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30 de julho de 2010
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09:00

Clima de despedida

Por
Sul 21
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Lula não fala sobre o futuro, mas amigos preveem até sua volta à presidência

Núbia Silveira e Rachel Duarte

Daqui a 152 dias, Luiz Inácio Lula da Silva se tornará o quinto ex-presidente vivo do Brasil. O que ele fará depois de passar a faixa verde-amarela para seu sucessor? Será embaixador como foi Itamar Franco? Voltará para o Congresso como José Sarney e Fernando Collor de Mello? Ou se tornará um palestrante nacional e internacional, a exemplo de seu antecessor e adversário político Fernando Henrique Cardoso? As apostas são muitas, já que o presidente não fala abertamente sobre o que fará como ex, a partir de 1º de janeiro de 2011. Nesta quinta-feira (29), em Porto Alegre , voltou a fugir de uma resposta direta, na entrevista coletiva, concedida no Beira-Rio.

Com uma postura autoafirmativa e muita disposição, Lula usou um tom de despedida em seus discursos. “O final do mandato está chegando e já não posso mais falar em futuro. Estou na fase de prestar contas. Tenho menos tempo do que já tive. O que já fiz, fiz. O que não fiz, não fiz. Ficará para outros fazerem. Quem sabe mais e melhor”, disse Lula.

Ele avaliou seus dois mandatos no comando do país e a política nacional antes e depois do seu governo.  “Política é a arte do óbvio”, afirmou. Como explicação do que seria o “óbvio” na política, citou ações essenciais como a construção de estradas e de escolas e a geração de emprego. “Não tem nada mais fácil do que fazer o óbvio. Fazer aquilo que tem que ser feito, aquilo que o povo precisa, sem inventar”, salientou.

Para afirmar que seu governo teve compromisso e foi o que mais investiu nos últimos 25 anos, Lula provocou a imprensa e os adversários. “Nos anos 80 e 90, não tínhamos  nenhuma capacidade de investimento neste país. A ponto de você pegar cidades extraordinárias e de potencial político exuberante e não ter um metro de tratamento de esgoto. A imprensa que tanto gosta de mim ou os nossos adversários poderiam me ajudar a fazer uma pesquisa desde o governo Figueiredo. Teve Figueiredo, teve Sarney, teve Collor, teve Itamar e teve o Fernando Henrique Cardoso. Estudem se todos eles juntos trouxeram a quantidade de dinheiro para o Orçamento geral da União ou a quantidade de financiamentos que, em oito anos, nós trouxemos para o estado do Rio Grande do Sul”, desafiou.

Sem aposentadoria

Amigos íntimos do presidente, o ex-governador petista Olívio Dutra e o senador Paulo Paim (PT) têm certeza de uma coisa: Lula não se aposentará quando deixar de ser presidente. “Somos comprometidos com as lutas sociais. Lula vai estar sempre na luta social e comunitária”, afirma Olívio por telefone, enquanto percorre o interior do Rio Grande do Sul, antes de chegar a Porto Alegre para receber o amigo. “Não sei dizer com convicção o que ele pretende fazer. Pode voltar daqui a quatro anos. Ele ainda é jovem. Isso é algo concreto, real”, arrisca Paim. “Acho que se for necessário, ele volta. Se for necessário por um motivo ou outro. Não se sabe se a Dilma (Rousseff, candidata do PT à presidência) – temos certeza de que ela vai ganhar a eleição – será candidata à reeleição ou não”, afirma o senador, lembrando o caso de Nelson Mandela, na África do Sul, que não quis disputar um segundo mandato.

Na passagem por Porto Alegre, a única coisa que o presidente confirmou é que sua aposentadoria incluirá uma luta incansável pela reforma política brasileira. “Quando deixar de ser presidente, vou insistir como um leão para que o meu partido, junto com outros partidos, faça a reforma politica”, comprometeu-se.

Também amigo de Lula, desde o tempo em que os dois estavam no Congresso, o ex-governador Germano Rigotto acredita que ele vai seguir “viajando, produzindo, passando para o Brasil e o mundo a sua experiência de oito anos como presidente”. Olívio e Paim ressaltam que o presidente é uma liderança internacional, que sempre se preocupou com a América Latina e a África. Olívio acredita que ele será chamado a contribuir com alguma das estruturas supranacionais, como Banco Mundial, FMI, OMC e ONU, que atualmente – destaca o ex-governador – são presididas por pessoas “que não tiveram voto, que decidem o destino do mundo sem ter tido experiência com solução de problemas nacionais”.

“O Lula tem hoje uma simbologia tão forte como a do Mandela, principalmente no continente americano e nos países da África”, diz Paim. “Ele deverá cumprir o papel de estadista, ajudando a mediar conflitos, buscando saídas (para crises), colaborando com políticas de combate à fome”. O senador conclui com um “imagino”. E Olívio faz questão de deixar claro: “Lula nunca disse que quer estar aqui ou ali”.

Para a repórter Dorrit Harazim, da revista Piauí, Gilberto Carvalho, outro amigo do presidente, disse que Lula se nega a falar sobre a sua futura condição de ex. Nem sequer se dispõe a pensar no destino que dará aos presentes recebidos nestes oito anos no Palácio do Planalto. Lula, revelou o chefe do gabinete pessoal do presidente, se colocou uma data para decidir o que fazer: a segunda quinzena de dezembro.

Na avaliação do presidente, seu governo terminará deixando  o legado de “uma gestão ousada que enfrentou a lógica do empobrecimento, superou a resistência de parte do legislativo e acreditou no potencial do funcionalismo público”. “Esse país aprendeu a crescer, recuperou a autoestima. Eu acho que o Brasil vive um momento de ouro. O Brasil não pode jogar fora o que vocês ajudaram a construir. E não foi pouca coisa”, ressaltou.

Ao final de seu discurso, em seu primeiro compromisso em Porto Alegre, na Usina do Gasômetro, Lula deixou claro que voltará ao Rio Grande do Sul, mas em campanha. “Tem gente querendo que eu não faça campanha, mas eu tenho que participar. Certamente até 3 de outubro eu volto neste Estado. Daí vou escolher quem será meu candidato ou minha candidata. Aí eu direi para vocês”, ironizou.


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