidades que têm participado da campanha de recolhimento de assinaturas para que o governo do Estado promova o plebiscito para as privatizações. “Talvez até ganhe a privatização, mas é um direito da população decidir se quer ou não quer. A gente quer que essa discussão seja feita abertamente”.

O engenheiro também critica a demora do governo em nomear diretorias de empresas e de órgãos estatais, como a Empresa de Assistência Técnica e Extensão Rural (Emater). “A diretoria da Emater até hoje não foi nomeada, ainda é a mesma do governo anterior. Uma empresa estratégica, que está com orçamento aquém das necessidades, cujo escritório sofreu um incêndio e até hoje não foi reativado”, diz.

O sindicato ainda cobra do governo que a defendida abertura do diálogo resulte em frutos. Bortoli diz que o Senge levou ao governador a proposta de que os trabalhadores das fundações extintas pelo governo Sartori que se mantêm em seus cargos por decisão judicial poderiam ser aproveitados pela Universidade Estadual do Rio Grande do Sul (UERGS), bem como a sede da Fundação de Ciência e Tecnologia (Cientec) poderia se transformar em um campus da instituição de ensino. “Essas coisas que poderiam e deveriam estar sendo tratadas não têm nenhuma sinalização do governo”, afirma.

Leite ainda não sinalizou o futuro das fundações extintas e ameaçadas e de grande parte dos servidores | Foto: Guilherme Santos/Sul21

Para Juliano Pörsch, diretor-colegiado do Semapi, sindicato que representa grande parte dos trabalhadores das fundações extintas, essa proposta de aproveitamento dos profissionais pela UERGS é algo que poderia ir adiante e ainda não foi no governo Leite. “Esperávamos mais do novo governador em termos de definições de ações positivas. Estranhamos muito a demora na definição de novos diretores de fundações e empresa, não só das nossas categorias. Novos gestores ainda não assumira, então o novo governo ainda não tem cara de novo”, diz.

Famurs saúda acordo sobre repasses

Uma das situações mais críticas no final do governo de Sartori era a questão dos atrasos nos repasses da saúde para prefeituras e hospitais filantrópicos. Em novembro passado, secretários municipais de saúde e representantes de mais de 200 municípios do Rio Grande do Sul chegaram a redigir uma carta em que denunciavam um “iminente colapso” na saúde devido a uma dívida do Estado com municípios superior a R$ 1 bilhão, sendo R$ 660 milhões para os municípios e R$ 550 milhões para os hospitais.

Em fevereiro, a Secretaria Estadual da Saúde (SES) firmou um acordo com os hospitais para a abertura de uma linha de financiamento no valor de R$ 100 milhões disponível a 116 instituições e a ser paga pelo governo estadual em troca da manutenção do atendimento pelo Sistema Único de Saúde. Em abril, a SES acordou com a Famurs a retomada dos repasses aos municípios do valor de R$ 41 milhões mensais. O governo ainda se comprometeu a pagar R$ 162,7 milhões dos repasses atrasados em 36 parcelas. A ideia da secretaria é manter regularizados os repasses mensais a partir de agora, deixando o restante da dívida ainda não empenhada para negociação futura.

Presidente da Federação das Associações de Municípios do Rio Grande do Sul (Famurs), o prefeito de Garibaldi, Antonio Cetollin, considera positiva a negociação e que, até o momento, tem de fato ocorrido “muito diálogo” entre governo e municípios sobre a questão da saúde. “Acho que está dentro de uma normalidade esse início de governo. Não é que hoje esteja bem. A crise continua. Tem inúmeros municípios que o estado pagou apenas uma parcelinha de um mês”, ressalva. Por fim, pondera que os municípios ainda aguardam por negociações sobre outras áreas, como a ampliação de acessos rodoviários e a qualificação das estradas.

Vivian (dir.) durante encontro com o presidente da AL-RS, Luís Augusto Lara | Foto: Agência de Notícias ALRS

Vivian

Questionado sobre a avaliação de demora do governo em adotar ações concretas, o secretário-chefe da Casa Civil, Otomar Vivian, destaca ações como o lançamento dos programas RS Seguro e RS Parcerias, voltados, respectivamente, para o combate ao crime e para estimular concessões e Parcerias Público-Privadas (PPPs). “São 100 dias com a busca constante por avanços em ações e programas estruturantes e estratégicos”, diz.

Ele saúda também a relação que o governo construiu com a Assembleia Legislativa nesse início de governo. Oficialmente, 40 dos 55 deputados estaduais fazem parte da base aliado ao governador, com apenas 13 na oposição e dois, do Novo, com a posição declarada de independência, ainda que com afinidade à agenda econômica de Leite. “É importante salientar a construção de um diálogo com o Poder Legislativo e a consciência da realidade que o Estado enfrenta por toda a sociedade”, diz.


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