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28 de dezembro de 2017
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19:46

Um ano após autorização para extinguir fundações, servidores encerram 2017 sob incerteza

Por
Luís Gomes
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Um ano após autorização para extinguir fundações, servidores encerram 2017 sob incerteza
Um ano após autorização para extinguir fundações, servidores encerram 2017 sob incerteza
Servidores lutam desde o final do ano passado pela manutenção das fundações | Foto: Guilherme Santos/Sul21

Luís Eduardo Gomes

O final de 2016 foi de tristeza para 1,2 mil servidores de fundações e empresas públicas do Estado do Rio Grande do Sul que tiveram as extinções autorizadas pela Assembleia Legislativa em 21 de dezembro. Passado um ano, a maioria dos trabalhadores permanece em suas funções, em meio a um clima de incertezas, aguardando demissões ou transferências, mas há aqueles que ainda nutrem esperança de que as fundações possam resistir até o encerramento do governo Sartori (PMDB) graças a uma batalha jurídica que, até o momento, tem garantido a manutenção de seus empregos.

A partir da autorização da Assembleia, o governo do Estado extinguiu em janeiro a Fundação Estadual de Produção e Pesquisa em Saúde (FEPPS), a Fundação Estadual de Pesquisa Agropecuária (Fepagro) e a Fundação Instituto Gaúcho de Tradição e Folclore (FIGTF), com os trabalhadores comissionados da primeira sendo demitidos e os servidores das duas últimas, que tinham todos estabilidade já garantida, sendo transferidos para outros setores da administração pública.

Neslon Bertoldo, ex-pesquisador e presidente da Associação dos Servidores da Pesquisa Agropecuária (Assep), afirma que os servidores da Fepagro foram transferidos para o Departamento de Pesquisa da Secretaria da Agricultura, que acabou absorvendo as funções da antiga fundação. Contudo, ele diz que, passado um ano, a situação ainda é de muita incerteza, uma vez que os trabalhadores continuam a desenvolver as pesquisas que já estavam em andamento, mas que nenhum projeto novo foi iniciado e ainda não se sabe se os centros de pesquisa serão fechados ou não. Apesar de o governo já ter indicado que fecharia estruturas da antiga Fepagro no Estado, isso ainda não ocorreu.

Para ele, a extinção da Fepagro foi negativa, uma vez que não gerou nenhuma economia – visto que o quadro permaneceu de forma integral, assim como foram mantidos os custos operacionais – e ainda tornou a estrutura da pesquisa “muito burocrática e amarrada”. “Nós não sabemos qual é o aporte que o Estado vai dar para que o departamento sobreviva. Ainda não há uma definição clara sobre o futuro dos servidores, porque uma semana vai fechar o centro tal, na outra o centro tal, mas na prática isso não acontece”.

Protesto de servidores da Fepagro contra a extinção | Foto: Guilherme Santos/Sul21

Batalha judicial e aceitação do PDV 

Por outro lado, uma verdadeira batalha judicial tem impedido as demissões e a conclusão dos processos de extinção nas demais entidades: Fundação de Recursos Humanos (FDRH), Fundação Zoobotânica do RS (FZB), Fundação de Ciência e Tecnologia (Cientec), Fundação Estadual de Planejamento Metropolitano (Metroplan), Fundação de Economia e Estatística (FEE), Fundação Piratini e Companhia Riograndense de Artes Gráficas (Corag).

Originalmente, por decisão do TRT4, o governo foi impedido de extinguir as seis fundações, além da Superintendência de Portos e Hidrovias (SPH) e a Corag, sem a conclusão de um processo de negociação coletiva. Em 11 de outubro, o ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal, em uma decisão monocrática, concedeu liminar após um pedido da Procuradoria Geral do Estado (PGE) e suspendeu a necessidade de negociação coletiva.

No entanto, entre os dias 20 e 23 de outubro, após nova ação da Frente Jurídica, uma série de liminares foram concedidas pela Justiça do Trabalho determinando que servidores que completaram três anos de trabalho não poderiam ser demitidos, pois já teriam a estabilidade garantida, o que abrange quase a totalidade dos funcionários que o Estado desejava dispensar. A PGE então entrou com outra ação no STF pedindo a cassação dessas liminares, que também caiu nas mãos de Gilmar Mendes. Porém, de forma surpreendente, Mendes solicitou manifestações da Advocacia-Geral da União (AGU) e da Procuradoria-Geral da República (PGR) a respeito do processo e decidiu que encaminhará a decisão final ao Plenário do Supremo. Isto é, optou por não decidir de forma monocrática. O STF só irá analisar o caso em 2018.

Durante todo esse processo, Estado e sindicatos que representam os trabalhadores mantiveram negociações coletivas no TRT4. Em assembleia realizada no último dia 11, trabalhadores das fundações estaduais em processo de extinção ligadas ao Semapi Sindicato – FDRH, FZB, Cientec, Metroplan e a FEE – decidiram autorizar o sindicato a aceitar a proposta feita pelo governo do Estado para o estabelecimento de um Programa de Desligamento Voluntário (PDV). No dia 8, os servidores da Fundação Piratini já tinham tomado a mesma decisão.

Pelo acordo, o governo se compromete a pagar saldo de salário, férias vencidas e proporcionais indenizadas, 13° salário, aviso-prévio indenizado, multa de 40% sobre os depósitos de FGTS e indenização em valor equivalente a um salário para cada 4 anos de contrato de trabalho. Para os que não têm estabilidade reconhecida pela Procuradoria Geral do Estado (PGE), caso a liminar que os mantêm trabalhando seja cassada, há possibilidade de optar pelas mesmas condições do Programa na hora da demissão.

Em resposta a questionamentos da reportagem, a procuradora do Estado Andréia Über Espiñosa Drzewinski, coordenadora da Procuradoria Trabalhista da PGE-RS, destaca que as negociações na Justiça do Trabalho foram encerradas com a aceitação dos termos do PDV.  “Os trabalhadores não estáveis e não abrangidos por nenhuma liminar serão desligados conforme o planejamento de extinção das Fundações. Pela negociação finalizada, tanto os empregados que aderirem ao PDV quanto aqueles que forem despedidos por não possuírem estabilidade receberão um salário para cada quatro anos trabalhados, com o mínimo de um salário por trabalhador”, diz Andréia.

Segundo ela, as fundações estão em atividades de transição para seu encerramento ou transferência, mas ainda não houve remanejo de trabalhadores, o que deverá ocorrer conforme “necessidade de serviço em atenção ao interesse público”. “As atividades das Fundações estão sendo encerradas e transferidas conforme planejamento de cada entidade, com vistas a não causar prejuízo ao serviço público”, diz.

Berenice De Luca, diretora do Semapi e funcionária da FZB, salienta que o PDV foi aprovado pelas categorias para permitir que os interessados em aderir ao program pudessem optar por esse caminho, mas que não significa que o sindicato está abrindo mão de lutar pelos empregos dos servidores.

De Luca explica que a minuta do acordo ainda precisa ser encaminhada pelo Ministério do Trabalho e que os interessados têm até o dia 12 de janeiro para manifestarem-se pela adesão. Pelo acordo, o governo terá até abril para efetuar as rescisões, conforme disponibilidade de caixa. “De modo geral, a gente acredita que aquelas pessoas que já estão aposentadas serão as mais interessadas. Vai ser uma forma de saírem ganhando um pouco mais”, diz. Ela, no entanto, afirma que não é possível fazer uma previsão de quantos irão aderir ao PDV.

Atualmente, a FZB conta com 198 servidores, segundo De Luca, sendo que 72 já tem a estabilidade reconhecida pelo governo e os demais estão garantidos enquanto as liminares emitidas pela Justiça do Trabalho em outubro não forem revertidas. De Luca explica ainda que a FZB foi a única das cinco fundações cujos trabalhadores são representados pelo Semapi a ter funcionários demitido. Foram cinco, incluindo quatro ex-funcionários da Corlac e uma servidora que havia ingressado via concurso público para outra área da administração estadual, mas estava atuando na FZB. “É um entendimento do governo que essas pessoas não têm a estabilidade”, diz a sindicalista, que ainda destaca que essas pessoas podem questionar as decisões na Justiça ou aderir ao PDV, mas o que implicaria abrir mão de ações judiciais.

Servidores da Fundação Piratini protestam em frente à sua sede no final de 2016 | Foto: Guilherme Santos/Sul21

Segundo ela, a FZB continua exercendo as mesmas funções enquanto as demissões e a extinção não são confirmadas e que tem conhecimento de apenas dois servidores que foram transferidos para outras áreas, no caso a Secretaria do Meio-Ambiente (SEMA).

Das fundações cujos trabalhadores seguem protegidos por liminares, a única que teve a extinção iniciada – e depois interrompida – foi a Fundação Piratini, mantenedora da TVE e da FM Cultura. Em outubro, após a decisão de Gilmar Mendes, os trabalhadores das emissoras começaram a receber aviso prévio alertando de que seriam demitidos. Contudo, esses desligamentos foram barrados pelas liminares reconhecendo a estabilidade de grande parte dos trabalhadores. Em 30 de novembro, porém, o governo demitiu 14 funcionários da fundação que estavam em uma espécie de “limbo jurídico”, pois não ingressaram via concurso nem nos cinco anos anteriores à promulgação da Constituição – que reconheceu a estabilidade a todos os funcionários públicos que ingressaram no setor público antes de 1983, independentemente da forma de ingresso.

No final de dezembro, segundo o movimento de servidores das emissoras públicas, a Piratini decretou que todos os funcionários que tinham saldo de férias a gozar deveriam fazê-lo no final do ano, o que fez com que alguns programas ao vivo parassem de ser produzidos e fossem substituídos por reprise. Alexandre Leboutte, uma das lideranças do movimento, diz que há colegas que já estão contando com as demissões ou interessados em aderir ao PDV. No entanto, destaca que existe uma parte dos funcionários das emissoras que acredita que as batalhas judiciais garantirão, ao menos por mais um ano, a permanência em seus cargos.

Deputado Aloísio Classmann (PTB) conversa com funcionários da Corag, estatal que ele votou pela extinção | Foto: Divulgação/AL-RS

Caso da Corag 

A decisão de Gilmar Mendes, contudo, já permitiu que o governo iniciasse o processo de extinção da Corag, uma vez que os trabalhadores da casa não foram contemplados pelas liminares que garantiram estabilidade para os concursados das fundações. As principais atividades que a companhia realizava antes da autorização da extinção, a impressão do Diário Oficial e de documentação veicular para o Departamento Estadual de Trânsito do RS (Detran-RS), foram repassadas para a Companhia de Processamento Dados do Estado Rio Grande Sul (Procergs). Um setor responsável pela digitalização de documentos está parado há vários meses. Ainda permanecem algumas atividades, como a impressão de materiais para outros setores do poder público e para a iniciativa privada, além daqueles que estão atuando no processo de liquidação da companhia. “De forma geral, os trabalhadores estão ociosos”, diz Francisco Lázaro, presidente do Sindicato dos Trabalhadores nas Indústrias Gráficas de Porto Alegre (Stigpoa).

Segundo Lázaro, o processo de extinção da Corag começou de fato no dia 5 de dezembro. Até o momento, já foram homologadas 50 demissões de um total de 194 trabalhadores, mas já há mais funcionários que receberam aviso prévio, com o total de pessoas já desligadas superando a casa dos 70. A expectativa é que a extinção seja concluída ainda no primeiro semestre.

Lázaro destaca que o governo tem cometido ilegalidades neste processo, uma vez que, segundo ele, não poderia extinguir uma empresa pública lucrativa, conforme diz a legislação que regra as sociedades anônimas (SAs). A Corag fechou 2016 com lucro líquido de R$ 6,1 milhões, conforme informa o próprio site da companhia. Ele ainda salienta que estão sendo demitidos trabalhadores que têm ações na Justiça que garantem seus empregos e integrantes da Comissão Interna de Prevenção de Acidentes (CIPA), que também não poderiam ser desligados. O sindicalista lamenta que, até o momento, o judiciário tem adotado uma postura de dizer que não pode se intrometer em decisões dos poderes Executivo e Legislativo quando a legalidade dessas decisões é questionada.

Não há um PDV para os trabalhadores da Corag, mas ficou acordado que será feita a distribuição de 10% do faturamento do ano anterior para cada um dos demitidos, o que resultará em uma distribuição linear de cerca de R$ 27 mil para cada funcionário.


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