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31 de maio de 2016
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16:57

Jean Wyllys: ‘Temos de colocar as diferenças de lado e adotar uma agenda comum’

Por
Sul 21
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Wyllys: “Os movimentos horizontais que surgem das tecnologias digitais deram vozes a todos nós” REPRODUÇÃO
Wyllys: “Os movimentos horizontais que surgem das tecnologias digitais deram vozes a todos nós” REPRODUÇÃO

Helder Lima

Da RBA

O deputado federal Jean Wyllys (Psol-RJ) defendeu na segunda (30) a união das forças de esquerda e do campo progressista para que a sociedade enfrente a crise política no país. Wyllys falou no último dia do seminário Os caminhos da esquerda diante do golpe, realizado por estudantes e professores de História da Universidade de São Paulo (USP) desde o dia 23.

“A luta tem de ser generosa e pedagógica, temos de colocar as diferenças de lado e adotar uma agenda comum. E enquanto isso, temos de restituir a ordem democrática e tomar o poder dessa cleptocracia (que admite implicitamente práticas de corrupção com o dinheiro público)”, afirmou o deputado, ao encerrar sua fala amplamente aplaudida, referindo-se ao governo interino de Michel Temer.

Ao abrir sua palestra, Wyllys disse que a crise política no país é marcada pela questão da falta de representação da política tradicional, entre outras instâncias da sociedade que também passam por essa crise de representação. Wyllys identificou o problema como relacionado às possibilidades de mobilização trazidas pelas novas tecnologias de comunicação, o que está mudando a cultura política. “Os movimentos horizontais que surgem das tecnologias digitais deram vozes a todos nós e permitiram que nos organizássemos”, afirmou, destacando que essa é a principal causa da transformação em curso hoje no país e no mundo.

Cleptocracia

Ao comparar o governo de Temer a uma cleptocracia que assume o poder, Wyllys disse o processo do impeachment da presidenta Dilma Rousseff interrompeu um projeto de país, “ainda que mal e porcamente implementado a partir da Constituição de 1988. Ainda que tenhamos críticas a esse projeto, é importante lembrar que o que o PT fez ao assumir o poder desde 2003 não é pouco”, defendeu.

Para Wyllys, os programas sociais, como o Bolsa Família, o Prouni e o Minha Casa, Minha Vida, conseguiram promover a inclusão social no país, “ainda que tenha faltado o trabalho político de base, e esse processo tenha sido mais voltado ao consumo”. “Não se pode considerar pouca coisa o que foi feito pelo PT, ainda que alguns tenham se locupletado no poder”, afirmou o deputado.

Wyllys também comentou a possível volta de Dilma Rousseff ao governo, se sua defesa conseguir desmobilizar o impeachment no Senado. “Não há mais dúvida de que se Dilma voltar, vai ter de pedir novas eleições presidenciais”, disse. Wyllys comentou ainda sobre a convocação não de eleições presidenciais, mas de eleições gerais, o que ele vê com pouca chance de êxito, já que o Congresso dominante hoje é extremamente conservador e essa proposta implicaria em perda dos mandatos parlamentares. “Não me incomoda perder o mandato, mas vai propor isso no Congresso… Qualquer governo vai ter de governar com esse Congresso. Os projetos de avanços não serão tocados, e a sociedade está fértil para o fascismo”, analisou.

Para o deputado, uma dificuldade a mais é que a sociedade rejeita a agenda “contra-hegemônica” que a esquerda sustenta atualmente. “O que queremos também não é pouco”, afirmou ao mencionar as reivindicações do campo progressista, principalmente as que emergem como as questões de gênero e do feminismo. “A pessoa pula fora por causa de sua estrutura cognitiva”, disse, considerando inclusive pessoas atuantes na esquerda.

“A pessoa acha que Deus fez macho e fêmea e isso é profundamente arraigado”, defendeu. “As eleições gerais não vão trazer o resultado que a gente imagina”, disse, lembrando os direitos dos transexuais, com os quais segmentos da sociedade querem avançar.

Força da grana

Wyllys também criticou o ex-presidente da Câmara Eduardo Cunha (PMDB-RJ), que mesmo afastado do cargo de deputado continua dando as cartas no jogo político. “A força dele vem da grana”, disse o deputado.

O deputado comentou ainda o episódio do dia 17 de abril, quando durante o processo de votação de admissibilidade do impeachment na Câmara ele cuspiu no deputado ultraconservador Jair Bolsonaro (PP-RJ). “Quando fui dar o meu voto, ele me xingou de ‘queima-rosca’, e não houve reação de quem estava lá. Aquele cuspe acabou redimindo o país, contra a mulher que estava sendo afastada”.

A ex-candidata à presidência pelo Psol Luciana Genro também participou do seminário, com considerações sobre a crise de representatividade política no país. “Defendo a bandeira de novas eleições desde o fim do ano passado para colocar nas mãos da população a soberania quanto aos rumos do país”, disse. Luciana também criticou a atuação do governo de Dilma Rousseff diante do processo de impeachment. “A resistência foi fraca e a estratégia do governo foi negociar com deputados em vez de buscar mobilizações. Por isso, Dilma na ONU não falou em golpe”, afirmou, lembrando o discurso da presidenta em 22 de abril.

O seminário também teve participações de estudantes da USP e da Marcha Mundial das Mulheres. Gabriela Perini, estudante da filosofia, criticou o isolamento do movimento estudantil dentro da USP, “uma galera descoladíssima da realidade”. Representante da comunidade LGBT entre estudantes, Gabriela também criticou o que chamou de massacre dos black blocs pelo movimento estudantil, e disse que o governo de Dilma não foi apoiado “porque ela estaria fazendo o jogo da direita, na perspectiva ‘fantasmagórica revolucionária’ da atuação de esquerda dos estudantes”. “A esquerda da USP não legitima o MST (Movimento dos Trabalhadores Sem Terra), que é colocado do lado do inimigo”, disse Gabriela ao criticar o movimento estudantil.

Maria Julia Montero, da Marcha Mundial das Mulheres, fez uma análise de três instâncias que dominam a cultura em que vivemos e que são empecilhos aos avanços: o capitalismo, o patriarcalismo e o racismo. Ela disse também que o governo de coalizão, como o que existe no país, “não nos serve mais”. Segundo Maria Julia, não é só no país que desponta a crise de representação, citando também os casos de Argentina, onde o governo neoliberal de Mauricio Macri venceu as eleições presidenciais, e Venezuela, em que a crise internacional e a queda do preço do petróleo estão sustentando a tentativa de derrubar o governo de Nicolás Maduro.

Auditório da USP recebe último dia de paineis e debates de seminário que pretende contribuir para agenda comum de lutas da esquerda do país. ARQUIVO PESSOAL / JEAN WYLLYS
Auditório da USP recebe último dia de paineis e debates de seminário que pretende contribuir para agenda comum de lutas da esquerda do país. ARQUIVO PESSOAL / JEAN WYLLYS

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