Últimas Notícias>Internacional
|
6 de agosto de 2015
|
14:01

Após ‘derrubar’ URSS, jihadistas querem acabar com imperialismo dos EUA, diz professor

Por
Sul 21
[email protected]
Após ‘derrubar’ URSS, jihadistas querem acabar com imperialismo dos EUA, diz professor
Após ‘derrubar’ URSS, jihadistas querem acabar com imperialismo dos EUA, diz professor
Grupo invadiu cidade e está em confronto com o exército | Foto: Reprodução
O alvo dos jihadista atual é os Estados Unidos | Foto: Reprodução

Vanessa Martina Silva
Do Opera Mundi

Enquanto o chamado islã político, nascido no início do século passado com a Irmandade Muçulmana, no Egito, buscava conquistar o Estado e participar da cena política, o jihadismo objetiva derrubar “o império” e tem como marco a invasão da antiga União Soviética no Afeganistão, em 1979. Após ter “derrubado” a potência socialista, o alvo dos jihadista agora é a capitalista, ou seja, os Estados Unidos, explica o professor da UFF (Universidade Federal Fluminense) Paulo Hilu.

A noção de que eles “derrubaram” a União Soviética se dá através de uma percepção bastante peculiar sobre o processo, explica Hilu. “Os Estados Unidos resolveram dar ‘um Vietnã’ para a União Soviética. O que era uma rebelião rural [no Afeganistão] e que a URSS esmagaria em poucos dias, passa a ter o apoio da CIA”.

Dessa forma, grupos treinados no exterior são enviados ao Afeganistão e conseguem vencer a guerra, que acaba em 1989. Pouco depois, a URSS se dissolve. Assim, os jihadistas consideram que “derrubaram” a primeira potência. Surge então, dentro desse grupo, a ideia de que existem dois inimigos: o Estado e o Império, mas somente “derrotando o império é que se conseguirá derrubar também o Estado e criar um Estado Islâmico”, detalha Hilu: “e assim nasce o jihadismo globalizado”.

Foto: Reprodução/Archive.org
“Al Qaeda criou o ‘atentado espetáculo’ que é a contraposição à ‘guerra videogame’ [promovida pelos Estados Unidos] onde você tem um pontinho verde, [supostamente] sem vítimas”, afirma Hilu | Foto: Reprodução/Archive.org
Territorialidade e espetáculo

Ao falar em terrorismo, que é a faceta mais conhecida do jihadismo, é preciso observar que a arena de atuação de grupos com esse tipo de perfil é a imprensa: “O combate também se dá na mídia”, observa Hilu. Segundo o professor, a “Al Qaeda criou o ‘atentado espetáculo’ que é a contraposição à ‘guerra videogame’ [promovida pelos Estados Unidos] onde você tem um pontinho verde, [supostamente] sem vítimas”.

Reiterando que não é possível confundir os jihadistas com os muçulmanos, Hilu observa que o chamado islã político tem um perfil diferente e, apesar do emprego de violência em diversos momentos, ele hoje aceita “participar do jogo, seja democracia, seja outro sistema”.

Exemplificando a observação, ele lembra que após a chamada Primavera Árabe no Oriente Médio, muitos partidos islâmicos (que querem adotar a chamada sharia, ou leis islâmicas, cuja base é o Corão) chegaram ao poder. Mas, diante da complexidade de demandas impostas por diferentes reivindicações tanto de outros grupos muçulmanos, como de outros atores sociais, eles seguem como participantes da vida política, mas não à frente dos governos.

A outra diferença entre os grupos é a questão da terroritoriedade. “O islã político se restringe a um Estado e mesmo quando apoiam a situação de outro país, como acontece com a questão palestina, esse apoio é meramente retórico”. Já o jihadismo transformou as guerras civis em jihads globalizadas. “Eles precisam de atores locais para seus atos, mas isso não tem nada a ver com o islã político”, avalia Hilu.

Em suma, Hilu aponta que “o terrorismo aparece menos pela radicalização islâmica e mais pelo jihadismo”. Com relação ao grupo de mais visibilidade atualmente, o EI (Estado Islâmico), o professor pontua que se trata de um caso particular.

O EI pretende criar um califado em territórios que hoje pertencem a Iraque e Síria, mas também realiza atentados em outros países. Assim, há “um misto de jihadismo com islã político. O grupo busca presença na mídia, realiza atos provocativos, comete atos espetaculares, mas é territorializado”, observa o professor.

Estado e terrorismo

Embora seja muito utilizado pela imprensa, o conceito de terrorismo é falho, aponta Reginaldo Nasser. Ele observa que a definição utilizada pela ONU e pelos Estados Unidos diz que “ato terrorista é o que atenta contra o Estado, mas isso exime o Estado de praticar terrorismo, quando, na história, quem mais praticou terrorismo foi o Estado, até porque ele tem mais capacidade para isso e tem legalidade para praticar violência”.

Outra ideia muito presente nos meios de comunicação é a de que o “ocidente está ameaçado” pelo terrorismo. Para isso, países gastam milhares de dólares para supostamente aumentar a segurança. Com base em suas pesquisas, Nasser pondera que “das 18 mil mortes provocadas pelo terrorismo em 2013, sete ocorreram na Europa e 85% no Oriente Médio e África, sobretudo em países islâmicos como Iraque, Síria, Afeganistão, Paquistão e Nigéria”. Ou seja, “as maiores vítimas do terrorismo são os muçulmanos”, observa o professor.

A ofensiva dos Estados Unidos, que gastaram US$ 3 trilhões para combater o terrorismo, após o atentado de 11 de setembro de 2001, além de não o combater, aumentou o número dessas ações: “no ano 2000, 3.800 pessoas foram mortas no mundo em ataques terroristas. O número saltou para 18 mil em 2013. Nos EUA, na década posterior ao 11 de setembro, morreram 50 pessoas nessas condições”, aponta Nasser.

A França, mesmo antes do ataque à revista Charlie Hebdo, era o país com mais leis de exceção para combater o terrorismo, observa. “Essa tem sido a tônica em todos os países do mundo com o argumento de combater o terrorismo. Mas nessas condições, ele aumenta”, ressalta Nasser.

Por fim, ele conclui que “a situação caminha cada vez mais para o confronto militar. Enquanto isso, 90% das vítimas são civis. Mortas seja pelos atos terroristas, seja pelo contraterrorismo, que é outra forma de ato terrorista”.


Leia também
Compartilhe:  
Assine o sul21
Democracia, diversidade e direitos: invista na produção de reportagens especiais, fotos, vídeos e podcast.
Assine agora