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20 de junho de 2018
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16:26

Escola técnica estadual tenta resistir à desapropriação para ampliação do Hospital de Clínicas

Por
Sul 21
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Cartazes expostos em frente a escola protestam contra possível despejo do terreno. Foto: Joana Berwanger/Sul21

Giovana Fleck

“Se o Estado desistiu dos alunos, significa que nós temos que continuar lutando”, afirma Rita Mônica Mombelli, diretora da Escola Estadual de Educação Profissional em Saúde (EPS), ou Escola Técnica de Saúde. Em novembro de 2017, a escola recebeu uma notificação para desocupar o prédio para que o terreno fosse integrado às obras de ampliação do Hospital de Clínicas de Porto Alegre (HCPA). “Nos surpreendemos com essa decisão. Afinal, quando nos mostraram a maquete do projeto, a escola permanecia ali. Não havia intenção de nos tirar”, diz a diretora.

A EPS se encontra em terreno cedido há mais de 20 anos pelo HCPA. Criada em 1989 em caráter emergencial, ela procurava suprir uma demanda do próprio hospital de capacitar mais de 300 funcionários que não tinham formação técnica. “Assim, o Estado entraria com os professores e o hospital com a infraestrutura para atender não só as necessidades deles, mas de outros hospitais também”, conta Rita. A grade de quatro cursos foi criada para as áreas de radiologia, analises clínicas, nutrição e dietética e gerência em saúde. Logo, a estrutura foi montada no 3º andar do HCPA.

“Tanto a procura quanto a escola foram crescendo, o que levou o governo a estabelecer um protocolo de intenção para que um prédio fosse construído. Através desse protocolo, o Estado entrou com a construção do prédio e o HCPA com o terreno”, explica. Em 20 anos, a escola passou a atender uma média de 1.200 alunos por ano. Hoje, conta com uma estrutura de 14 salas de aula, quatro laboratórios específicos, dois laboratórios de informática; além de salas vinculadas à administração e áreas de uso comum.

Alunos durante aula no laboratório de radiologia da escola. Foto: Joana Berwanger/Sul21

Expansão do HCPA

Em 2013, as obras de expansão do Hospital de Clínicas foram inciadas. A proposta visa a ampliação de 70% da área construída, aumentando o número de leitos e estrutura para pesquisas. Porém, com o início das construções, boatos começaram a chegar aos estudantes da escola que estagiavam no HCPA. “Funcionários começaram a falar de e-mails que tinham recebidos sobre o uso do terreno da escola para a expansão. Nós ficamos muito preocupados, já que não tínhamos recebido nada oficial”, diz Rita. A diretora conta que, ao procurar a Secretaria Estadual da Educação (Seduc), mantenedora da escola, foram informados de que deveriam ficar despreocupados, reiterando que a escola não seria afetada.

Risco de desapropriação

A partir da notificação no final de 2017, Rita iniciou uma série de tentativas de comunicação com representantes da Seduc e do hospital. “Conseguimos a primeira reunião apenas seis meses depois, no dia 21 de maio de 2018.” Recebida pela diretora-presidente do HCPA, Nadine Clausell, Rita conta ter tentado apresentar outras possibilidades de uso de terrenos próximos para que a escola pudesse permanecer onde está. “Mas ela foi irredutível, disse que outro terreno estava fora de questão.” Ela deixou a reunião com a promessa de que a EPS seria realocada em um espaço qualificado para recebê-los. O hospital usaria o terreno da escola para ampliar uma das ruas já asfaltadas, construída entre a escola e seu antigo estacionamento, que liga a rua São Manuel ao complexo hospitalar. Assim, não haveria possibilidade de expandir a passagem para o lado do estacionamento, necessitando demolir uma parte da escola.

Dois dias depois, a diretora se reuniu com representante da Superintendência da Educação Profissional do Estado (Suepro), que também reafirmou que a escola seria transferida para um espaço apropriado. “Saí entristecida, mas de certa forma reconfortada.”

Estudantes encomendaram faixa em apoio à permanência da escola. Foto: Joana Berwanger/Sul21

No dia 11 de junho, uma nova reunião foi convocada. Dessa vez, com a participação da Divisão de Projetos de Arquitetura (DPA) da Secretaria de Obras, Saneamento e Habitação e com a vice-diretora do Colégio Estadual Júlio de Castilho. Ali, Rita foi informada de que a EPS ocuparia o 3º andar do outro colégio após uma reforma das salas. Diversos problemas passaram a ser apontados tanto por Rita quanto pela vice-diretora, argumentando que a estrutura não seria suficiente. “Primeiro que precisamos de laboratórios para os alunos, e as próprias regras do PPCI (Plano de Prevenção e Proteção contra incêndios) delimitam que eles têm que estar no térreo. Fora isso, ficaríamos confinados num espaço de apenas 6 ou 7 salas de aula. É impossível fazer essa troca”.

Sem conseguir se reunir com a Seduc para tratar do assunto, a comunidade escolar decidiu organizar um ato para pressionar a secretaria. “Esperávamos que a Seduc nos defendesse, já que não houve a assinatura de um novo protocolo de intenção ou a revogação do antigo”, aponta a diretora. Na manhã da terça-feira (19), saíram em caminhada da escola até a Secretaria, porém, foram recebidos com portões fechados. Após algum tempo em frente ao prédio, foram liberados para entrar até o limite do pátio. “A gente não acreditava, simplesmente não queriam nos receber.” No final da manhã, após algumas horas de pressão, conseguiram deixar o local com uma reunião agendada para a quinta-feira (21).

“É um desrespeito muito grande conosco e com quem chega até nós procurando formação. Não se coloca uma escola de saúde em qualquer lugar”, diz Rita. O Hospital de Clínicas não se posicionou sobre alterações em seu projeto de ampliação. Apenas afirma que “a questão envolvendo o espaço onde hoje funciona Escola Técnica em Saúde está inserida no contexto da expansão do hospital e seus novos prédios. Este aspecto envolve a necessidade de​ reorganizar fluxos para melhor acolher pacientes, familiares e visitantes no complexo hospitalar”.

Diretora da escola, Rita Mônica Mombelli. Foto: Joana Berwanger/Sul21

Segundo o hospital, tratativas estariam sendo feitas com a Seduc há, pelo menos, dois anos. No entanto, não divulgaram informações sobre os motivos que levaram a escola a ser notificada, apenas, no final de 2017. Segundo nota divulgada pela Seduc, a transferência da escola deverá ser concluída em 2019. No entanto, aponta que o Julinho é uma entre outras possibilidades que estão sendo avaliadas. Além disso, a Secretaria afirma que a possibilidade de transferência para o Julinho não teria sido apresentada pelo governo, mas sim pela ex-diretora da escola que se aposentou em maio. “Isso nunca aconteceu. Lembro de uma reunião em que estávamos juntas e ela teria dito que isso [a transferência para o Colégio Júlio de Castilhos] era uma atitude previsível. Mas soubemos disso em conjunto neste ano. Nunca foi uma sugestão nossa”, diz Rita.

Sobre os investimentos para a transferência, a Seduc  esclarece que o governo do Estado irá fazer obras de melhorias, sem estipular preços ou orçamentos neste primeiro momento de avaliação. “O intuito é beneficiar professores e alunos para o início do ano letivo seguinte, como o caso em pauta”, completa.

Confira a nota do HCPA na íntegra: 

Maquete do Clínicas mostra escola ao lado do hospital. Foto: Divulgação

O Hospital de Clinicas de Porto Alegre (HCPA) passa por um processo de ampliação de quase 70% da área construída. Com as obras, a instituição irá atender a comunidade com ​ainda ​mais qualidade e segurança.

A questão envolvendo o espaço onde hoje funciona Escola Técnica em Saúde está inserida no contexto da expansão do hospital e seus novos prédios. Este aspecto envolve a necessidade de​ reorganizar fluxos para melhor acolher pacientes, familiares e visitantes no complexo hospitalar.

Tratativas referentes à Escola Técnica de Saúde e sua realocação têm sido encaminhadas junto à Secretaria Estadual de Educação, dentro do planejamento estabelecido para a execução das obras. O Clínicas reforça seu compromisso com a qualidade no atendimento aos pacientes e à comunidade.

Confira a nota da Seduc na íntegra: 

A Secretaria Estadual da Educação (Seduc) informa que a Escola Técnica Estadual de Saúde – Hospital de Clínicas, uma referência no setor, deverá trocar de local em 2019. A razão é porque o Hospital de Clínicas, proprietário do prédio e do terreno da Escola, solicitou devolução do estabelecimento devido a ampliação de suas instalações. As tratativas para a mudança vêm ocorrendo há um ano com a participação da direção da escola que endossou todas as tratativas. A direção do Clínicas se colocou à disposição para ajudar na instalação dos laboratórios e outros serviços técnicos que serão necessários no novo prédio. Atualmente estão sendo analisados locais adequados para manter os serviços da escola, sem prejuízo aos alunos e professores, mas ainda não está definido o local. O Colégio Júlio de Castilhos, sugerida pela direção da escola, é uma das possibilidades já que é um estabelecimento com capacidade para abrigar mais de 4 mil alunos e atualmente tem cerca de 1,4 mil alunos. A Seduc reitera que não haverá qualquer tipo de prejuízo aos alunos, que poderão manter seus cursos, nem previsão de troca de professores. Em relação aos investimentos em reformas realizadas em dezembro naquela escola, a Seduc esclarece que o governo do Estado, sempre que for necessário, irá fazer obras de melhorias na rede pública, com o intuito de beneficiar professores e alunos para o início do ano letivo seguinte, como o caso em pauta. Esclarece, por fim, que é notória a preocupação do Governo do Estado com a reforma e manutenção da rede pública escolar sendo que até o final do ano cerca de R$ 100 milhões serão investidos em mais de 700 obras que estão sendo realizadas, nesta rubrica, em todo o Rio Grande do Sul.

Confira mais fotos:

Segundo a diretora, esse seria o trecho da rua que seria ampliado com a remoção da escola. Foto: Joana Berwanger/Sul21
Laboratório de nutrição também é usado por alunos da UFRGS. Foto: Joana Berwanger/Sul21
Laboratório de informática durante aula. Foto: Joana Berwanger/Sul21
Foto: Joana Berwanger/Sul21

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