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16 de julho de 2010
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09:00

Sem controle

Por
Sul 21
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Partidos buscam unidade. Apenas duas propostas são sólidas.

Rachel Duarte e Felipe Prestes

Os partidos políticos regionais foram legalmente extintos no Brasil em 1945. Mas, a julgar pelas disparidades atuais entre seus interesses nacionais e estaduais, o país ainda não conseguiu ter agremiações políticas com um pensamento nacional. As características regionais ainda são muito fortes.

Na última quarta-feira (14/7), o PP nacional anunciou apoio informal à candidatura de Dilma Rousseff. Isso porque os diretórios estaduais em 20 estados são favoráveis à aliança. Sete são contrários. Outros partidos, como PMDB, PTB e PDT, também têm apresentado discordâncias entre os diretórios nacionais e estaduais.

Nos cinco estados brasileiros com maior número de eleitores essas divergências são flagrantes. Em São Paulo, mesmo com o paulista Michel Temer (PMDB) sendo candidato a vice-presidente na chapa de Dilma Rousseff (PT), os peemedebistas apoiam a candidatura de Geraldo Alckmin, do PSDB.

No outro lado da ponte aérea, o candidato ao governo do Rio de Janeiro Fernando Gabeira, do PV, é apoiado pelo DEM, PPS e PSDB, partidos que compõe a coligação nacional de José Serra, rival de Marina Silva no pleito nacional. Assim, Gabeira tem frequentado eventos de apoio tanto a Serra quanto a Marina, sem pestanejar.

Em Minas Gerais, houve indisposição do diretório estadual do PT em aceitar e apoiar a candidatura de Hélio Costa (PMDB) ao governo do estado, o que acabou se concretizando – caso semelhante ocorreu no Maranhão, onde o diretório nacional obrigou os petistas a apoiarem Roseana Sarney (PMDB). Na Bahia, Jacques Wagner (PT) e Geddel Vieira Lima (PMDB) disputam o governo, mesmo sendo ambos aliados de Dilma Rousseff. Ex-ministro da Integração Nacional durante o Governo Lula, Geddel agora é apoiado por PTB e PPS, coligados com Serra em nível nacional.

No Rio Grande do Sul, há uma neutralidade na coligação PDT-PMDB, de José Fogaça (PMDB). Apesar do enquadramento dos diretórios nacionais, não há posição oficial das legendas em favor da petista no RS. A “imparcialidade” provocou algumas dissidências no PDT e o mal-estar dentro do PMDB, que resiste em apoiar a candidata Dilma.

Segundo o presidente estadual do PDT, Romildo Bolzan, não há contradição entre a decisão nacional e a orientação estadual da sigla. “Nós apoiamos o candidato José Fogaça, que é do PMDB – o mesmo partido do vice da chapa da Dilma, o Michel Temer”, explicou. Ele afirmou que não há conflitos entre os trabalhistas e a dissidência é baixa, além de publicamente representar uma postura vergonhosa para os próprios dissidentes.

Bolzan explicou que a neutralidade do candidato da coligação PDT-PMDB, José Fogaça (PMDB), é estratégica e mudará no momento certo. “Temos divergências locais que afastam integrantes do PMDB dos do PT. Portanto, quando for a hora certa a tendência é seguirmos a orientação nacional das legendas: o apoio à candidatura de Dilma”, informou.

O deputado federal Eliseu Padilha, secretário-geral do PMDB no RS, explicou que o diretório estadual do partido sempre foi contra o governo de coalizão com o PT em nível nacional. “Nunca indicamos ninguém a cargos no governo federal. Antes das eleições, defendemos a ideia da candidatura própria. De nossa parte, não há incoerência”, afirmou.

O PT, estreitamente ligado ao PMDB no governo federal e ao mesmo tempo rival político no RS, é defendido por seu presidente estadual Raul Pont. “Nosso partido tem uma unidade. Não coligamos com DEM, PPS e PSDB, partidos que sustentam a candidatura Serra. O PMDB está em crise. Hoje é uma federação de interesses regionais, e aqui no RS está cada vez mais à direita”.

Pont contou que, antes de iniciar a campanha, procurou o presidente estadual do PMDB Pedro Simon para alinhavar ao menos o apoio a Dilma no Estado. “Eu fui procurá-lo, ele disse que não havia unidade dentro do partido e que adotariam a neutralidade”. O deputado estadual também revelou sua contrariedade quanto à decisão do diretório nacional petista de impor o apoio a Roseana Sarney no Maranhão. “Foi uma subordinação à lógica eleitoral. Achei um equívoco. Votei contra no diretório nacional, mas perdemos”.

Unidade difícil

Para cientista política, Maria Isabel Noll, o enquadramento dos estados diante das coligações não é garantia de unidade e a determinação não muda a realidade dos partidos nas diferentes regiões do país. Ela acredita que essa “imposição” fragiliza as candidaturas, pois elas têm de atender às especificidades locais.

“Isso é uma necessidade de garantia sobre o resultado das urnas de forma antecipada que os partidos buscam. Porém, na prática, é muito difícil o controle. Porque a campanha nos níveis locais é feita nas negociações entre deputados, prefeituras e no corpo a corpo. Então é muito difícil seguir a determinação nacional do partido”, explica.

Na época da Ditadura Militar, o controle do sistema partidário era maior e havia determinação da Justiça Eleitoral para a unidade das legendas. A professora explica que essa era a forma de conter as dissidências e que, hoje, os partidos estão buscando a sua afirmação. Ela avalia o momento atual dos partidos como “centralismo democrático”, em que o interesse da maioria das lideranças partidárias  nacionais se torna a regra para todos os diretórios.

O deputado estadual Raul Pont também cita a afirmação do sistema partidário atual como causa para as disparidades regionais. “Nossa história de pluralidade partidária é muito curta. Os partidos no Brasil ainda estão sendo filtrados. Temos alguns que tem ideologias, como PSDB, DEM e, cada vez mais o PPS, à direita; PT, PC do B, entre outros, à esquerda”.

O cientista político Tarson Núñez concorda com Pont. “Com o exercício da democracia vai havendo uma consolidação partidária. Em nível nacional, já há dois projetos claros e divergentes, capitaneados por PT e PSDB. Partidos com ideologias enfraquecidas tendem a ir se reduzindo”, opinou.

O deputado federal Eliseu Padilha, por sua vez, acredita que a ideologia dos partidos se diluiu após a queda do muro de Berlim, tendo início a hegemonia do que chamou de “capitalismo ortodoxo”. “O mercado ganhou muita força. Hoje, partidos de esquerda muitas vezes agem como os de direita e vice-versa. Se não tem ideologia dentro dos partidos como vai haver unidade nacional?”

A solução para essa “geleia geral” não passa, segundo Padilha por mudanças na legislação. “Não há lei que mude as divergências dentro dos partidos. As agremiações precisam se redefinir ideologicamente, se reposicionar”. Para tanto, o deputado citou como exemplo cursos ministrados para os quadros partidários.

Tanto Raul Pont quanto Tarson Núñez acreditam que uma reforma política pode ser parte da solução para uma maior unidade ideológica dos partidos. Ambos citaram o voto em lista como uma medida que pode fazer com que eleitores e políticos pensem a política de forma menos pessoal e mais partidária.

“Hoje, os eleitores em geral votam nas pessoas, não em ideias. Pensando em se eleger, os políticos também não apresentam uma ideologia, mas apenas o que diz o senso comum nas pesquisas”, explicou Núñez.

Para Maria Isabel Noll, os candidatos a cargos do Legislativo sentem mais liberdade para buscar um voto centrado na pessoa. “A lógica é perversa, a exigência do partido na majoritária, acaba gerando uma sensação de liberdade para os candidatos da proporcional. Eles ficam à vontade para fazer o seu jogo, apostando mais no seu capital e isso influencia a preferência dos eleitores em votar no candidato e não na legenda”, afirmou a cientista.


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