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2 de novembro de 2018
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21:52

No governo, Moro escancara alinhamento com o discurso de ‘fuzilar a petralhada’

Por
Sul 21
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No governo, Moro escancara alinhamento com o discurso de ‘fuzilar a petralhada’
No governo, Moro escancara alinhamento com o discurso de ‘fuzilar a petralhada’
Em visita ao Acre, durante sua campanha à Presidência da República, o então candidato Bolsonaro sugeriu ‘fuzilar a petralhada’ | Foto: Reprodução

Cida de Oliveira,
da RBA

O ano que se inicia em 1º de janeiro de 2019 deve inaugurar uma nova era em que os direitos humanos para negros, LGBT, indígenas e trabalhadores das periferias e bolsões de pobreza nas regiões centrais serão ainda mais violados. A perspectiva é do presidente do Conselho Estadual dos Direitos da Pessoa Humana (Condepe) de São Paulo, o advogado Dimitri Salles.

Para o defensor dos direitos humanos, os sinais de tempos sombrios vão além das ondas de violência provocadas sobretudo pelos seguidores de Jair Bolsonaro (PSL), que como ele defendem a ditadura, a tortura, o “fuzilar a petralhada”, que não cessaram mesmo com a sua eleição. Estão nos discursos declarados dos governadores eleitos, como João Doria (PSDB), de São Paulo, que já deu salvo-conduto para sua polícia “matar suspeitos”, porque serão contratados os melhores advogados para defendê-los. E de Wilson Witzel (PSC), do Rio Janeiro, que falou em recrutar atiradores de elite para matar a distância, inclusive de helicópteros. E, principalmente, na ida para o governo do juiz de primeira instância da Justiça Federal de Curitiba Sérgio Moro.

“O alinhamento do juiz de primeira instância com o discurso de metralhar a petralhada ou de expulsar os que são contrários (ao governo) escancara a relação promíscua entre a política e o Judiciário quando Sérgio Moro, ainda nas funções de magistrado, se reúne com o presidente eleito e aceita ser ministro da Justiça, escancarando que a sua posição, em todo esse tempo, tinha sim viés ideológico e partidário. Não se indica ou nomeia ministro se não houver relação de confiança ou identidade ideológica”, disse Salles nesta quinta-feira (1), durante a primeira reunião da Comissão de Direitos Humanos da Câmara dos Vereadores de São Paulo, presidida pelo vereador Eduardo Suplicy (PT).

“Para mim é nítida a orientação de que a partir de 1º de janeiro, no estado de são Paulo, as violações aos direitos humanos serão muito maiores. Me parece que a orientação dada pelo governador eleito, em suas falas, é de desmerecer os direitos humanos, o estado democrático de direito e impor uma administração absolutamente descomprometida da razão pública, com as leis conforme interesses pragmáticos de uma onda reacionária, conservadora, de extrema direita, que assola o país e que espero não dure por muito tempo”.

Por isso, a preocupação é grande. O atual discurso de ódio se espalha no espaço já institucionalizado para a violência, que jamais foi apurada e muito menos punida. É o caso de chacinas ocorridas nos últimos anos, que nunca foram apuradas e nem os responsáveis punidos. “Não há segmentação de uma cultura de valorização dos direitos humanos”.

Extrema direita

Para piorar a situação, o processo eleitoral de 2018 despertou algo inédito na história do Brasil: a sociedade brasileira autorizando, deliberadamente, discursos de ódio e violência ou compondo um governo de caráter de extrema direita.

“Quando a gente diz que Bolsonaro é de extrema direita, de orientação fascista, significa dizer que o estado de direito será submetido ao estado de violência, que estimula a prática de violência pelos agentes públicos, em vez de promover a atuação do Ministério Público, da defensoria pública, de comissões legislativas em defesa dos direitos humanos”.

Salles ressalta o discurso do então candidato Doria. “A partir de 1º de janeiro a polícia está autorizada a matar e eu vou buscar os melhores advogados para defender os policiais que matarem suspeitos. Vejam que situação: ninguém está autorizado a matar. O estado não é autorizado a matar. E além de o governador autorizar, ele se coloca como um homem rico, que vai pessoalmente pagar os melhores advogados para poder garantir a impunidade a policiais que estão obedecendo sua ordem de matar, e não como governante. Num contexto do estado de violência, continuarão impunes”.

“O outro discurso que chamou atenção é o do governador do Rio de Janeiro, dizendo que ia buscar atiradores de elite para fazer intervenções nas áreas urbanas, nas favelas, repetindo insistentemente a autorização. Ou seja, o pressuposto é a desumanização do ser humano. Não se indica ou nomeia ministro se não houver relação de confiança ou identidade ideológica. Estamos vivendo no Brasil um processo de muita violência contra o estado democrático de direito. Estamos vivendo sob a égide de um estado de exceção ainda que a democracia formal, em alguma medida, esteja funcionando”.

Dimitri Salles destacou ainda que o clima de violência tem gerado um mal-estar generalizado, causador de doenças físicas e emocionais e medo, chegando a interferir em rotinas como ir à universidade, por exemplo. É o caso da Universidade de Brasília (UnB), em que turmas de pós-graduação em Direito com 30 alunos matriculados, estão recebendo três. Um familiar do advogado, que estuda lá, relatou que as pessoas não estão indo à faculdade com medo de tensões, como aquela provocada por um grupo de extrema direita que quer impor a Escola sem Partido na universidade. “Muitos professores estão constrangidos dentro de suas salas de aula, podendo ser filmados, o que é ilegal. Mas o fato, por si só, é violador do papel do professor”.

O alento, segundo ele, é o surgimento de iniciativas institucionalizadas, como o observatório da violência por intolerância, da Defensoria Pública do Estado de São Paulo, ou voluntárias, como o Mapa da Violência, para receber e encaminhar denúncias. No entanto, em que pese a boa intenção, não há ainda estrutura preparada para dar conta de tamanha demanda, o que pode comprometer a continuidade do trabalho.

Ameaças

A ativista dos direitos humanos Maria Amélia de Almeida Teles também participou da reunião, que contou com os vereadores Juliana Cardoso (PT), Sâmia Bonfim (PSol), Toninho Vespoli (Psol) e Soninha Francine (PPS). Militante política, Amelinha e o marido Cezar Augusto Teles foram presos e torturados em 1972. A história foi exposta por ela recentemente no programa eleitoral de Fernando Haddad, o que trouxe mais ameaças e perseguições a ela pelas redes sociais, que deverão ser investigadas.

Em sua participação, a defensora pública Juliana Belloque afirmou que os índices de violência por intolerância têm aumentado no estado. E que as principais denúncias são de vítimas de preconceitos raciais e de homofobia – daí o órgão ter criado o Observatório da Violência por Intolerância.

Estiveram também na reunião a defensora Isadora Isadora Brandão Araujo da Silva e o cientista social Igor Silva, fundador da plataforma digital Mapa da Violência, lançada em outubro.


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