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23 de agosto de 2010
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09:00

Twitter vira campo de batalha

Por
Sul 21
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Candidatos usam ferramenta para atacar os adversários

Igor Natusch

Se o atual presidente dos Estados Unidos, Barack Obama, estabeleceu em sua campanha de 2008 um padrão de sucesso para a utilização da Internet como ferramenta política, a campanha eleitoral brasileira está dando a essas lições um viés bem mais agressivo. Multiplicam-se na rede farpas e acusações entre os candidatos, que encontram no Twitter um dos terrenos mais férteis para sua proliferação.

A hashtag (etiqueta que ajuda a ranquear os assuntos discutidos no Twitter) “Cala Boca Dilma” chegou a liderar a lista de tópicos mais populares em português no Twitter. No dia 12, por exemplo, estava em quinto lugar, acima até do nome do candidato José Serra, que estava na nona posição. A hashtag surgiu para criticar o desempenho de Dilma Rousseff (PT) em entrevista para o Jornal Nacional da Rede Globo. Aos defensores da candidatura petista, o sucesso da hashtag seria fruto de uma estratégia de campanha de José Serra (PSDB), envolvendo até o uso de um robô para reproduzir em série a etiqueta e falsear os resultados.

Os 140 caracteres usados em cada tuíte são suficientes para uma série de ataques aos adversários. Uma visita ao serviço revela a existência de uma grande quantidade de perfis dedicados a defender uma das candidaturas – ou, como é mais comum, para abrir fogo contra os demais. Dilma Rousseff, por exemplo, é “homenageada” com perfis que variam do ataque explícito como “dilmaterrorista” e “ForaDilma” a ironias tipo “DilmaHussein”. José Serra é alvo de ataques semelhantes em perfis como “serramente” e “SerraColirio”.

Além disso, o veículo serve para disseminar uma série de ironias contra os adversários. Na semana passada, o presidente nacional do PDT, José Eduardo Dutra, partiu para o deboche sobre os primeiros programas de José Serra na TV, que mostravam o tucano em uma festa numa favela cenográfica. “O programa do Serra foi gravado na favela da Portelinha. Mas ficou faltando aparecer o botafoguense Juvenal”, postou Dutra no microblog, comparando o programa à novela “Duas Caras”, da Rede Globo.

Índio parte para o ataque

O vice na chapa de José Serra, Índio da Costa (DEM), atua de forma a oficializar esse caráter de guerra virtual. Sua página no Twitter tem mais de 120 mil seguidores, e nela constam várias postagens de caráter acusatório contra Dilma Rousseff, Lula e o PT de modo geral, inclusive com links redirecionando para artigos associando o partido às Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (FARC). O assunto rendeu grande polêmica no começo da campanha eleitoral.

“Em um primeiro momento, alguns julgaram que a postura dele fosse fruto de inabilidade com as ferramentas digitais”, explica Alex Primo, pesquisador de cibercultura e professor da UFRGS, que nunca acreditou nessa explicação. “Me parece muito mais parte de uma estratégia. Como ataques mais diretos não ficariam bem na boca do Serra, a solução foi delegar essa tarefa para o Índio, que inclusive é mais jovem e tem uma imagem que encaixa melhor com essa proposta”.

Rafael Madeira, cientista político e professor da PUCRS, concorda com essa análise e vai além. “É uma divisão de trabalho. Serra não podia assumir publicamente essa postura camicase, então acaba passando essa tarefa para seu vice. Atacar Lula seria arriscado para Serra, devido aos altos índices de popularidade do presidente”.

Para o cientista político da PUCRS, José Serra tenta de todas as maneiras reverter uma situação desfavorável. “Em termos maquiavélicos, podemos dizer que o Serra é maltratado pela Fortuna. Quando era candidato de situação, encarou os baixos índices de popularidade do governo FHC; quando é o nome forte da oposição, precisa enfrentar a candidata do governo Lula, um dos mais populares da nossa história”. Essa situação motivaria boa parte das ações do candidato na Internet.

Semelhanças e diferenças

Para Alex Primo, as diferenças entre os candidatos no uso do Twitter são bastante perceptíveis. “Dilma (Rousseff) é a mais bem assessorada, mesmo porque a experiência do Marcelo Branco ajuda muito”, diz Alex, lembrando a vivência do assessor de mídias eletrônicas de Dilma  em iniciativas como a Campus Party, maior evento de inovação tecnológica do mundo. O caráter mais formal das postagens do perfil “dilmabr” reforça a ideia de organização, ainda que não se diferencie muito de outras ferramentas mais convencionais de divulgação. A candidata Marina Silva (PV) também adotaria postura semelhante, apostando no uso das hashtags para ampliar o número de seguidores de seu perfil “silva_marina”.

José Serra, por sua vez, se destacaria por fazer um uso da ferramenta bem mais próximo da realidade dos usuários em geral. “O Twitter do Serra é muito mais pessoal, dá para ver pelas postagens que muitas vezes é ele mesmo quem escreve lá”, afirma Alex. “Ele comenta sobre filmes que assistiu, dialoga com os seguidores, responde perguntas… É um uso bem mais próximo do adotado pelo usuário comum, pelo jovem que está no Twitter para manter contato com os amigos”.

Embora ganhe pontos nesse sentido, o modelo Serra de utilização do microblog apresenta algumas desvantagens. “Até pela agenda cheia, Serra entra no Twitter em horários ruins, muito tarde da noite, quando menos seguidores estão online”, diz Alex.
“Talvez essa iniciativa do Serra tenha a ver com o caráter centralizador geralmente atribuído a ele”, acrescenta Rafael Madeira. “Em princípio, não haveria problema em delegar essa tarefa para assessores, ao menos nos horários onde ele não pudesse estar presente. O Twitter é muito rápido, adotando um modelo mais centralizado o risco de perder o feedback dos seguidores acaba aumentando bastante”.

Mais seguidores, menos intenções de voto

Serra é o candidato com maior número de seguidores no Twitter. Às 18h de sexta-feira (20), 374.525 usuários seguiam o perfil oficial “joseserra_”, contra 177.932  de Dilma Rousseff e 158.064  de Marina Silva. Um número que contrasta com as últimas pesquisas dos institutos Ibope e Vox Populi, que colocam Dilma Rousseff com maior intenções de voto e crescimento constante à frente de Serra.

Isso demonstra que a realidade da Internet nem sempre espelha a dinâmica complexa de uma campanha eleitoral, como aponta Alex Primo. “Precisamos entender que o Twitter e as tecnologias de informação não ganham sozinhas eleição nenhuma. É um ambiente mais restrito, com um público que ainda reflete, especialmente aqui no Brasil, apenas uma parcela do conjunto da sociedade”.


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