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3 de dezembro de 2018
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17:19

50 anos do AI-5: Intervenção artística relembra desaparecidos da ditadura militar

Por
Sul 21
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Performance “Onde? Ação nº 2” na Esquina Democrática do grupo Ói Nóis Aqui Traveiz. Foto: Joana Berwanger/Sul21

Giovana Fleck

Ana Rosa Kucinski Silva foi militante da Ação Libertadora Nacional (ALN). Em 1974, aos 32 anos, foi morta pela ditadura militar e seu corpo nunca foi encontrado. Kleber Lemos era militante do PCdoB. Com 30 anos, em 1972, foi morto e desaparecido durante a Guerrilha do Araguaia. Um ano depois, outro ataque ao movimento guerrilheiro também fez com que Dinaelza Soares Santana Coqueiro nunca mais fosse vista. Outros cerca de 50 combatentes que se estabeleceram na região amazônica são, até hoje, considerados desaparecidos políticos.

A Comissão Nacional da Verdade (CNV) reconheceu um total de 210 nomes de vítimas desaparecidas da ditadura. O documento enfatiza que as violações registradas e comprovadas pela CNV foram resultantes “de ação generalizada e sistemática do Estado brasileiro” e que a repressão ocorrida durante a ditadura foi usada como política de Estado “concebida e implementada a partir de decisões emanadas da Presidência da República e dos ministérios militares”.

A violência utilizada pelos militares caminha junto com a aprovação do Ato Institucional Número Cinco, em 13 de dezembro de 1968. O AI-5 resultou na perda de mandatos de parlamentares contrários aos militares; intervenções ordenadas pelo presidente nos municípios e estados; proibição de manifestações populares de caráter político; censura prévia para jornais, revistas, livros, peças de teatro e músicas; e a suspensão de quaisquer garantias constitucionais. Como consequência, foram institucionalizadas prisões arbitrárias, além da tortura, do assassinato e do desaparecimento de cadáveres.

Através da performance, o grupo procura se somar aos que exigem do Governo Federal continuidade nas investigações sobre o paradeiro das vítimas desaparecidas durante o regime militar. Foto: Joana Berwanger/Sul21

50 anos depois, o grupo teatral Ói Nóis Aqui Traveiz elaborou uma intervenção urbana para provocar reflexões sobre o momento mais duro da ditadura. Ao longo do mês de dezembro, o grupo realizará duas apresentações da performance “Onde? Ação nº 2”. A primeira ocorreu na segunda-feira (3), na Esquina Democrática. Através dela, o grupo procura se somar aos que exigem do Governo Federal continuidade nas investigações sobre o paradeiro das vítimas desaparecidas durante o regime militar. A última apresentação ocorrerá no mesmo local, dia 13 de dezembro, ao meio-dia.

Mariana Maciel é parte da tribo de atuadores do grupo. “Para nós, é fundamental apresentar essa intervenção na rua, que é um espaço de colisão. Estamos na rua para criar uma ruptura nesse espaço, especialmente nesse momento político.” Ao lado de Mariana, outros membros do grupo seguravam faixas com as frases: “Pelo direito à memória, à verdade, à justiça”, “Pela abertura irrestrita dos arquivos da ditadura” e “Punição para os responsáveis por torturas, mortes e desaparecimentos durante a ditadura militar”.

Cinco homens aparecem de terno segurando réplicas de fuzis. Entre eles, um sexto personagem arrasta um corpo coberto por tecidos com uma corda no pescoço. Eles fazem pausas entre a plateia que vai se formando em volta. O ator ao centro tira de dentro do paletó um isqueiro e um spray aerosol. Ao acendê-los, as chamas se aproximam do corpo e os homens de terno em volta erguem as armas para cima. Assim, atravessaram a Esquina Democrática.

“O que é isso?”, pergunta uma pedestre a uma das espectadoras. “É uma intervenção sobre a ditadura militar”, ela responde. As duas fazem uma pausa de alguns segundos. “Acredita que tem gente que quer que volte? Que se preparem para isso”, diz a espectadora, apontando para o corpo no chão.

Mulheres segurando cadeiras, representando familiares das vítimas, entram na cena. Foto: Joana Berwanger/Sul21

Os homens de terno são confrontados por novos personagens. Mulheres segurando cadeiras, representando familiares das vítimas, entram na cena. “É meu, é meu. Por favor que não seja meu”, cantam. Depois, os nomes dos desaparecidos são gritados por elas para a plateia. “Paulo de Castro, Celestina da Silva, Maria Lúcia Peti da Silva.” A encenação termina com papeis com os perfis das vítimas distribuídos entre os espectadores.

“Dezembro de 2018 também marca os 70 anos da Declaração Universal dos Direitos Humanos. Além disso, o Ói Nóis está celebrando 40 anos esse ano. O grupo nasce na rua. E nasce para dialogar com as pessoas. Praticamos o teatro popular para alcançar desde os grandes centros urbanos até as periferias. Acreditamos que essas datas servem para lembrar e marcar no consciente de quem está aqui, agora, o que aconteceu. As coisas têm tendência a se repetir se forem esquecidas”, afirma Mariana.

Confira mais fotos:

Foto: Joana Berwanger/Sul21
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Foto: Joana Berwanger/Sul21
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