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17 de julho de 2019
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17:31

Captação de recursos privados não é algo que funciona do ‘dia para a noite’, alerta vice-reitor da Furg

Por
Luís Gomes
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Vice-reitor da Furg, Danilo Giroldo (em imagem de arquivo) faz uma avaliação inicial do Future-se. | Foto: Guilherme Santos/Sul21

Luís Eduardo Gomes

O Ministério da Educação apresentou na manhã desta quarta-feira (17) o programa Future-se, que busca atrair investimentos privados e diminuir o percentual de recursos públicos no financiamento de universidades e institutos federais. O anúncio foi precedido por uma apresentação aos reitores das instituições. No início da tarde, o Sul21 conversou brevemente com o vice-reitor da Universidade Federal de Rio Grande (FURG), Danilo Giroldo, que fez uma avaliação inicial do projeto ainda do aeroporto de Brasília.

Giroldo classificou a apresentação como um programa para “alavancagem” de recursos privados para as universidades. Apesar de dizer que ainda precisa se aprofundar sobre os detalhes do programa e entender melhor a operacionalização das propostas, destacou que há duas questões preocupantes. A primeira delas é que, num cenário em que vigora a Emenda Constitucional 95 (do teto de gastos), uma proposta de “alavancagem” para ampliar os recursos próprios das universidades deixa a ideia de que a falta de recursos seria coberta pela captação de recursos privados. Ele diz que não está claro na proposta se a manutenção do orçamento ficará condicionada à necessidade de captação de recursos privados.

De acordo com a apresentação conduzida pelo secretário de Educação Superior do MEC, Arnaldo Barbosa de Lima Júnior, as universidades poderão criar fundos patrimoniais para receber doações de empresas ou pessoas físicas para financiar pesquisas e investimentos; poderão vender o nome de prédios e campi para patrocinadores — aos moldes dos chamados ‘naming rights‘ de estádios de futebol –; fazer contratos de gestão compartilhada dos seus patrimônios e fazer parcerias, comodato ou cessão de prédios e lotes; e inscrever ações de cultura em editais da Lei Roaunet e outros instrumentos de fomento. Outro eixo do programa é atração de recursos para o financiamento e fomento de projetos e do empreendedorismo nas universidades. O secretário afirmou que, atualmente, as universidades federais e hospitais universitários geram cerca de R$ 1 bilhão por ano por meio de patentes e royalties e que a ideia é potencializar essa geração de recursos.

O vice-reitor da FURG diz que trabalha justamente com a captação de recursos há 11 anos, mas que não é uma atividade trivial que pode dar resultados “do dia para noite”. Ele diz ainda que todas as universidades hoje já têm parques tecnológicos e projetos de incubadoras. “Lembrando que a EC 95 prejudica o orçamento das universidades, porque limita o reajuste à inflação, só que, como a folha de ativos e inativos entra nessa conta e cresce mais do que o resto, prejudica o custeio das despesas discricionárias. Fica parecendo que essa alavancagem é para suprir esse déficit que cresce ano a ano. O problema é que, se não tiver essa capacidade, fica numa situação delicada”, afirma.

Outra preocupação que ele aponta é quanto ao papel das Organizações Sociais (OSs) no futuro das universidades. Na apresentação do Future-se, o secretário de Educação Superior do MEC, Arnaldo Barbosa de Lima Júnior, afirmou que o Future-se será operacionalizado por OSs. Giroldo aponta que o texto do projeto, disponível no site da consulta pública aberta pelo governo, destaca que essas entidades poderão atuar na execução de planos de ensino e na gestão dos recursos relativos a investimentos em empreendedorismo, pesquisa, desenvolvimento e inovação. “Parece uma afronta muito forte à autonomia universitária. Tem autores que falam que firmar parcerias com OSs pode ser um tipo de privatização das universidades”, diz. “Então, são duas grandes preocupações imediatas: a questão da operacionalização dos fundos, se os recursos vão ser realmente captados ou não, e depois que essas parcerias com OSs estão muito nebulosas. É preocupante, a sociedade tem que discutir se é isso que ela realmente quer”, complementa.

Ele ainda destaca que considera ser “muito ruim” que o governo esteja apresentando um programa novo para o ensino superior enquanto ainda não foi resolvida a questão do bloqueio das verbas de custeio das universidades federais. “As universidades ainda vivem uma situação calamitosa, com previsão de esgotamento dos recursos até setembro. Tem pingado a cada mês um recurso já insuficiente para pagar as contas do mês anterior. E é triste que nenhuma sinalização mínima tenha sido dada pelo MEC para o desbloqueio dos recursos. De certa, é um desrespeito com os reitores”, diz.

Giroldo afirma que a FURG deve realizar uma série de atividades nos próximos 30 dias, tempo que irá durar a consulta pública, para debater o tema.

O Future-se

O MEC quer criar um fundo de natureza privada, cujas cotas serão negociadas na Bolsa de Valores, para financiar as universidades e institutos federais. Esse fundo contará, inicialmente, com R$ 102,6 bilhões. A maior parte desses recursos, R$ 50 bilhões, virá do patrimônio da União. A intenção é que esse esses recursos financiem pesquisa, inovação, empreendedorismo e internacionalização das instituições de ensino.

O fundo é a principal estratégia do programa Future-se, apresentado hoje (17) pelo MEC. O fundo será composto ainda por R$ 33 bilhões de fundos constitucionais, por R$ 17,7 bilhões provenientes de recursos angariados com leis de incentivos fiscais e depósitos à vista, por R$ 1,2 bilhão de recursos da cultura e por R$ 700 milhões provenientes da utilização econômica do espaço público e fundos patrimoniais.

Os recursos serão voltados para a instalação de centros de pesquisa e inovação, bem como parques tecnológicos; assegurar ambiente de negócios; criação de startups, ou seja, de empresas com base tecnológica; aproximar as instituições das empresas; estimular intercâmbio de estudantes e professores, com foco na pesquisa aplicada; firmar parcerias com instituições privadas para promover publicações de periódicos fora do país; entre outras ações.

A intenção que essas ações gerem também recursos que serão remetidos ao fundo e também às instituições e aos próprios pesquisadores. A adesão das universidades e institutos será voluntária. O MEC não detalhou os critérios de distribuição de recursos entre as instituições.

*Com informações da Agência Brasil 


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