Últimas Notícias > Geral > Areazero
|
8 de setembro de 2018
|
12:20

Refugiados ou imigrantes? Entenda diferenças entre venezuelanos e outros estrangeiros que chegam ao país

Por
Sul 21
[email protected]
Venezuelanos inicialmente foram alojados no abrigo Nova Canaã em Boa Vista, Roraima| Foto: Rafael Zart/MDS

Débora Fogliatto

O sul do Brasil tem recebido, há cerca de cinco anos, uma grande leva de imigrantes vindos principalmente do Haiti e de países africanos. Inicialmente, estes estrangeiros chegavam ao país solicitando refúgio, mesmo que não se enquadrassem, segundo as leis nacionais e internacionais, em tal condição. Já os venezuelanos que têm cruzado a fronteira nos últimos meses contam com esse status, o mesmo concedido aos sírios que fogem da guerra em seu país e aos palestinos que escapam do conflito étnico em sua terra natal. O que, então, garante essa classificação?

O refúgio tem diretrizes globais definidas e é regulado pela entidade internacional ACNUR – Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados. A instituição lançou uma campanha internacional pedindo ajuda para os venezuelanos, ressaltando que mais de 1,5 milhão de mulheres, homens e crianças vulneráveis foram obrigados a deixar suas casas. “A cada dia, milhares de pessoas são obrigadas a fugir da Venezuela em busca de assistência humanitária e proteção internacional. A situação instável, falta de alimentos e remédios, e a violência estão fazendo com que essas pessoas não tenham outra alternativa a não ser deixar tudo para trás”.

As pessoas que recebem o status de refugiadas garantem, a partir daí, uma série de direitos e não são como os migrantes que mudam de país apenas devido a situações econômicas. Segundo a ACNUR, os refugiados são pessoas que escaparam de conflitos armados ou perseguições. “Com frequência, sua situação é tão perigosa e intolerável que devem cruzar fronteiras internacionais para buscar segurança nos países mais próximos, e então se tornarem um ‘refugiado’ reconhecido internacionalmente, com o acesso à assistência dos Estados, do ACNUR e de outras organizações”, explica a organização. Para eles, seria muito perigoso voltar ao seu país de origem.

Já os migrantes, em geral, deslocam-se não por causa de uma ameaça direta de perseguição ou morte, mas principalmente para melhorar sua vida em busca de trabalho ou educação, por reunião familiar ou por outras razões. Diferentemente dos refugiados, eles podem voltar ao seu país quando quiserem.

Professora organiza aulas de português para haitianos em Porto Alegre | Foto: Joana Berwanger/Sul21

Os haitianos e senegaleses, mesmo que entrem no Brasil com pedido de refúgio — o que os garante poder permanecer no território nacional e trabalhar legalmente — não se classificam como tal segundo as leis internacionais. Os migrantes vindos do país caribenho, em geral, buscam escapar das condições precárias da nação, especialmente desde o terremoto que o atingiu em 2010. Eles escapam da pobreza e do desemprego.

Devido à alta demanda, o governo brasileiro criou, em 2012, um visto humanitário para contemplar a situação dos haitianos, que depois foi também aplicado a alguns migrantes africanos. Esse tipo de visto também está previsto na Nova Lei de Migração, que entrou em vigor ano passado. A legislação foi elaborada com a participação de diversos grupos preocupados com os direitos dos imigrantes e substituiu uma lei ultrapassada, dos anos 1980, que os tratava como uma ameaça à estabilidade nacional.

Mesmo com o visto humanitário, porém, os haitianos e africanos que chegam ao país encontram dificuldades diversas. Eles dependem de organizações da sociedade civil que os auxiliem, tais como o Centro ítalo Brasileiro de Assistência e Instrução as Migrações (CIBAI), em Porto Alegre, e o Centro de Atendimento ao Migrante (CAM), em Caxias do Sul, cidade que conta com um grande número de migrantes. Há ainda grupos que organizam aulas de português gratuitas para os estrangeiros, entre outros.

A coordenadora de Projeto da Associação Antônio Vieira (ASAV), conveniada da ACNUR que atua no Rio Grande do Sul, Karin Kaid Wapechowski, menciona que, mesmo que os dois grupos sejam vulneráveis, há diferenças entre as situações: “os haitianos são migrantes, mesmo sendo uma migração forçada eles não são enquadrados no critério da lei do refúgio, eles têm um visto especial. Venezuelanos podem ter o status de refugiados, são motivações diferentes”.

Venezuelanos viajam em aviões da Força Aérea Brasileira | Foto: Romério Cunha/Casa Civil

Karin explica que os venezuelanos são afetados pela situação política e econômica do país. “É uma questão generalizada, virou um cenário complexo, de grave violação de direitos humanos, falta de acesso a direitos básicos, água, luz, medicamentos. Há casos que ainda não estão documentados, mas são cerca de 55 mil pessoas que estão saindo do país como refugiadas”, afirma. A entidade está auxiliando os venezuelanos que chegaram na noite desta quarta-feira (5) à cidade de Esteio.

Devido ao status de refugiados, eles recebem auxílio do governo federal e da Organização das Nações Unidas (ONU), que é quem está fornecendo a verba para moradia nas cidades brasileiras para onde estão sendo levados, por exemplo. Em abril, em razão da crise humanitária provocada pela fuga de venezuelanos para o Brasil, a União Europeia (UE) decidiu doar 2,5 milhões de euros (R$ 10,6 milhões) para ajudar a relocar os refugiados em território brasileiro para cidades onde terão melhores condições de emprego e moradia.

Segundo dados da ACNUR, entre janeiro e setembro de 2017, cerca de 48.500 venezuelanos solicitaram refúgio no mundo. Até julho de 2017, estimava-se que havia cerca de 300.000 venezuelanos na Colômbia, 40.000 em Trinidade e Tobago, e 30.000 no Brasil em situações migratórias diversas ou em situação irregular.

Refugiados no Brasil

No ano passado, o Comitê Nacional para os Refugiados (CONARE) reconheceu 587 refugiados, em sua maioria vindos da Síria (310), República Democrática do Congo (106), Palestina (50) e Paquistão (24). O Brasil conta ainda com um número considerável de colombianos nos últimos dez anos. Mas qual é a situação desses países?

Síria: há oito anos, a Síria é destruída por uma guerra civil que já conta com cerca de 200 mil mortos, segundo o Observatório Sírio de Direitos Humanos. A ONU considera a situação dos sírios como a pior crise humanitária desde a Segunda Guerra Mundial. O número de refugiados oriundos do país já teria ultrapassado os 5 milhões.

República Democrática do Congo: Um dos países com situação mais frágil do mundo há décadas, a RDC sofre com operações militares constantes, instabilidade, insegurança, bandidagem e violência. Ataques contra a população civil e organizações de ajuda humanitária estão aumentando e esses grupos estão cada vez mais vulneráveis, segundo a organização Médicos Sem Fronteiras, que atua no país.

Palestina: Segundo a ONU, refugiados da Palestina são indivíduos que residiram na Palestina entre junho de 1946 e maio de 1948, que perderam suas casas e meios de subsistência em consequência do conflito árabe-israelense de 1948, e seus descendentes. Estima-se em 7,9 milhões o número de palestinos deslocados, sendo 7,25 milhões refugiados e os restantes deslocados internamente.

Paquistão: a situação do Paquistão é complexa devido a instabilidades no país e na nação vizinha, o Afeganistão, do qual muitos habitantes se refugiaram em solo paquistanês na última década. O país é alvo de ataques de grupos terroristas e sofre com violações de direitos humanos, sendo a nação que mais prende jornalistas.

Colômbia: Décadas de conflitos entre o governo e a guerrilha Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (FARC) forçaram milhares de colombianos a deixarem seu país. Dados da ACNUR dão conta de que a Colômbia é o segundo país no mundo com maior número de refugiados internos, cerca de 6 milhões.


Leia também
Compartilhe:  
Assine o sul21
Democracia, diversidade e direitos: invista na produção de reportagens especiais, fotos, vídeos e podcast.
Assine agora