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3 de setembro de 2017
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12:14

Chama a Beta no Inbox: robô feminista alerta sobre perda de direitos das mulheres

Por
Sul 21
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Giovana Fleck

Betânia nasceu no dia 28 de agosto. Apelidade de Beta, não tem voz, rosto – sequer corpo. É uma robô, ou melhor, uma chatterbot: um grande combinado de códigos que resultam em um programa de computador que tenta simular o diálogo humano. Mas Beta tem gênero; é mulher. É feminista.

Seu grande canal de atuação é através do Messenger, aplicativo de mensagens vinculado ao Facebook. Programada para ocupar um sistema de tecnologia dominado por homens, Beta interage diretamente com os usuários do Messenger pelo chat box. Você manda uma mensagem, segue as instruções e é informada sobre PEC’s que estão transitando. Após o envio de perguntas em linguagem natural, o programa consulta uma base de conhecimento e em seguida fornece uma resposta que tenta imitar o comportamento humano. Em apenas 3 dias, foram mais de 10 mil compartilhamentos sobre projetos públicos com propostas que retrocedem direitos das mulheres.

O bot foi criado pela ONG Nossas, um laboratório de ativismo político que procura aproximar as pessoas do poder público. O grupo, que surgiu em 2011 com a rede Meu Rio, segue a política do código aberto e busca, pela internet, criar uma rede de contatos para mobilizar e pressionar em massa deputados e outros políticos no momento em que pautas importantes e consideradas perigosas estão próximas de serem votadas. Laura Molinari, coordenadora de projetos da Nossas, conta que a ideia surgiu da necessidade de comunicar de forma acessível e intuitiva. “Vários projetos são lançados todos os anos visando mobilizar pessoas em torno de assuntos que precisam de visibilidade, mas acabam não indo para a frente por não estarem na plataforma certa”. Segundo Laura, Beta é uma robô ativista, mas não militante. “No final, são as pessoas que tomam as ruas. A Beta é o canal que pode provocar isso”.

 

Ameaças

A PEC 29, que tem o senador Eduardo Amorim (PSC-SE) como relator, propõe mudar parte do artigo 5º da Constituição, proibindo completamente o aborto, até em casos em que ele é permitido atualmente, como quando há risco de vida à mãe, gravidez resultante de estupro e se o feto for anencéfalo.

Já o Estatuto do Nascituro, escrito por Luiz Bassuma (PT-BA) e Miguel Martini (PHS-MG), propõe que qualquer tipo de aborto seja abolido e que as mulheres possam ser criminalizadas por trabalhar durante a gestação. A proposta também impede pesquisas com células-tronco e suspende sessões de quimioterapia, radioterapia e até mesmo analgésicos caso afetem o embrião.

Essas são os dois principais projetos monitorados pelo “radar da Beta” e devem encaminhar as primeiras campanhas do projeto. Laura explica que, mantendo a ideia de aproximar a comunidade do poder público, a atuação deve ocorrer através de e-mails enviados pelas usuárias aos relatores dos projetos. “Ainda estamos desenvolvendo outras ferramentas através da interações com a Beta. A ideia é que seja o mais dinâmico, didático e eficaz possível”, afirma a coordenadora do projeto.

Através da página, porém, enquanto os primeiros projetos ainda estão sendo desenvolvidos, outras iniciativas já vêm sendo divulgadas. Os recentes relatos de mulheres assediadas em transportes públicos, especialmente o caso de um homem que ejaculou no ombro de uma mulher dentro de um ônibus em São Paulo, ganharam proporções nacionais. Para Beta: “é inacreditável que, em pleno 2017, as mulheres ainda precisem reafirmar o óbvio: #meucorponãoépúblico“. 

Nunca poderia ser Beto

Beta nasceu prematuramente, por assim dizer. Desde abril, funcionava para testes internos e só deveria ser lançada no final de setembro. Porém, foi descoberta no final de agosto e “explodiu”, segundo Laura. “Não esperávamos, mas agora é a hora de aproveitar o potencial para aprimorar a Beta ao máximo”.

Embora seja raro ver o chat do Facebook sendo usado como canal de mídia, a estratégia tem se mostrado eficaz. “Falamos com as mulheres onde elas já estão. Faltava um canal para informar esse público sobre o que está rolando e fazer isso através de uma ferramenta que usamos todos os dias ”, defende Laura.

A coordenadora também explica que a ideia inicial do robô não era ser feminista, mas a grande quantidade de mulheres na equipe passou a pautar os riscos da perda de direitos femininos.“Principalmente com bancadas conservadoras ganhando força”, enfatiza Laura. “Embora o poder público se sinta muito blindado, eles vão saber que tem gente preocupada com esses assuntos. Precisamos nos fazer presente em um processo que nos ausenta o tempo todo, um processo político”, diz. Além disso, existe o efeito colateral positivo de mostrar que o mercado de tecnologia está, sim, aberto para mulheres. “É um robô feminista com identidade de mulher. Nunca poderia ser Beto”.

O lançamento oficial deve ser feito no momento em que algum projeto for levado para votação e houver a oportunidade dessa mobilização em massa. E, se o Betânia também te remeteu a Maria Bethânia, experimenta perguntar para a Beta qual é a sua música preferida.

 

 


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