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31 de março de 2020
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18:32

Twitter ‘subiu um degrau’ ao apagar tuítes de Bolsonaro, mas é preciso cautela com decisões unilaterais

Por
Luís Gomes
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Foto: Reprodução Twitter

Luís Eduardo Gomes

No último domingo (29), o Twitter apagou duas postagens do presidente Jair Bolsonaro sob a alegação de que elas violaram as regras da plataforma. As postagens traziam vídeos do presidente em visita a Sobradinho e Taquatinga, no Distrito Federal, em clara afronta às recomendações de isolamento social para o enfrentamento do coronavírus, defendidas pela Organização Mundial da Saúde (OMS) e pelo ministro da Saúde de seu próprio governo, Luiz Henrique Mandetta.

A ação faz parte de uma tentativa do Twitter de barrar conteúdos que desinformem a população em questões de saúde pública nesse momento. Anteriormente, um post em que o presidente venezuelano, Nicolás Maduro, recomendava uma bebida caseira como forma de ajudar no combate à doença também havia sido apagado. “O Twitter anunciou recentemente em todo o mundo a expansão de suas regras para abranger conteúdos que forem eventualmente contra informações de saúde pública orientadas por fontes oficiais e possam colocar as pessoas em maior risco de transmitir COVID-19. O detalhamento da ampliação da nossa abordagem está disponível em nosso blog”, disse a plataforma em nota.

Na esteira do Twitter, o Facebook também apagou nesta segunda-feira (30) uma das postagens do presidente de sua plataforma e do Instagram — de propriedade do Facebook. “Removemos conteúdo no Facebook e Instagram que viole nossos Padrões da Comunidade, que não permitem desinformação que possa causar danos reais às pessoas”, informou o Facebook em nota.

Fabio Malini, professor da UFES. Foto: Arquivo Pessoal

O Sul21 conversou sobre a importância e o impacto dessa medida com o professor Fabio Malini, pesquisador e analista de redes pelo Laboratório de Estudos sobre Imagem e Cibercultura (Labic), do Departamento de Comunicação Social da Universidade Federal do Espírito Santo (UFES).

Para o professor, a decisão do Twitter está de acordo com as novas regras implementadas para tentar conter a desinformação e é saudável que medidas sejam tomadas nesse sentido. No entanto, ele ressalva que é preciso ter cuidado na análise de medidas desse porte e que elas sempre deveriam ser adequadas ao que diz o Marco Civil da Internet.

“A gente precisa ter cautela em relação a essas medidas unilaterais das plataformas digitais porque, obviamente, a gente precisa prestar atenção nos limites, até porque o chamado ‘pau que dá em Chico, também dá em Francisco’. Então, a plataforma atualizou as suas políticas de qualidade da informação, tentando reduzir o dano de circulação de informação que leve à desinformação e aí as publicações do presidente acabaram infringindo a política da plataforma. Mas, a rede CNN publicou os mesmos vídeos. Então, é sempre bom olhar e analisar com uma certa reserva. Até porque as plataformas devem cuidar da qualidade da informação, da saúde das conversações que acontecem dentro dela, mas é sempre bom lembrar que elas devem estar sob a jurisdição do nosso Marco Civil da Internet, da maneira como regula o nosso sistema de proteção às liberdades, sobretudo de expressão”, diz o professor.

Além disso, Malini avalia que a decisão de retirar postagens do presidente do ar é mais um gesto político, com intuito de mandar um recado ao presidente sobre as publicações a respeito do coronavírus, do que uma política agressiva do Twitter de tirar do ar as chamadas ‘fake news’ sobre o cornonavírus e que irá ter um grande impacto nos conteúdos postados na plataforma.

“Até porque o Twitter tem se mostrado lento em relação a um conjunto de conteúdos semelhantes a esses, mas que são publicados por pessoas que são praticamente invisíveis na plataforma. Óbvio que acaba sendo um gesto político da plataforma para avisar ao presidente, que tem se colocado como um dos líderes que insiste em criticar as medidas da OMS, insiste em estabelecer políticas que vão de encontro do que é do bom senso e do que dizem os especialistas e sanitaristas, mas eu não vejo como uma política agressiva da plataforma. Não, é uma situação absolutamente de crise que nós estamos vivendo e, dentro dessa crise, a plataforma deu um passo, subiu um degrau, na sua política de ser um pouco mais rigorosa com aqueles que são hubs, ou seja, aqueles que são grandes conectores de pessoas às mensagens, o que é o caso do presidente e pode ser o caso de outros políticos, outros influenciadores dentro da plataforma”.

Como analista de redes, Malini também tem monitorado o comportamento das postagens sobre o coronavírus. Ele avalia que, à medida que o interesse e a discussão sobre a pandemia aumentaram, a rede de apoio e de propagação das mensagens do presidente acabou perdendo peso relativo, mesmo ainda sendo forte, porque Bolsonaro não tem conseguido ampliá-la nesse momento.

“Cresceu o quantitativo de pessoas que falam sobre a doença, que abordam e exigem medidas urgentes, inclusive as econômicas, as pessoas, por exemplo, querem que ele pague a renda básica. Então, esse quantitativo maior de pessoas acabou fazendo com que aquela rede bolsonarista, que ainda continua sendo forte e resiliente, fique muito pequena em relação ao todo. É mais ou menos como se a gente tivesse na rua 30 mil pessoas embalando e colocando a bandeira bolsonarista e, de repente, nessa mesma rua chegam 965 mil pessoas. Ou seja, 30 mil dentro de 1 milhão acaba sendo uma multidão muito pequena, mas não deixa de ter a característica de ser ruidosa, de ser resiliente em relação às temáticas e à defesa do governo”, afirma Malini


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