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10 de abril de 2018
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11:52

Se o eleitorado se resumisse ao Fórum da Liberdade, João Amoêdo seria presidente do Brasil

Por
Luís Gomes
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Com 1% nas pesquisas eleitorais, João Amoêdo ganhou os corações do Fórum da Liberdade | Foto: Guilherme Santos/Sul21

Luís Eduardo Gomes

Pela primeira vez neste ciclo eleitoral, seis pré-candidatos à presidência da República — João Amoêdo (Novo), Henrique Meirelles (MDB), Flávio Rocha (PRB), Ciro Gomes (PDT), Marina Silva (Rede) e Geraldo Alckmin (PSDB) — se reuniram na noite desta segunda-feira (9) no Fórum da Liberdade, que está sendo realizado na PUCRS, em Porto Alegre. Ao longo de 2h40, cada pré-candidato teve 15 minutos para apresentar o seu “projeto de País e de nação” e para responder a duas perguntas. Ausentes, no entanto, estavam aqueles que lideram as pesquisas eleitorais, Lula (PT), preso no último sábado, e Jair Bolsonaro (PSL), que foi convidado, mas não compareceu. Os dois, porém, pairaram sobre todo o debate, na tentativa de alguns pré-candidatos de se aproximarem da agenda conservadora de Bolsonaro e no uso de frases de efeito para criticar os governos petistas, que sempre caem bem diante de um público voltado para a direita.

Tradicional evento do pensamento econômico liberal de Porto Alegre — é promovido pelo Instituto de Estudos Empresariais (IEE) e patrocinado por empresas como RBS e Gerdau –, se o Fórum da Liberdade fosse uma competição esportiva, João Amoêdo (Novo) seria o time da casa. Na plateia e nos quiosques do evento, era possível ver diversas pessoas com a camiseta laranja do seu partido. Primeiro a falar e o mais aplaudido de todos os seis palestrantes, inclusive por uma parcela das pessoas que estava na área reservada para a imprensa, Amoêdo fez um discurso de defesa do estado mínimo, privatizações e de defesa do capitalismo.

Em uma apresentação com direito a power point, prometeu também cortar ministérios, fazer a reforma da Previdência, substituir a educação e a saúde públicas por um programa de cupons (em que o Estado compra vagas em instituições privadas em vez de ter uma estrutura pública), parcerias público-privadas para presídios, acabar com o fundo partidário e, num dos pontos em que foi mais aplaudido, a revogação do estatuto do desarmamento. “O Brasil não precisa de um estado grande porque é pobre, ele é pobre justamente porque tem um estado grande”, disse em uma de suas frases de efeito de cartilhas liberais. Talvez a grande lástima para Amoêdo seja que o Brasil não é composto por uma maioria esmagadora de homens brancos, entre 20 a 40 anos, estudantes da PUCRS ligados a movimentos liberais e a setores do empresariado, porque nesse ambiente sua intenção de votos era certamente maior do que o 1% que alcança nas pesquisas.

Henrique Meirelles também fez um discurso de economista liberal,  mas a optou pela tarefa mais difícil de defender o governo Temer | Foto: Guilherme Santos/Sul21

Se João Amoêdo vendeu o sonho liberal para uma plateia ávida por consumir esse discurso, coube ao ex-ministro da Fazenda Henrique Meirelles (MDB) fazer uma defesa do governo de Michel Temer (MDB), com quem teoricamente disputará a chance de ser o candidato de situação nas eleições de outubro. Se apresentando como alguém que primeiro mostra resultados e depois fala sobre eles, Meirelles foi recebido com menos entusiasmo, ainda assim foi aplaudido em alguns momentos pelo público ao defender a reforma da Previdência, uma diminuição do papel intervencionista do Estado na economia, a lei do teto de gastos e uma política de redução de despesas — a segunda ainda não implementada pelo governo que precisou gastar dezenas de bilhões para se salvar de um impeachment — e a criação de condições macroeconômicas para que os empreendedores gerem emprego e renda e, só a partir de um crescimento econômico posterior, financiar políticas sociais. Isto é, a defesa, com outras palavras, do discurso de que é preciso primeiro fazer o bolo crescer para depois compartilhar, uma promessa que já era antiga nos governos militares. Curiosamente, ao ser questionado pelo mediador, deixou escapar que concorda que faltou a legitimidade do voto para Temer concluir sua agenda de reformas. “Não há dúvida que um governo eleito este ano terá toda as condições, seja de conduzir as reformas, seja de fazer algo que vá além”, disse.

Flávio Rocha  fez uma palestra de defesa da Riachuelo e de ataque ao “marxismo cultural” | Foto: Guilherme Santos/Sul21

Mais um a se apresentar como defensor do capitalismo, Flávio Rocha (PRB) gastou uma boa parte de sua fala fazendo a defesa da grupo Riachuelo – do qual é dono -, dizendo ser vítima de perseguição pelo Ministério Público do Trabalho, a quem chamou de “aristocracia burocrática tóxica” e “máquina de destruir empregos” por investigar denúncias de violações trabalhistas em fábricas de seu grupo no interior do Rio Grande do Norte. Quando se deu conta de que não era candidato a dono da Riachuelo, mas a presidente do Brasil, dirigiu seus ataques aos governos petistas e responsabilizou a esquerda pela decadência moral e de valores da sociedade com conceitos que incluíam os termos “gramsciano” e “marxismo cultural” –  muito aplaudidos. Após uma tentativa do mediador de ajudá-lo pedindo que explicasse como era ser conservador em temas sociais, mas não moralista, Rocha concordou que as duas coisas não são sinônimos, mas prontamente voltou a demonstrar indignação com a corrupção dos valores, especialmente da família, fez um elogio a Bolsonaro — ressalvando que ele seria “de esquerda na economia” — e alegando que esta posição de defesa de valores tem de 80% a 90% de aprovação da população — embora não tenha dito de onde saíram esses números.

Ciro Gomes tentou agradar o empresariado da plateia ao mesmo tempo que ironizou o discurso liberal em alguns momentos | Foto: Guilherme Santos/Sul21

Curiosamente, Ciro Gomes (PDT), que logo de cara demarcou que estava ali como um trabalhista, teve provavelmente a segunda maior torcida no evento, sempre ruidosa diante de suas frases de efeito — em alguns momentos, tão ansiosa por aplaudir que ele teve que pedir calma para poder concluir seu raciocínio. Na tentativa de atingir a parcela do público que lhe era hostil, Ciro tratou também de fazer um elogio à iniciativa privada. Contudo, diferente dos pré-candidatos que o antecederam, disse que apenas desconfiava que ela não era capaz de promover sozinha o desenvolvimento econômico e social, como os outros pregavam que seria. O que ele defendeu então foi um arranjo entre o setor produtivo, os trabalhadores e o governo para a elaboração de uma política de desenvolvimento que possa colocar o Brasil no rumo do crescimento sustentável, destacando, por exemplo, a necessidade de retomada da participação da indústria no PIB nacional, que chegou a ser de 30% nos anos de 1960 e agora está em 11%, segundo números que apresentou.

Calejado por seus autoproclamados 38 anos de vida pública, Ciro inclusive arriscou um leve deboche dos candidatos que o antecederam, ao criticar o “império da frase feita”, e até da plateia, ponderando que se assusta com a segurança que certos jovens têm de que possuem todas as respostas e soluções para o Brasil. “Qual foi a nação do mundo que conseguiu ascender sem uma convergência mista, iniciativa privada e do governo em um plano de desenvolvimento?”, questionou Ciro à plateia ávida pela defesa das privatizações. Tema esse, aliás, que veio à tona na pergunta do mediador, no que Ciro respondeu que não era necessariamente contrário a privatizações, mas sim contra a venda do setor de petróleo, que, segundo ele, está fazendo com que o Brasil venda suas bacias para exploração de estatais de outros países e a um preço do barril (US$ 1,35) menor do que o de uma lata de coca-cola no mercado internacional. “Quem está certo, nós ou eles? O estado que precisamos não é o grande nem o pequeno, mas o necessário”, disse.

Ciro e Marina em uma manifestação de afeto durante o evento | Foto: Guilherme Santos/Sul21

Destoando de outros pré-candidatos por sair do economês, Marina Silva (Rede) disse que não iria se apresentar como uma pessoa pragmática e objetiva, mas como uma sonhadora. Afirmou que, se fosse menos sonhadora e mais pragmática, jamais teria deixado a realidade de ser uma adolescente analfabeta aos 16 anos, tendo contraído malária, leishmaniose e passado por outras agruras, para virar professora, senadora e candidata à presidência com 22 milhões de votos. O sonho que Marina tentou vender era de que todos os brasileiros gostariam de viver em uma nação com igualdade social, desenvolvida economicamente, ambientalmente sustentável, culturalmente diversa e na qual a esperança pode vencer o ódio político. Curiosamente, coube a ela fazer a crítica mais realista ao momento econômico vivido no Brasil ao pontuar que a retomada do crescimento de 1% na economia se dá principalmente pelo bom resultado das commodities e pela volta das pessoas ao mercado de trabalho mais como “inércia” do que como geração de empregos — antes, Ciro também já havia alertado para o grande crescimento recente da informalidade no País –, mas que estas condições não permitiam um crescimento sustentável. “O que fazer quando os ventos sopram ao contrário e a gente não tem uma economia diversificada para sustentar um processo de crise?”, questionou.

Nas perguntas, teve que responder sobre sua suposta omissão no debate nacional nos últimos anos. Disse que sempre se posicionou, mas que pagava o preço de não ficar nem do lado azul, nem do lado vermelho – esquecendo talvez de sua aliança com Aécio. Defendeu o fim do foro privilegiado e a execução a partir da condenação em segunda instância, dizendo, porém, que desde que as duas coisas andassem juntas. “E o Renan? E o Aécio?”, questionou, lembrando assim do tucano, para ganhar seus aplausos mais altos da noite. Voltaria a ser aplaudida na pergunta seguinte, sobre quem seria o seu time de economistas, ao afirmar que estava trabalhando como nomes como Eduardo Gianetti e André Lara Rezende, dois liberais.

Marina Silva negou ser sumida, dizendo apenas que não é nem do lado vermelho nem do azul | Foto: Guilherme Santos/Sul21

Último a falar, Geraldo Alckmin (PSDB) talvez seja aquele entre os candidatos de viés liberal que melhor tenha percebido que o evento na PUCRS já fazia parte, ainda que não de maneira oficial, do calendário eleitoral brasileiro. Assim, em vez de pregar utopias e fazer defesas apaixonadas do capitalismo, optou por fazer propostas. Propôs, por exemplo, que sua primeira reforma, se eleito, seria a política, com a implementação do voto distrital ou distrital misto e a imposição de cláusulas de barreiras para impedir que tenhamos 28 partidos no Congresso Nacional. “Alguma coisa está errada no nosso modelo político. Como pode o Brasil ter 35 partidos políticos. Temos 35 ideologias? Não temos”, disse.

Alckmin também defendeu a realização de uma reforma tributária, com simplificação de impostos, da reforma da presidência, e a realização de privatizações e de parcerias público-privadas para setores como rodoviário, aeroportos, ferroviário, saneamento básico, entre outros, afirmando que “PPPs são empregos na veia”. Ao concluir, o agora ex-governador de São Paulo, que é médico e filho de funcionário público, tentou demonstrar que também enfrentou “dificuldades” — “dei aulas em um cursinho para pagar a faculdade de Medicina” — e procurou recuperar a imagem já vendida em outra eleição, de identificação com o povo. Retomou ainda o discurso de que o Bolsa Família, na verdade, era uma criação tucana, sendo apenas uma junção dos bolsa escola, saúde e vale gás do governo FHC.

Geraldo Alckmin vestiu o traje de político e fez propostas de campanha | Foto: Guilherme Santos/Sul21

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