Geral
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23 de janeiro de 2014
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13:27

MPF identifica “privatização de espaço público” e dano ambiental na construção de condomínio de luxo em Imbé

Por
Sul 21
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Foto: Divulgação/MPF
Ministério Público Federal aponta que pelo menos um terço da área do condomínio Las Olas está sendo erguido em cima de território protegido pela legislação ambiental, junto às dunas de Imbé | Foto: Divulgação/MPF

Samir Oliveira

O Ministério Público Federal (MPF) em Capão da Canoa ingressou na última quinta-feira (16) com uma ação civil pública contra a construção do condomínio Las Olas, na cidade de Imbé. A medida, que também atinge a prefeitura do município e a Fundação Estadual de Proteção Ambiental (FEPAM), exige o fim das obras por apontar que estão sendo realizadas em área de proteção permanente (APP).

O condomínio de luxo está sendo construído em frente ao mar, entre as avenidas Beira Mar e Não Me Toque, e possui uma área total de 5,16 hectares (equivalente a 51 mil metros quadrados). A investigação é conduzida pelo Ministério Público Federal desde 2011. O caso tramita na Justiça Federal por se tratar de uma área costeira.

Foto: Divulgação/MPF
Obra já está em fase adiantada, com parque esportivo concluído, de acordo com informações no site do empreendimento | Foto: Divulgação/MPF

Na ação, o procurador federal Felipe da Silva Müller reforça que é proibida a edificação de projetos imobiliários em uma faixa de 60 metros da primeira duna junto à praia, em direção ao continente – o que constata não ter sido respeitado no caso em análise. Através de perícias, ele observa que pelo menos um terço do perímetro do condomínio Las Olas está erguido em território de APP e, portanto, teria que ser demolido.

A FEPAM concedeu duas licenças ao empreendimento: a Licença Prévia, em 2009; e a Licença de Instalação, em 2010 – esta última, válida até fevereiro de 2013. De acordo com a ação do MPF, as licenças contêm a proibição de construção no raio de 60 metros. Entretanto, em fiscalizações posteriores, a FEPAM teria atestado que essa infração não estava ocorrendo, quando, de acordo com o Ministério Público Federal, estava. “A FEPAM foi omissa em não fiscalizar o cumprimento das condicionantes previstas nas licenças que ela própria expediu”, diz o MPF na ação.

Foto: Reprodução/Las Olas
Projeto exibido no site do condomínio Las Olas prevê construção de piscina de frente para o mar | Foto: Reprodução/Las Olas

Além disso, a legislação estabelece que um empreendimento com as características do Las Olas necessita de um Estudo de Impacto Ambiental (EIA) para obter a liberação, mas a FEPAM entendeu que a exigência não era necessária. Na ação, o MPF observa que as licenças emitidas pelo órgão “não previram a necessidade de EIA/RIMA, sob justificativa de não existência de características ambientais importantes ou significativas na área”.

O Ministério Público Federal constatou que a edificação do Las Olas na área de preservação coloca a biodiversidade da região em risco. O MPF destaca a presença de charcos, de vegetação fixadora protegida sobre o cordão de dunas e de tocas de tuco-tuco – pequeno mamífero roedor que integra a lista de espécies ameaças de extinção no país – no local onde a obra está sendo erguida.

O procurador Felipe da Silva Müller entende que o condomínio Las Olas suprime “parte do cordão de dunas e da vegetação de restinga” e sua área construída se encontra “rente às dunas remanescentes”, sem o distanciamento que estabelece a legislação ambiental.

“Nota-se uma tentativa de privatização de um espaço de acesso público”, frisa procurador

Foto: Reprodução/Las Olas
Projeção de como será o condomínio Las Olas após a finalização | Foto: Reprodução/Las Olas

Na ação elaborada pelo Ministério Público Federal, o procurador Felipe da Silva Müller comenta que o condomínio Las Olas utilizou-se do fato de que está localizado em frente ao mar para buscar “maior valorização do imóvel”. No site do empreendimento, a construtora anuncia que todos os lotes já foram vendidos.

De acordo com informações do próprio projeto, o condomínio conta com uma estrutura que oferece 266 habitações – com até quatro dormitórios – e infraestrutura com hall coberto, piscina com borda infinita e vista para o mar, fitness center, espaço para crianças, vestiários, sala de jogos e quadras esportivas em piso sintético e com coberturas. “De fato, vê-se que com relação ao condomínio Las Olas houve ampla divulgação comercial de sua localização junto à praia, rente às dunas, em busca de maior valorização do imóvel. Nota-se, portanto, uma tentativa de ‘privatização’ de um espaço de acesso público sem qualquer preocupação de ordem ambiental”, expressa o MPF na ação.

Prefeitura de Imbé e FEPAM dizem que ainda não foram notificados e construtora assegura que projeto é legal

A reportagem do Sul21 entrou em contato com todos os réus citados pelo Ministério Público Federal na ação. A prefeitura de Imbé – que emitiu aprovação ao empreendimento, através de dois alvarás de construção – disse, por meio de sua assessoria de imprensa, que só se manifestará sobre o caso após ser notificada pela Justiça Federal. Na ação, o MPF diz que “o município em questão não exerceu o papel que lhe foi atribuído na defesa ambiental, deixando de fiscalizar e de adotar as medidas cabíveis em relação às edificações em Áreas de Preservação Permanente na Zona Costeira de seu território, inércia que põe em risco o ecossistema e causa graves e não raro irreversíveis danos aos bens ambientais coletivos”.

Foto: Reprodução/Google Earth
Imagens obtidas pelo MPF no Google Earth foram anexadas à ação e demonstram mudanças na ocupação do terreno onde está sendo construído o condomínio Las Olas | Foto: Reprodução/Google Earth

A FEPAM enviou uma nota na qual informa que os processos questionados pelo MPF encontram-se em poder da Polícia Federal, já que estão sob investigação englobada pela Operação Concutare, que flagrou, em 2013, diversos casos de corrupção envolvendo liberação de licenças ambientais. “Informamos que o processo administrativo nº 5721.0567/08-6 referente ao empreendimento JRD Negócios Imobiliários Las Olas, em Imbé, foi apreendido pela Polícia Federal em decorrência da Operação Concutare. Em razão disso, até o momento, o processo não foi restituído à Fepam. Informamos também que a Fepam não recebeu a citação oficial e não tem conhecimento do inteiro teor da ação proposta pelo Ministério Público Federal”, expressa a Fundação.

Já a empresa Báril Produtos Imobiliários (nome fantasia da JRD Negócios Imobiliários), responsável pela execução do Las Olas, se pronunciou através de e-mail enviado à reportagem. O grupo frisou que desconhece o teor da ação, já que ainda não foi notificado, e assegura que o empreendimento encontra-se respaldado pela legislação ambiental. “Temos convicção da inexistência de qualquer irregularidade ambiental, uma vez que as licenças expedidas pela FEPAM e Município de Imbé pautaram-se rigorosamente para legislação vigente”, expressa a empresa. A Báril Produtos Imobiliários acredita que existe “equívoco de compreensão” por parte do Ministério Público Federal. “Acreditamos que deva haver algum equívoco de compreensão por parte do MPF, o que será, por certo, devidamente esclarecido no momento processual oportuno”, manifesta a construtora.


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