Número de candidaturas trans no Brasil bate recorde em 2018

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Número de candidaturas trans no Brasil bate recorde em 2018
Número de candidaturas trans no Brasil bate recorde em 2018

Débora Fogliatto

Em março deste ano, o Supremo Tribunal Federal (STF) determinou que eleitores travestis e transexuais já poderiam incluir o seu nome social no título de eleitor e no caderno de votação das eleições. Em meio a uma onda de intolerância e preconceito que toma conta do país, essa conquista vem acompanhada de outra boa notícia para a comunidade LGBT: o número de candidaturas de pessoas transexuais aumentou dez vezes em relação a 2014, chegando a 52 candidatos a quatro diferentes cargos.

Neste ano, pela primeira vez o Brasil terá uma candidata trans ao Senado Federal, Duda Salaberi, do PSOL de Minas Gerais, que se identifica como travesti. Ela é presidenta da “Transvest”, ONG que oferece gratuitamente curso para travestis e transexuais de Belo Horizonte, e se apresenta como “professora de literatura, educadora popular, acadêmica de Gestão Pública, ambientalista, vegana, ativista pelos direitos humanos e dos animais e a Primeira travesti da América Latina candidata ao Senado Federal”.

Duda Salabert é a primeira candidata travesti ao Senado brasileiro | Foto: Divulgação/ Facebook

Além de Duda, as eleições 2018 trazem duas candidaturas a deputada distrital pelo Distrito Federal; 17 a deputada federal; e 32 a deputada estadual, segundo levantamento da Associação Nacional de Travestis e Transexuais (Antra). Destas, somente uma candidatura é de um homem trans. Nas últimas eleições, apenas cinco pessoas transexuais concorreram a cargos no Brasil.

O partido que mais têm candidatas trans é o PSOL, com cinco representante em 12 estados; seguido por PT e PCdoB com cinco candidaturas em quatro estados cada; e PMB, com quatro candidatas em três estados. Mas há representantes transexuais ainda no PSDB, DEM, Avante, PSB, PPS, PCB, REDE, PP, MDB, PSD, PDT e PHS.

Nos estados, Minas Gerais conta com outras três candidatas trans além de Duda. Mas o Estado com mais candidaturas desta população é São Paulo. São quatro postulantes ao cargo de deputada federal: Ana Beatriz (PDT); Renata Peron (PSOL); Leonora Aquila (PHS) e Tiffany Abreu (MDB). Já concorrendo a uma vaga na Assembleia Legislativa paulista são oito candidatas: Carla Ziper (PMB); Thífany Félix (PMB); Erika Hilton (PSOL); Profa. Luiza Coppieters (PSOL); Erika Malunginho (PSOL) Alexya Salvador (PSOL); Hailey Kaas (PSOL) e Flavia Alessandra (PT).

No Rio de Janeiro, são oito pessoas trans e travestis, de seis partidos diferentes: para a Assembleia Legislativa carioca, concorrem Daniele Balbi (PCdoB); Barbara Aires (PSOL); Danielle Nunes Mulher (PSOL); Cristian Lins (PT); Professora Jaqueline de Jesus (PT); e Loren Du Buá (MDB). Já à Câmara dos Deputados, candidataram-se Giovana Cambrone (REDE) e Barbara Sheldon (PP).

Rio Grande do Sul

No Estado, há apenas uma candidata trans, a jornalista Luíza Eduarda dos Santos. Em 2016, nas eleições municipais, foram três candidaturas de mulheres transexuais em Porto Alegre: Ana Paula Sander, do PSOL, Luisa Stern, do PT, e Glória Crystal, do MDB. Mas nenhuma delas se elegeu e nem decidiu tentar um cargo estadual ou federal neste ano. Na ocasião, Luíza Eduarda concorreu a uma vaga na Câmara Municipal de Novo Hamburgo, sua cidade natal.

Luíza Eduarda no dia em que fez a perícia psiquiátrica para a retificação de seu nome, em foto que ela considera muito representativa | Foto: Divulgação

Filiada ao PSOL desde 2013, legenda na qual integra as setoriais LGBT e de Mulheres, Luíza relata que entrou na militância em virtude da percepção de que precisava se engajar para lutar pelos direitos das pessoas trans. Jornalista formada pela Unisinos, ela atuou como assessora de imprensa na Câmara de Vereadores de Estrela e foi repórter no jornal Folha de Estrela, no interior do Estado, cidade onde viveu por 30 anos, antes de retornar a Novo Hamburgo. Atualmente, escreve um blog intitulado A Arte de ser Luíza, em que trata de suas experiências enquanto pessoa trans, e começou recentemente a colaborar para o portal feminista Casa da Mãe Joana.

O ativismo político e na causa LGBT veio quando uma conhecida convidou Luíza para dar uma palestra no Instituto Federal de Canoas sobre sua experiência como mulher transexual. A partir dali surgiram outras oportunidades de palestras, entrevistas, mesas de debate e colaboração com trabalhos acadêmicos. “É frequente eu servir como fonte de trabalhos, sendo procurada por estudantes de Jornalismo da PUC, UFRGS, Unisinos, Feevale, e já fui para Santa Catarina dar uma palestra em um Instituto Federal. Muitas vezes as pessoas acabam me indicando, uma atividade vai puxando a outra. Daí fica bem corrido o negócio”, brinca.

Segundo Luíza, sua candidatura em 2016 surgiu “de forma totalmente natural”. “Havia o entendimento de que era preciso ter a candidatura de uma pessoa como eu, que tivesse ideias diferenciadas sobre as minorias, e eu então acabei tendo apoio de todo partido, inclusive da direção estadual”, conta.

Na época, como ela ainda não havia retificado seu nome nos documentos, foi necessário conseguir o registro da candidatura com seu nome social. “Era um caso específico, então houve uma certa dificuldade por parte da própria Justiça Eleitoral, mas depois que comprovaram que realmente era uma candidatura de uma pessoa trans, foi liberada, e não tive outras dificuldades durante a campanha em termos de registro”, recorda. No ano passado, ela entrou com o processo de retificação civil e obteve o direito, em junho deste ano. Então, agora, o registro já aconteceu diretamente com o seu nome e gênero feminino.

Dados

A população transexual e travesti é estigmatizada e sofre violências diversas no Brasil, onde a expectativa de vida de uma mulher trans é de 35 anos. De acordo com a Antra, apenas em 2017 foram contabilizados 179 assassinatos de travestis ou transexuais. Isso significa que, a cada 48 horas, uma pessoa trans é assassinada no Brasil. Em 94% dos casos, os assassinatos foram contra pessoas do gênero feminino.

É por causa de dados como esses que a coordenação da Antra considera tão significativo o aumento no número de candidaturas este ano. “É exatamente isso que chamamos de importância do protagonismo. É importante porque mostra que as pessoas estão se empoderando, reivindicando esse lugar de cidadãos, que antes não era possível. Estão dizendo: nós reagimos à transfobia nos candidatando”, resume Bruna Benevides, Secretária de Articulação Política da Antra.


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