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10 de agosto de 2010
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09:00

Beto Grill

Por
Sul 21
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“Aprendemos com os equívocos do passado”

Lorena Paim

Candidato a vice-governador na chapa encabeçada por Tarso Genro, Beto Grill tem experiência tanto no Executivo quanto no Legislativo: foi prefeito de Cristal e de São Lourenço do Sul, municípios da Zona Sul do Estado, além de ter ocupado uma cadeira na Assembléia Legislativa, pelo PSB. Seu partido desistiu de lançar candidatura própria a governador, em 2010, para compor a Unidade Popular pelo Rio Grande ( PT, PR, PCdoB e PSB).

Sul 21 – Como foi sua trajetória política, do início no PDT até o PSB?

Beto Grill – Minha trajetória política começou a se intensificar no início da minha atividade profissional. Formado e especializado em traumatologia e ortopedia e em medicina do trabalho, fui desenvolver minhas atividades em São Lourenço do Sul. Embora já tivesse militância prévia no MDB, no tempo da exceção, nunca tinha atuado numa linha de frente. Como médico, no dia a dia comecei a me defrontar com as questões sociais, as carências da comunidade dos excluídos (naquela ocasião com mais dificuldades, pois não se tinha o SUS). Eu me senti na obrigação de fazer alguma coisa a mais do que tentar curar as pessoas. Escolhi ingressar no PDT, muito levado pelas ideias do Brizola, que considero um líder ímpar na história política brasileira. Assumi a presidência do partido e começamos a trabalhar em São Lourenço uma candidatura para prefeito. Concorri em 88, em 89 participei ativamente da campanha do Brizola para presidente da República em primeiro turno e do Lula em segundo. Em 90, fruto desse trabalho regional que fiz levando a candidatura do Brizola a toda a Região Sul, concorri a deputado estadual e me elegi. Em 92, concorri a prefeito de São Lourenço, me elegi e suspendi o meu mandato de deputado. Até 96 administrei o município. No fim de 98, entendi que meu processo dentro do PDT começava a se esgotar, não encontrava as condições que eu considerava adequadas e resolvi me afastar um pouco da vida político- partidária e saí do partido. Um ano depois, o pessoal de Cristal – município que se emancipou parte de São Lourenço, parte de Camaquã e parte de Canguçu -, onde eu vivia, me procurou e me convidou para concorrer a prefeito. Uma grande frente de partidos se formou Acabei me elegendo em 2000 e me reelegendo em 2004. Cumpri o mandato por cinco anos e três meses, já pelo PSB, um partido que atendia mais as minhas ansiedades pessoais e era um espaço adequado para fazer política mais à esquerda, mais comprometido com as questões sociais. Tenho uma alegria muito grande de ter feito esta escolha, por ser um espaço democrático com a priorização pelo social. Renunciei a este mandato (prefeitura de Cristal) para concorrer a governador do Estado em 2006, pelo PSB. Cumpri um papel partidário. Depois passei um período na Assembleia Legislativa como coordenador da bancada do PSB. Após, por opção pessoal, retornei a Camaquã, onde resido, trabalhando como médico nessa cidade e em São Lourenço.

Que experiências o senhor traz por ter sido prefeito e deputado?

Beto Grill – Tenho reforçado a harmonia que se formou, agora, com essa aliança. Com a construção de uma unidade formada pelo PT, PSB, PCdoB e PR e com a minha indicação a vice, se formou uma composição que tem uma experiência acumulada e que pode, realmente, trazer um avanço para a administração pública do RS. Eu e o Tarso temos experiência de mais de 15 anos de prefeito. Eu, num município pequeno, Cristal (7 mil habitantes),  num de porte médio (São Lourenço, mais de 40 mil habitantes) e Tarso numa metrópole, Porto Alegre. Conseguimos ter essa experiência da política nos seus efeitos diretamente sobre as pessoas. Conseguimos entender como grandes iniciativas surtem efeitos no dia a dia das pessoas. E, por outro lado, a experiência de Tarso, ex-ministro por sete anos, fez com que ele agregasse sua formação acadêmica a um convívio com organismos nacionais e internacionais. Tenho defendido que o Rio Grande,  há muito tempo, carece de um grande líder, de um estadista, de um político que possa representar nossos interesses em qualquer fórum nacional e internacional. Isso agora é indispensável, porque o Brasil está num momento excelente. O mundo se recupera de uma crise. Vários mercados emergentes estão dialogando, fazendo comércio com o Brasil. E nós precisamos de um político que tenha esta visão da micro e da macro política, que é o caso de Tarso Genro – sete anos e três ministérios deram-lhe condições de conhecer os caminhos, as pessoas, mostrar ao Brasil e ao mundo nossas potencialidades. Por isso, entendo que essa aliança mostra que os partidos de esquerda estão abertos ao diálogo, querem ampliar sua base partidária e tem condição de bem representar o Estado para que possa ter esta interlocução com o Brasil e o mundo.

Até o término do prazo legal, o PSB considerou colocar a candidatura de Beto Albuquerque a governador. Mas acabou optando pela coligação, indicando o vice. Foi traumática esta escolha?

Beto Grill – Pelo contrário. Evidente que um partido como o PSB tem toda a legitimidade para buscar seu protagonismo, para desenvolver o seu projeto. Nós percorremos o Estado, capitaneados pela nossa liderança maior, Beto Albuquerque, buscando as condições políticas necessárias para apresentar um projeto próprio de candidatura a governador. Avançamos muito, construímos um patrimônio eleitoral que em todas as pesquisas giraram em torno de 7% a 10%, se o partido tivesse candidato próprio. Como não conseguimos as condições políticas adequadas, uma base de outros partidos que pudessem nos dar um tempo de TV adequado, capilaridade por todos os municípios, enfim as condições de mostrar  nosso projeto e ter chances reais de vitória, fizemos uma escolha natural de nos unirmos aos partidos do campo que pensam como nós. Temos métodos diferentes, mas princípios ideológicos semelhantes ao PT. Então, esta aliança com outros partidos veio no momento adequado, numa situação completamente diferente, em que estamos sentando à mesa em igualdade de condições. Não existe mais um partido hegemônico que possa, de repente, ser o dono da verdade, ser superior aos outros. Existem partidos que sentaram à mesa, que construíram uma aliança de igual para igual, onde todos podem contribuir. E nós vamos, com isso, trabalhar para ganhar essa eleição. Vamos juntos governar o estado do Rio Grande do Sul.

O que permitiu que a Frente Popular de esquerda se refizesse, agora rebatizada?

Beto Grill – Não tenho dúvida de que isso é uma evolução natural do processo. Nós amadurecemos – digo nós, as esquerdas, fundamentalmente os três partidos – PT, PCdoB e PSB. Nós aprendemos com os equívocos do passado, quando tivemos uma certa dificuldade de relacionamento, com cada um querendo que sua verdade fosse absoluta. Hoje existe uma evolução natural para a abertura do diálogo, para a concertação, para conviver com o contraditório e para procurar o bom senso. Nós nos unimos no que pensamos semelhante. E, na esmagadora maioria das questões, nós pensamos de maneira igual. A então Frente Popular venceu a eleição e, depois que não conseguiu se manter, não houve sucesso, as esquerdas não vêm ganhando. Agora é um momento diferenciado, da necessidade de o Rio Grande fazer uma mudança, de ter um projeto que busque o desenvolvimento, a distribuição de renda, o aumento dos empregos, serviços mais adequados na área social. E por isso nos unimos e temos certeza que nos unimos no momento certo e em outro patamar, com a certeza de que vamos fazer um grande governo.

E por que não houve aliança antes? A posição do PT influiu?

Beto Grill – Não necessariamente. O PSB tentou seu protagonismo e, em 2002, concorreu com Caleb de Oliveira. Em 2006, entendemos manter a mesma trajetória e meu nome foi escolhido. Neste momento, examinando a conjuntura, e vendo que nossa candidatura avançou bastante, mas sem a base de sustentação, optamos por reeditar a aliança em outros termos para realmente ganhar as eleições, porque o Rio Grande não pode continuar com este modelo.

Como é ser um político representante da região Centro-Sul do estado?

Beto Grill – O PT já vinha num processo anterior das caravanas, de construir um plano de governo, ouvir as pessoas. Tarso percorreu o Estado, colheu uma série de informações e, a partir daí, foi feito o primeiro pré-projeto. Nós trouxemos nossas contribuições para este programa preestabelecido sobre vários temas: agricultura familiar, cooperativismo, a questão do trânsito, que é forte tanto na Assembleia quanto no Congresso, a criança e o adolescente, a questão das energias alternativas… Do ponto de vista estratégico, a minha candidatura significa que eu sou o fiador de que o processo de desenvolvimento do Rio Grande se dará de maneira equilibrada, harmônica. É indispensável ter um olhar diferenciado para cada região do Estado. Não podemos tratar realidades diferentes de maneira igual. Há necessidade de termos uma atenção diferenciada para a Metade Sul, para zonas também deprimidas economicamente em outras regiões. Existe um passivo histórico de falta de atenção de várias administrações com a Metade Sul, as regiões Noroeste, Campanha e Fronteira Oeste. E por isso, talvez, devesse ter uma compensação. Mas não dizemos isso. Queremos tratamento diferenciado também para as regiões mais desenvolvidas. Existem milhares de famílias da Região Sul trabalhando nas regiões de Porto Alegre e de Caxias do Sul e aqui disputando empregos com oriundos das famílias daqui. Na Região Sul, geralmente, as famílias investiram em ensino técnico e universidade para os filhos. Quando estão prontos para ingressar no mercado de trabalho, não tem emprego. Então, vêm para Porto Alegre, Caxias, Vale do Sinos. Eu nasci em Pelotas, estou morando e exercendo atividade na Região Sul, que tem um representante na majoritária, depois de 40 anos. Não tinha desde Edmar Fetter, que era de Pelotas e foi vice-governador.

O senhor já declarou: “não ocuparei espaço meramente figurativo”. Qual será o papel do vice?

Beto Grill – Precisamos ter bem claro as funções. O governador será Tarso Genro, a autoridade máxima no Estado do ponto de vista administrativo. E temos que respeitar essa condição. Vice tem papel institucional. Além de substituir o governador, deve ser o parceiro da administração. Nós vamos assumir uma responsabilidade com o povo gaúcho, que está depositando em nós a esperança de um tempo melhor. Em nenhuma hipótese, por nenhum motivo, as discordâncias que possam acontecer gerarão qualquer prejuízo ao Rio Grande do Sul. Não haverá nenhuma discórdia que leve a um impasse tal que o futuro governador Tarso Genro não possa viajar com tranquilidade para buscar os interesses do Estado fora daqui, por medo que o vice possa mudar algo em sua política. Nós seremos fiéis ao projeto que nos une. É a confiança que temos de que escolhemos o melhor candidato. Nosso relacionamento de companheiros políticos, que se cruzavam em diversas atividades, já é um relacionamento de amizade. Houve uma perfeita sintonia de pensamento. Tenho consciência de meu lugar. Estarei sempre pronto a colaborar com o governo e com nosso governador. Eu me permiti, no comício da Dilma e do Lula, fazer uma analogia e dizer que o governo Lula trouxe tantas lições sobre negociação, aproximação das pessoas que pensam diferente e aproximação na política externa. Deu uma contribuição sobre o comportamento de um vice-presidente da República. Vou me espelhar em José Alencar, que tem toda uma condição, um porte de vice, de parceiro que tem opinião e a expressa – algumas vezes divergiu do governo – , mas respeitosamente, do ponto de vista das ideias, inclusive ocupando o cargo de ministro da Defesa, um cargo de confiança absoluta do presidente. Então, pretendo ter minhas opiniões, expressá-las, mas reconhecendo para o que o povo do Rio Grande do Sul me escolheu.  Nunca vou trair a confiança desse povo.

O fato de só assumir no impedimento do governador não enfraquece a figura do vice?

Beto Grill – No nosso caso não vai existir isso. Tarso Genro já determinou que terei funções importantes, decisivas, dentro do governo, junto a ele, no Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social, um organismo que vai ser criado para ser fórum de discussão, da concertação de todos os assuntos que forem convergentes, para que possamos sentar com a sociedade organizada. E em tantas outras questões, como a do desenvolvimento regional, na área da saúde, e em todos os momentos em que o governo necessitar da minha colaboração. Eu não ficarei sentado, aguardando somente para substituí-lo, quando necessário. Estarei sempre disponível, com atitude, sem nunca deixar de reconhecer o meu papel, nem querer avançar o sinal, tentando mostrar serviço ou me apresentar como uma pessoa maior do que o cargo.

E a campanha, como está sendo feita?

Beto Grill – No primeiro momento, nos apresentamos mais frequentemente juntos, para fixar a imagem da aliança, desta unidade, para fixar a nossa relação pessoal, para trocar ideias e fazer uma análise do que assimilamos em cada encontro que vamos. Para fazer a sintonia fina. Aos poucos, atendemos compromissos diferentes, separados. Nas candidaturas a deputado, por exemplo. A demanda é muito grande. Estamos trabalhando como uma unidade.  Nos eventos mais importantes procuramos estar juntos.

Com a aliança, o PSB sai fortalecido?

Beto Grill – A toda ação corresponde uma reação. Na eleição certamente teremos ganhos políticos e tarefas importantes a cumprir, compromissos assumidos que vamos ter que honrar. Nós procuramos manter essa união, por exemplo, coligados com o PCdoB nas proporcionais para deputado. Que isso possa potencializar nossas candidaturas, que possamos fazer mais cadeiras na soma do que faríamos separados, pois temos bons candidatos, puxadores de voto. A gente prioriza a majoritária, tanto para governador quanto senador. É importante frisar: para senador temos dois votos. Na nossa coligação não existe primeiro e segundo voto. Quem vota no Paim vota na Abgail.

Pessoalmente, o que a sua candidatura significa?

Beto Grill – Estou orgulhoso de ter sido escolhido pelo partido para duas tarefas importantes. Como candidato a governador nós tínhamos consciência de que era uma candidatura de construção, procuramos deixar claro nossas ideias. Foi um aprendizado. Agora, sob outro patamar, temos a real possibilidade da eleição. Isso encerra um compromisso com a campanha em si e com as consequências, ou seja, a eleição. Uma vez eleitos, teremos uma série de compromissos. Faço uma reflexão muito séria, me sinto completamente apto, mas tenho consciência da grandiosidade desta tarefa. Por isso, procuro dia a dia me qualificar, aprender, conversar com as pessoas, ler.

O senhor conhece o Palacinho, residência do vice-governador?

Beto Grill – Conheço externamente. Não é o espaço físico que vai interferir no relacionamento do governador com o vice. Precisamos ter proximidade de projetos. Se for no mesmo ou em prédios diferentes, isto não é importante, ainda mais com a internet disponível atualmente.


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