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6 de setembro de 2018
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15:07

Trabalhadores protestam contra demissões no Mãe de Deus: ‘terceirização na Saúde mata’

Por
Luís Gomes
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Trabalhadores e SindiSaúde realizam ato contra a demissão de funcionários do Mãe de Deus | Foto: Joana Berwanger/Sul21

Luís Eduardo Gomes

Um grupo de trabalhadores e de representantes do SindiSaúde-RS (Sindicato dos Profissionais de Enfermagem, Técnicos, Duchistas, Massagistas e Empregados em Hospitais e Casas de Saúde do Estado do Rio Grande do Sul) realizou na manhã desta quinta-feira (6) um ato de protesto diante do Hospital Mãe de Deus, em Porto Alegre, contra as 326 demissões dos setores de nutrição e higienização da instituição, anunciadas na quarta-feira (5). Eles reclamam que a decisão, que configura uma demissão em massa, foi realizada sem a devida mediação pelo Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região (TRT-4) – o que eles cobram que ocorra agora – e que os serviços, que serão terceirizados, serão precarizados, colocando em risco a saúde de pacientes do hospital.

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“O nosso protesto aqui hoje é para sensibilizar principalmente o judiciário sobre as demissões em massa de trabalhadores da nutrição e da higienização, que para nós são atividades fundamentais em um hospital. Não se trata aqui de um shopping center, de uma metalúrgica ou um comércio, aqui tratam de vidas. Já tivemos o exemplo do Hospital Conceição, há pouco tempo, que terceirizou e voltou atrás porque aumentaram os níveis de infecção hospitalar, ocorreram inúmeros óbitos em razão disso. Então, a atividade hospitalar é diferente das demais”, diz Arlindo Ritter, presidente do SindiSaúde.

Ele ainda argumenta que a demissão em massa nos termos que ocorreu é inadmissível em uma instituição como o Mãe de Deus, pelo fato de ser um hospital filantrópico, que recebe benefícios fiscais do governo, especialmente por terem sido demitidos grávidas, funcionários pré-aposentados, retornando de acidentes de trabalho e integrantes da Comissão Interna de Prevenção de Acidentes (CIPA), que deveriam gozar de estabilidade.

Segundo a assessoria de imprensa do hospital, os serviços serão realizados pela Sodexo e pela Manserv. A instituição garante que as empresas contratadas teriam “expertise em auxiliar importantes instituições de saúde a oferecer a melhor experiência aos pacientes” e acrescenta que a adoção do novo modelo de gestão “tem por princípio a busca constante pela melhoria dos serviços prestados”. “A Associação Educadora São Carlos (AESC), mantenedora do Hospital Mãe de Deus, prevê a implantação de uma agenda estratégica e de fortalecimento da cultura institucional voltada à qualidade, segurança e eficiência no cuidado do paciente, reforçando seu compromisso com a saúde de forma integral”.

Manifestantes estenderam uma faixa sobre parte da Av. José de Alencar para denunciar as demissões e terceirização | Foto: Joana Berwanger/Sul21

Trabalhadoras demitidas

Janaína Santos da Silva, funcionário do setor da nutrição, conta que os boatos sobre a terceirização começaram a surgir há cerca de um mês. “O pessoal dos outros setores estava comentando que ia ser terceirizado, e a gente não sabia de nada”. Ela conta que, há cerca de três semanas, participou de uma reunião com a diretoria em que foi desmentida a informação de que já haveria assinado um contrato com uma empresa para a terceirização dos serviços. Janaína destaca, no entanto, que os boatos continuaram circulando e aumentando.

Na última terça-feira, os funcionários da nutrição do turno da manhã fizeram “um motim” para exigir uma reunião com a direção do hospital para cobrar esclarecimentos sobre a possibilidade de terceirização. “Nessa reunião, eles explicaram que realmente iriam fazer a terceirização e que nós tínhamos ainda esse mês de setembro para trabalhar no hospital”, diz.

Ângela Zani, que também trabalha no setor de nutrição, disse que, na terça pela manhã, a informação da direção ainda era de que não havia um contrato assinado para a terceirização. “Chegou às 20h, chamaram todo o pessoal para comparecer ao refeitório. Perguntaram se estava todo o pessoal dos turnos da tarde e da noite e informaram que a demissão ia acontecer naquele momento”, afirma. “Na quarta-feira pela manhã, o pessoal que não tinha sido demitido compareceu para trabalhar normalmente, mas nem sequer deixaram os funcionários entrar no hospital. Barraram todo mundo e continuaram fazendo as demissões”.

Eliane Weber trabalhava há três na governança do hospital, setor responsável pelos serviços de limpeza. Ela reconhece que sabia dos boatos sobre terceirização, mas que, quando questionava a chefia a respeito dessa possibilidade, recebia negativas como resposta. Na terça-feira, foi pega de surpresa quando foi informada por colegas da realização da reunião em que os funcionários foram informados de que as demissões ocorreriam. “Eu nem sabia da reunião”, diz.

De noite, foi informada pelo WhatsApp que não só ocorreriam demissões, como seriam imediatas e em massa. Foi demitida quando chegou para trabalhar na quarta pela manhã. Trabalhadores terceirizados já estavam assumindo os postos de trabalho e registrando o ponto. “É um desrespeito. A gente deu o sangue pela instituição até a última hora, até porque a gente nem sabia das demissões e que seria dessa forma. A ficha não caiu ainda. Sinceramente, eu estou muito triste, até pelos colegas. Tem meninas que dependem desse emprego para sustentar os filhos. Tem muita gente que sustenta os filhos sozinha”, diz. Eu saí daqui chorando, não por mim, mas pelo desrespeito com o qual a gente foi tratado aqui dentro. A instituição sempre pregou uma coisa e no final das contas a gente final que não era”.

Janaína também reclama do “descaso e da falta de respeito” com que os trabalhadores foram tratados. “Nós somos profissionais, estudamos para isso. Gastamos dinheiro com cursos para vir aqui e fazer um trabalho com pessoas que estão acamadas aqui dentro, que estão doentes precisando de cuidados especiais. Era o que a gente fazia aqui dentro”, diz. “Fora que fomos tratados que nem bicho pelos seguranças e pela tropa de choque na terça à noite. Tinha polícia e segurança proibindo todo mundo de voltar após a demissão para pegar as suas mochilas. Tiveram que alcançar para nós na catraca. Fomos tratados que nem bichos”, complementa Ângela.

Terceirização, saúde. Foto: Joana Berwanger/Sul21

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