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19 de fevereiro de 2018
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20:40

Indígenas denunciam ação da Brigada Militar que deixou 10 feridos em Passo Fundo

Por
Sul 21
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Protesto de indígenas na Justiça Federal, em Passo Fundo, em julho de 2017 | Foto: Bibiana Canofre/Sul21

Fernanda Canofre

Às 4h da última quinta-feira (15), um grupo de doze famílias kaingang chegou a uma área do Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (DNIT), na beira do asfalto próximo à Fazenda da Brigada Militar, em Passo Fundo, e começou a montar acampamento. A ideia era que a ocupação da faixa de terra servisse para colocar pressão no governo do Estado para uma solução para quem espera por demarcações. O acampamento deveria abrigar 50 pessoas vindas da região de Mato Castelhano e do Campo do Meio. Antes que o grupo conseguisse concluir a montagem, perto das 11h da manhã, a Brigada Militar chegou ao local com o Batalhão de Operações Especiais (BOE). Segundo os indígenas, pelo menos 10 pessoas que estavam no acampamento ficaram feridas.

Em fotos enviadas ao Sul21, mostram indígenas com ferimentos causados por munição não-letal nas costas, pernas, barriga, braços, rosto e ouvido. Em nota publicada neste sábado (17), o Conselho Indigenista Missionário (Cimi) relata que “houve tentativa de diálogo com os policiais”, mas que a iniciativa “não surtiu nenhum efeito”. “De imediato, os policiais passaram a agredi-los. Foram lançadas bombas de gás lacrimogêneo e disparados tiros de balas de borracha. Várias pessoas acabaram sendo alvejadas e feridas, dentre as quais crianças, mulheres e idosos”, segue o texto.

Imagens de ferimentos em indígenas, causados pela munição anit-motim | Foto: Arquivo pessoal

A nota, ainda citando depoimentos dos próprios indígenas, também afirma que “além das agressões físicas, os indígenas sofreram uma série de constrangimentos e insultos com frases preconceituosas como: ‘tropa de bugres sujos’”, além de terem sofrido ameaças de morte

A ação foi denunciada junto ao Ministério Público Federal, pelos próprios indígenas. Por meio de assessoria a procuradora responsável pelo caso, Fernanda Alves de Oliveira, disse que está colhendo dados junto aos envolvidos para decidir como seguirá a investigação. Como as informações careceriam de mais apuração, ela preferiu não se manifestar.

A reportagem tentou contato com o 3º Regimento de Polícia Montada de Passo Fundo durante esta segunda-feira, porém nenhum dos quatro telefones fornecidos pela assessoria da Brigada Militar atendeu.

Em entrevista à Rádio Uirapuru, no dia da ação, o comandante do 3º RPMon, Major Paulo César de Carvalho, declarou que foi dado um prazo para a desocupação, “mas eles foram hostis”. A mesma reportagem diz que “os índios utilizaram-se de pedaços de madeira e enxadas, enquanto a polícia fez uso de balas antimotim”.

O kaingang Daniel Carvalho, da comunidade indígena de Campo do Meio, conta que os policiais teriam “ chegado atirando”. “Chegaram metendo fogo em todo mundo. Não deu tempo [de falar]. Disseram que se não saíssem iam estuprar as mulheres, foi uma tortura. Derrubaram um senhor de 80 e poucos anos e meteram mais de 13 tiros”.

Indígena mostra ferimento nas costas | Foto: Arquivo pessoal

Segundo um funcionário do escritório da Fundação Nacional do Índio (Funai) de Passo Fundo, que pediu para não ser identificado, o que tem preocupado nas ações recentes de polícias contra indígenas na região é a rapidez das mesmas e os riscos à crianças e idosos.

“[A Brigada] usa armamento não-letal, mas ali parece que foi à queima roupa. Já aconteceu outros episódios, por exemplo, na Terra Indígena de Passo Grande do Rio Forquilha, houve uma ação com a Brigada Militar e a Polícia Federal, em 2016”, diz.

No ano passado, escritórios da Funai no Rio Grande do Sul e Santa Catarina foram ocupados em protestos contestando a nomeação do coordenador de saúde para a região, um aliado do PMDB. Desde outubro, porém, o cargo está vago. Embora o governo de Dilma Rousseff (PT) tenha tido um dos piores históricos de demarcações de terra indígenas, com Michel Temer (PMDB), os processos tiveram um “congelamento total”, nas palavras do servidor.

“[Os indígenas] ficam revoltados, cansados de esperar. A gente não tem muito o que dizer para eles, porque só coordenamos os processos, então ficamos em uma situação de fogo cruzado. Enquanto isso, eles seguem vivendo em condições precárias, acampamentos provisórios, a gente tenta ajuda com parcos recursos que tem para minimizar”.


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