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23 de outubro de 2015
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09:54

Em palestra na UFRGS, diplomata diz que desafio do Brasil é administrar relações com a China

Por
Sul 21
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Diplomata Samuel Pinheiro Guimarães fez palestra, na quinta-feira na Semana Acadêmica do curso de Relações Internacionais|Foto: Guilherme Santos/Sul21
Diplomata Samuel Pinheiro Guimarães fez palestra, quinta-feira, na Semana Acadêmica do curso de Relações Internacionais|Foto: Guilherme Santos/Sul21

Jaqueline Silveira

Em uma hora de palestra para um público formado, em sua ampla maioria, por estudantes, na noite de quinta-feira (22), o diplomata Samuel Pinheiro Guimarães fez uma exposição dos desafios da política externa do Brasil e defendeu o combate à sonegação fiscal e a taxação das grandes fortunas. A atividade fez parte da Semana Acadêmica do curso de Relações Internacionais da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS).

Ex-secretário de Relações Exteriores do Ministério de Relações Exteriores no governo Lula, o diplomata fez um histórico da política econômica interna do Brasil desde a formação do país até dos dias atuais. Nesse contexto, ele ressaltou como “fundamentos importantes” tiveram reflexos na política externa brasileira: a posição geográfica e a composição demográfica da sua população. “Não pode ser ignorado o que acontece na Argentina, Bolívia, Venezuela”, exemplificou o hoje professor do Instituto Rio Branco, sobre as nações vizinhas do Brasil. Guimarães relembrou que, em 1940, o país tinha um contingente de habitantes pequeno, cerca de 40 milhões, população menor do que a da França. Atualmente, são 200 milhões de brasileiros, enquanto o país europeu registra aproximadamente 60 milhões de franceses.

Falando para uma plateia forma em sua maioria por estudantes, Guimarães abordou a situação econômica do país e os reflexos na política externa | Foto: Guilherme Santos/Sul21
Falando para uma plateia formada em sua maioria por estudantes, Guimarães abordou a situação econômica do país e os reflexos na política externa | Foto: Guilherme Santos/Sul21

Desde o início, relembrou ele, o país teve vários ciclos econômicos, como da cana-de-açúcar com mão de obra escrava, do minério, do café e da borracha. “Tudo isso caracterizou o processo econômico brasileiro”, pontuou o palestrante, sobre os vínculos estabelecidos entre “as classes dominantes” do Brasil e dos países interessados nos produtos. “A política externa tem de ser vista não como o vínculo dos países, mas, sim, das classes dominantes”, emendou Guimarães, citando como exemplo os Estados Unidos, que tinham interesse nos produtos primários brasileiros, como o café. O Brasil, inicialmente, conforme ele, “se apresentou como um grande produtor de matéria-prima”, referindo-se ao café, ao açúcar, à borracha, ao ouro e ao diamante.

Mercosul sofre ataque ideológico

Nos dias atuais, avaliou Guimarães, há um “debate ideológico se “o Brasil só deveria dar preferência aos países da América do Sul” na sua política externa ou aderir a grandes acordos comerciais mundiais. Resultado dessa “disputa ideológica”, segundo o diplomata, a imprensa passa uma ideia de que o Mercosul não teve êxito. “Todos estão convencidos que o Mercosul é um grande fracasso. Estão equivocados, é um grande sucesso”, argumentou ele, que foi nomeado Alto- representante Geral do Mercosul, em 2011. O Brasil registra dentro do bloco, de acordo com o professor, o maior “superávit” das exportações, mas é visto negativamente por sofrer um “ataque ideológico”.

Grandes fortunas não pagam Imposto de Renda

No contexto da política externa, o diplomata ressaltou que uma das visões que estão postas para o país é a “sociedade que vai se integrar ao mercado internacional e seja o que Deus quiser”. “Os capitais estrangeiros não vão salvar o país”, alertou Guimarães, que também foi ministro-chefe de Assuntos Estratégicos da Presidência no governo Lula. Hoje, na sua opinião, a política econômica adotada no Brasil criou “uma crise que não existia”. Para o professor, uma das alternativas para superar a crise é a taxação das grandes fortunas. Recentemente, conforme ele, a secretaria da Receita Federal divulgou que 71.740 brasileiros das “classes dominantes” faturam, somados, uma fortuna de R$ 300 bilhões ao ano e não pagam Imposto de Renda desde 1995. Só o Brasil e a Espanha, informou o palestrante, não tributam os cidadãos milionários. “Esses indivíduos são os que protestam contra a carga tributária. Isso é extraordinário! Essa disputa ideológica”, ironizou o diplomata, sobre o fato de não pagarem Imposto de Renda.

O palestrante defendeu o combate a sonegação, citando a como exemplo a Operação Zelotes |Foto: Guilherme Santos/Sul21
O palestrante defendeu o combate à sonegação, citando como exemplo a Operação Zelotes |Foto: Guilherme Santos/Sul21

Operação Zelotes

Guimarães também apontou como solução o combate à sonegação de impostos, enfatizando que o Brasil é o quinto país do mundo em recursos em paraísos fiscais somando US$ 535 bilhões. O escândalo das contas secretas com dinheiro não declarado no banco HSBC da Suíça e a Operação Zelotes, que investiga o pagamento por grandes empresas de “gratificações” aos conselheiros do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf) em troca da anulação de multas milionárias por sonegação. Sem citar nome, o diplomata lembrou que só uma empresa do Rio Grande do Sul deve R$ 5 bilhões à Receita Federal.

China é o desafio

Der acordo com ele, “criou-se uma propaganda extraordinária” de que não se pode aumentos mais impostos no país. Diante desse cenário e da queda da receita, comentou o professor, a solução encontrada é cortar recursos no Orçamento para 2016 de programas sociais, como do Bolsa Família, medida que ele discorda. Nesse contexto, o diplomata afirmou que a política econômica interna “terá reflexos na externa.” “Nós estamos numa situação difícil que se agrega à China. A China que é um grande desafio”, admitiu Guimarães, devido à situação do país e à administração das relações com o país asiático. A China, explicou ele, tem “gerado uma grande demanda de produtos primários”, mas, ao mesmo tempo, precisa facilitar as importações para reerguer a indústria brasileira. “A China tem de ser participante do esforço de reindustrialização do país”, completou o palestrante.

Professor diz que China precisa ajudar o país a reerguer a indústria brasileira|Foto: Guilherme Santos/Sul21
Professor diz que China precisa ajudar o país a reerguer a indústria brasileira|Foto: Guilherme Santos/Sul21

Pela vasta experiência na área, ao finalizar a palestra, o diplomata reforçou que o desafio do país em sua política externa “é como administrar as relações com a China”, e também as questões de comércio, no caso se deve aderir a grandes acordos mundiais. As relações com a Síria, Rússia e os BRICS, segundo Guimarães, são importantes, mas ficam em segundo plano.


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