Últimas Notícias > Política > Areazero
|
3 de abril de 2018
|
12:56

Seminário defende unidade da esquerda em pautas e para combater ‘fascistização’ da sociedade

Por
Luís Gomes
[email protected]
O Seminário ‘Desenvolvimento Nacional – Dilemas e Perspectivas’ debateu o avanço do fascismo no Brasil |  Foto: Guilherme Santos/Sul21

Luís Eduardo Gomes

Organizado em parceria pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), fundações de partidos de esquerda e centro-esquerda e diversas entidades e movimentos sociais, começou na noite desta segunda-feira (2), na Assembleia Legislativa, o seminário “Desenvolvimento Nacional – Dilemas e Perspectivas”, que tem como um de seus objetivos construir pautas únicas para o bloco de partidos progressistas e desenvolver estratégias para combater o avanço das forças reacionárias. No primeiro dos seis debates previstos para os meses de abril e maio, intitulado de Democratização e reforma do estado e garantia de direitos”, o ex-governador Tarso Genro (PT), a suplente da Câmara Federal Ângela Albino (PCdoB-SC) e o pré-candidato do PDT ao governo o Rio Grande do Sul, Jairo Jorge, debateram o momento de “fascistização” da sociedade brasileira e alternativas para se contrapor a isso.

O evento começou com “um minuto de aplausos” em homenagem à memória da vereadora assassinada Marielle Franco (PSOL). Na mesa de abertura que antecedeu o debate do dia, comandada pela ex-deputada estadual Jussara Cony (PCdoB), representantes das fundações dos partidos PT, PCdoB, PDT, PSB e PSOL destacaram a importância de se construir bandeiras comuns para todos os partidos de esquerda, como a defesa da democracia, da soberania nacional e dos direitos sociais. Em diversas falas, as palavras “unidade” e “frente ampla” emergiam. Contudo, o deputado estadual Altemir Tortelli (PT), que participou da mesa de abertura representando a Assembleia Legislativa, destacou que a energia que tem motivado as fundações dos partidos progressistas a buscarem essa união deve se refletir na prática, isto é, nas eleições e atuações legislativas para construir “uma grande frente para derrotarmos o golpismo”, o que, segundo ele, já foi feito pelo “povo na rua” nas mobilizações contra a reforma da Previdência.

O ex-governador Tarso Genro destacou em sua fala que o Brasil vive um enigma político que não é diferente daquele enfrentando em muitos países da Europa, isto é, o da validade do modelo liberal-democrático-representativo. “Ele ainda é capaz de absorver e processar crises segundo aqueles modelos tradicionais de composição de maiorias dentro da democracia política ou não? Aparenta, aqui no Brasil, que não. Este modelo republicano-representativo que está aqui demonstrou a impotência brutal, tanto é verdade que as forças conservadoras, reacionárias, neoliberais deram um golpe institucional, articulado com o Congresso Nacional, mas um golpe para derrubar uma presidenta legítima e colocar no seu lugar uma confederação de investigados e denunciados. Está aí o país sofrendo essa crise”, disse, em conversa com a reportagem.

Tarso Genro avalia que o grande dilema da democracia é se o modelo representativo ainda tem validade  |  Foto: Guilherme Santos/Sul21

Para Tarso, seria justamente a capacidade de absorver e processar crises sem perder seus fundamentos a grande demonstração de vitalidade desse modelo de democracia, contudo, no Brasil, teria ocorrido o contrário. “A representação política foi esquartejada. Os partidos políticos foram neutralizados pelo controle e a manipulação da informação que fazem os grandes grupos de comunicação. Então, se você extingue a vitalidade dos partidos, você dissolve a legitimidade da política, você produz na opinião pública um sentimento de ódio contra tudo que não seja o modelo neoliberal. O que você gera? Gera a desconstituição do modelo democrático moderno tal qual ele está instalado. Então, é isso que o pensamento da esquerda, democrática, republicana e socialista tem que debater. Até onde é possível suportar isso? Tem recuperação ou não?”

Questionado se o País estaria rumando para um novo golpe de Estado ou para a possibilidade de não ter eleições, Tarso fez referência a uma fala do filósofo Vladimir Safatle, de que o Brasil estaria rumando para uma guerra civil, para dizer que não acredita ser esse o caso. “Nós podemos estar a caminho de uma fascistização do Estado brasileiro de novo tipo, através da combinação do autoritarismo estatal, comandado pela hipnose da Rede Globo, de um lado, e de grupos privados cometendo atos de violência. Mas, a população vai reagir também. Isso aí tem que ter um paradeiro. E essa reação que não se sabe qual é a sua potência real de confronto, se esse confronto ocorrer. Tomara que seja um confronto político”, afirmou.

Ângela Albino alertou que a democracia vem sendo tratada como ‘entulho’ | Foto: Guilherme Santos/Sul21

Presidente do PCdoB de Santa Catarina, Ângela Albino ponderou que o principal debate que o Brasil deve fazer hoje é como conjugar desenvolvimento econômico, democracia e direitos sociais. “A gente vai formando a convicção de que nós vivemos num tempo do neoliberalismo que a democracia passou a ser um entulho, não só no Brasil, como em outros lugares. A própria sede que eles têm de prender o Lula significa isso, evitar que o povo escolha. A democracia como entulho. Junto com isso, um contexto de perda de direitos sociais que, na nossa convicção, vai cada vez mais abalando o desenvolvimento econômico do País. Um povo empobrecido não tem condições de ser mercado de consumo”, disse.

Assim como Tarso, Ângela também destacou que o momento de retrocessos em direitos não é exclusivo do Brasil, mas compartilhado por quase toda a humanidade. “Nós, às vezes, mesmo na esquerda, subestimamos o tamanho do enfrentamento que é a questão do fundamentalismo nesse momento de ódio, que é, inclusive, muito insuflado por religiões, uma coisa assombrosa. Então, essa forma como o ódio se impôs como nicho eleitoral para nós é uma faceta muito preocupante desse momento de retrocesso que o Brasil vive, porque vai criando no imaginário do povo um sentimento que é esse caminho mesmo, tem que perder direitos. Não consegue ver que o próximo que vai ser devorado somos nós todos”.

Jairo Jorge fez a defesa da radicalização da democracia | Foto: Guilherme Santos/Sul21

Ex-prefeito de Canoas e pré-candidato ao Palácio Piratini, Jairo Jorge também abordou o momento “sombrio” de intolerância e ódio vividos no País. Jairo considerou que os ataques contra a Caravana de Lula em sua passagem pela região não são agressões apenas à esquerda e ao PT, mas contra a democracia, e que exigem que seja feita uma reflexão sobre os rumos da democracia e construída de forma comum um “novo destino” para o País. Para ele, esse novo destino passa pela “radicalização da democracia”.

“Eu defendo isso há muitos anos e acho que, neste momento em que se acirra os ânimos, no momento em que a democracia corre risco, todos nós democratas devemos buscar a convergência, o diálogo, e responder dessa forma àqueles que marcam a atuação política pela intolerância respondendo de outra forma, com diálogo, com tolerância. Acho que este é o melhor caminho para que a gente possa isolar esses setores que, na verdade, usam da violência para impor suas opiniões”, afirmou.

O seminário prossegue na próxima segunda-feira (9), mais uma vez no Teatro Dante Barone da Assembleia Legislativa, às 18h30, com o debate sobre “Soberania Nacional e Integração Internacional Não-Subordinada”, com a presença prevista de Renato Rabelo (presidente da Fundação Mauricio Grabois, vinculada ao PCdoB), Gilberto Maringoni (historiador e representante da Fundação Lauro Campos, vinculada ao PSOL), Miguel Rosseto (ex-ministro e pré-candidato do PT ao governo do RS) e Análucia Danilevicz (professora do Núcleo Brasileiro de Estratégia e Relações Internacionais da UFRGS).


Leia também
Compartilhe:  
Assine o sul21
Democracia, diversidade e direitos: invista na produção de reportagens especiais, fotos, vídeos e podcast.
Assine agora