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11 de agosto de 2018
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11:17

Entidades lançam dia 16 campanha em defesa da rotulagem frontal de advertência em alimentos

Por
Sul 21
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Entidades da área da saúde e Idec defendem modelo chileno de rotulagem frontal de alimentos. (Foto: Marco Weissheimer/Sul21)

Marco Weissheimer

A Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), o Hospital de Clínicas de Porto Alegre, o Conselho Regional de Medicina do RS (Cremers), o Conselho Regional de Nutricionistas, a Associação Gaúcha de Nutrição e outras entidades lançarão dia 16 de agosto uma campanha em defesa do modelo de rotulagem frontal de advertência em produtos alimentícios, que está em processo de debate na Agência Nacional de Vigilância Sanitária.

Em outubro, a Anvisa realizará uma consulta pública sobre o tema e as entidades querem mobilizar a sociedade em defesa do novo modelo de rotulagem que está sendo combatido pela indústria alimentícia. O ato de lançamento da campanha contará também com a presença de representantes do Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec), e de escolas públicas como o Colégio Estadual Júlio de Castilhos e o Colégio de Aplicação da UFRGS.

O aumento da obesidade, do sobrepeso e dos casos de doenças degenerativas vem despertando crescente interesse da população pela qualidade dos alimentos ingeridos no dia-a-dia. O debate sobre a rotulagem está diretamente ligado à essa questão. Em 2014, a Anvisa iniciou um processo de debates para a revisão das normas de rotulagem nutricional no Brasil. Pesquisadores, representantes da sociedade civil e da indústria do setor foram convidados a participar desse processo para debater os problemas da rotulagem atual e possíveis soluções.

No encerramento desta etapa, em 2016, a Anvisa convidou os participantes a enviarem propostas de novas normas para a rotulagem. O Idec e pesquisadores da Universidade Federal do Paraná (UFPR) apresentaram uma proposta baseada na experiência do Chile, que é um modelo de rotulagem de advertência na parte frontal da embalagem sobre a presença de quantidades em excesso de alguns nutrientes associados a doenças crônicas.

O Brasil possui hoje duas normas mais gerais da Anvisa, em vigor há mais de dez anos, que regulamentam a rotulagem de alimentos. Uma trata da rotulagem de modo geral, indicando como devem ser as declarações de origem, quantidade, ingredientes e denominação do produto. A outra norma trata da rotulagem nutricional, que inclui a tabela de nutrientes e informações nutricionais complementares que, normalmente, aparecem em letras minúsculas, quase nunca lidas. Essas duas normas definem a informação obrigatória que deve aparecer na embalagem dos alimentos.

Na avaliação do Idec, o atual modelo de rotulagem é deficiente e não atende a requisitos básicos para garantir uma alimentação saudável, apresentando uma linguagem muito técnica, de difícil compreensão e com problemas de visualização.

A proposta de advertência do Idec é por meio de um triângulo preto com a borda branca localizado na parte frontal da embalagem. Entre as vantagens desse símbolo, o instituto destaca o fato de ser uma forma que não apresenta perda na percepção em tamanho reduzido, além do triângulo já ser uma convenção de advertência no Brasil. Já a indústria da alimentação defende o modelo de semáforo nutricional, adotado no Reino Unido, que utiliza cores (verde, amarelo e vermelho) para indicar o conteúdo nutricional baixo, médio e alto.

Indústria pede socorro a Temer

Em maio deste ano, a Anvisa publicou um relatório técnico que, entre outras coisas, defendeu o modelo de rotulagem frontal. Ao longo deste debate, a Anvisa vem sofrendo uma série de pressões de setores ligados à indústria alimentícia, que não querem a adoção do modelo proposto pelo Idec e por pesquisadores da UFPR. Em entrevista concedida ao jornal Folha de S.Paulo, dia 19 de julho, o então presidente da agência, o médico sanitarista Jarbas Barbosa, criticou as tentativas de interferência política nas decisões do órgão. Barbosa terminou seu mandato de três anos e não está mais na direção da Anvisa.

A Associação Brasileira das Indústrias da Alimentação (Abia) é contrária à adoção do modelo vigente no Chile. Para a entidade, a sinalização com triângulos pretos trazendo as informações na parte frontal da embalagem, traria prejuízos para o setor. No dia 30 de julho, durante uma reunião almoço com empresários na sede da Federação das Indústrias de São Paulo (Fiesp), Michel Temer criticou esse modelo de rotulagem com alertas visíveis sobre as altas concentrações de gorduras, açúcar e sal. Depois disso, a Aliança pela Alimentação Adequada e Saudável, uma coalizão de entidades que reúne o Idec, a Associação Brasileira de Saúde Coletiva (Abrasco) e a Associação Brasileira de Nutricionistas (Asbran), entre outras, pediu uma audiência com Temer para apresentar argumentos técnicos em defesa desse modelo de rotulagem.

“As letras são muito pequenas e a linguagem não é clara”

Noemia Perli Goldraich, coordenadora do Núcleo Interdisciplinar de Prevenção de Doenças Crônicas na Infância. (Foto: Marco Weissheimer/Sul21)

A médica Noemia Perli Goldraich, coordenadora do Núcleo Interdisciplinar de Prevenção de Doenças Crônicas na Infância, da Pró-Reitoria de Extensão da UFRGS, observa que, no atual modelo de rotulagem, a população não consegue saber o que há dentro dele. “As letras são muito pequenas e a linguagem não é clara. Você não encontra a palavra ‘açúcar’, por exemplo. O sal aparece como sódio.  Por isso defendemos esse modelo dos triângulos, vigente no Chile, que diz claramente ‘muito sal’, ‘muito açúcar’, ‘muita gordura trans’. A indústria não quer saber disso”, assinala.

Outro ponto positivo do modelo chileno de rotulagem, acrescenta Noemia Goldraich, é que na hora em que um produto recebe um selo de advertência, não pode mais ter bichinhos e desenhos coloridos na embalagem, para não chamar a atenção das crianças. “A embalagem fica lisa e não pode mais ficar dizendo coisas como ‘reduzido em açúcar’. Todos esses comentários desaparecem. Também não pode mais ser vendido em escolas, hospitais e órgãos públicos. Quem quiser continuar vendendo terá que melhorar o seu produto. Nos Estados Unidos, empresas como a Nestlé. A Danone, a Coca Cola e a Pepsi Co.  se reuniram em uma articulação chamada Aliança e fizeram um documento prometendo adotar práticas transparentes e fabricar produtos melhores. Viram que a coisa está ficando complicada para o lado deles. Se eles vão fazer, isso é outra história”, diz a médica.


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