Coronavírus
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9 de junho de 2021
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22:09

Influência da vacinação será vista nas próximas semanas, diz médico sobre nova onda de covid em Porto Alegre

Por
Luciano Velleda
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Em Porto Alegre, 86% dos idosos já tomaram as duas doses da vacina contra a covid-19. Foto: Cristine Rochol/PMPA
Em Porto Alegre, 86% dos idosos já tomaram as duas doses da vacina contra a covid-19. Foto: Cristine Rochol/PMPA

Neste mês de maio e começo de junho, pela primeira vez desde o início da pandemia do novo coronavírus, a faixa etária entre 45 e 59 anos de idade é a que tem mais pacientes internados por covid-19 em leitos do SUS nas UTIs de Porto Alegre, representando 35% do total com a doença. Em seguida vem a faixa etária entre 60 e 74 anos (28,5%), praticamente igual as pessoas entre 18 e 44 anos (27,5%) — inclusive é o maior percentual entre os mais jovens desde o início da crise sanitária.

Nos picos da crise em julho e novembro de 2020 e em março de 2021, a população entre 60 e 74 anos sempre foi a mais afetada pela pandemia. A explosão de casos entre pessoas de 18 a 44 anos aconteceu pela primeira vez em março, o pior momento da crise no Rio Grande do Sul até o momento. Nessa faixa etária a contaminação segue em alta, praticamente assumindo o segundo posto entre a população que mais ocupa leitos de UTI na Capital.

As pessoas acima de 75 anos representam, atualmente, apenas 8% dos internados com covid-19 em leitos SUS em Porto Alegre, uma faixa etária que chegou a ser a mais atingida.

A diminuição da internação entre os idosos levanta a questão sobre até que ponto isso já pode ser resultado da proteção oferecida pelas vacinas. Porto Alegre alcançou, nesta quarta-feira (9), 50% da população adulta vacinada com uma dose, e 28,7% com duas doses. Entre os idosos esse percentual é muito superior. São 86,2% das pessoas acima de 60 anos que já receberam as duas doses.

Fernando Ritter, diretor da Vigilância Sanitária da Prefeitura de Porto Alegre, acredita que a cobertura das pessoas já vacinadas está tendo influência importante nesse cenário. E destaca a diminuição dos surtos como um fator significativo para avaliar o crescimento da contaminação, especialmente nas instituições de longa permanência.

“A taxa de mortalidade por covid dessa população, que antes era de 9%, hoje está abaixo de 2%. O impacto já é visível, enquanto em outras populações a gente ainda tem risco iminente, por isso nossa preocupação em fazer a vacinação”, afirma.

Além da mudança de faixa etária dos pacientes internados hoje por covid-19, Ritter destaca também a diminuição da internação e contaminação de alguns grupos, como os profissionais da saúde, muito atingidos antes de serem vacinados. “A média de pessoas internadas baixou para menos de 60 anos. Isso é significativo, porque já tivemos como média acima dos 70 anos de idade. Na realidade, tratamento precoce é só vacina. Isso é de fato comprovado”, diz.

O médico Eduardo Sprinz, chefe do serviço de infectologia do Hospital de Clínicas de Porto Alegre (HCPA), avalia com ponderação a possibilidade da redução na internação de pessoas idosas já ser resultado da vacinação. Responsável pelos testes clínicos no HCPA da vacina desenvolvida pela Universidade de Oxford e pelo laboratório AstraZeneca, Sprinz é cauteloso.

“O que eu quero, é que seja da vacina. Mas a gente tem que levar em consideração outra coisa, que as pessoas mais velhas, infelizmente, muitas morreram, outras tiveram covid e ficaram gravemente doentes e, teoricamente, quanto mais grave, maior a proteção contra uma nova covid. E aqueles que não se contaminaram provavelmente sabem se cuidar melhor”, analisa. “Por um lado, quero que seja por causa da vacina, por outro lado, tenho uma coisa que me diz; ‘mas os suscetíveis nessa idade são muito menos agora’.”

Sprinz avalia que a influência da vacinação será vista nos próximos dias e semanas, se haverá ou não uma explosão de novos casos de contaminação. Apesar da tradicional preocupação com o inverno e os ambientes fechados, o infectologista destaca que o pior momento da pandemia no estado até hoje ocorreu em março, num período de calor. Atualmente, 17,8% da população adulta do Rio Grande do Sul recebeu as duas doses da vacina, ou 14,1% da população residente.

“Tudo vai depender da nossa velocidade de vacinação. Esse não é um ‘bicho’ igual aos outros, é um ‘bicho’ que tem personalidade própria, tudo isso é novo. É uma nova doença que está escrevendo a sua história. E infelizmente estamos vivendo isso”, diz.

O chefe da infectologia do Hospital de Clínicas pondera que, se nas próximas semanas a contaminação “não estourar” ou ao menos não aumentar muito, provavelmente será possível ter a ideia de que a vacinação já está contribuindo para isso. “As pessoas continuam se movimentando, o número de casos novos continua ocorrendo, se não tiver mais tantos casos graves, talvez será um sinal de que a vacinação esteja tendo seu efeito protetor.”

No Hospital de Clínicas, por enquanto, o cenário é de estabilização. Na UTI, Sprinz diz que novos pacientes com covid-19 estão vindo de outras regiões do estado e não necessariamente da Capital.

Assim como o aprendizado das equipes médicas para lidar com o vírus é constante, o infectologista diz que o mesmo ocorre com as vacinas. Quanto tempo vai durar a proteção? Será que as pessoas precisarão de doses de reforço extra? Será que a vacina ajuda a proteger contra todas as variantes? Como se pode fazer com que a vacina aumente a proteção? São algumas questões ainda a serem descobertas.

“Os estudos não vão parar”, afirma Sprinz

Perspectiva da vacinação

Sem rodeios, em março, quando assistentes sociais reivindicavam o direito de entrarem no grupo prioritário da imunização, o diretor da Vigilância Sanitária, Fernando Riiter, chegou a dizer que as poucas doses disponíveis o faziam trabalhar num cenário de “repartir misérias”. Agora, Ritter se mostra bem mais otimista com o avanço da vacinação em Porto Alegre.

As razões para a mudança passam pela ampliação das vacinas disponíveis, como a da Pfizer, cuja entrega não depende de negociações e disputas políticas para receber o IFA da China, o insumo necessário para o Instituto Butantã e a Fiocruz produzirem, respectivamente, a CoronaVac e a AstraZeneca. Nos últimos meses, atrasos na chegada do IFA paralisaram ou diminuíram a produção de ambas as vacinas.

Outra melhoria na projeção da vacinação se refere às perspectivas mais concretas feitas pelo Ministério da Saúde (MS) desde a chegada do ministro Marcelo Queiroga. “Pela primeira vez o Ministério larga um calendário com previsão mais baseada em contratos ou compromissos firmados com os fornecedores”, analisa.

Ritter acredita que a entrada das vacinas Covaxin e Sputnik V igualmente deverão acelerar a campanha de imunização. O otimismo do diretor da Vigilância Sanitária da Capital é completado com o início da produção do IFA pela Fiocruz, encerrando assim a dependência da importação da China.

“Esse conjunto de fatores me deixa mais otimista. Acho que se acordou pra algumas coisas. Não tenho dúvida de que se a gente conseguir cumprir esses elementos, em setembro estaremos próximos da imunidade coletiva tão desejada”, projetou, ao mesmo tempo em que faz votos para imprevistos não acontecerem mais.


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