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10 de setembro de 2014
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14:34

Os números do crescimento econômico em 2014: afinal, a economia brasileira está tão ruim assim como dizem algumas manchetes?

Por
Sul 21
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André Passos Cordeiro*

Dia 29 de agosto passado, o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) divulgou o Produto Interno Bruto (PIB) do segundo trimestre de 2014. O valor apurado significou uma queda no PIB em relação ao primeiro trimestre de 0,6%. Assim, o PIB brasileiro registrou duas quedas consecutivas, já que no primeiro trimestre houve queda de 0,2% em relação ao quarto trimestre de 2013. Foi o suficiente para os pessimistas de plantão apontarem a existência de um processo recessivo (diminuição do tamanho da economia) no Brasil. Uma “recessão técnica” dizem. Algo que acontece quando temos o encadeamento de dois trimestres em queda.

Por que dois trimestres e não dois meses, ou dois bimestres? Não há explicação, é só uma convenção… Para visualizarmos o limite desta convenção, lembremos que é possível conviver dentro de um mesmo ano com a queda referida (dois trimestres em sequência) e ainda assim terminar o período com o PIB em alta – o que, por óbvio, não é recessão. Aliás, é o que aconteceria se contássemos o ano de junho a junho (o que os economistas chamam de “acumulado 12 meses”): mesmo com dois trimestres de queda, o PIB dos últimos 12 meses cresceu 1,5%. O mesmo acontece se compararmos períodos iguais como, por exemplo, o primeiro semestre deste ano com o do ano passado: neste caso registramos um PIB 0,49% superior ao de 2013. Como crescimento não é recessão, então…

Isto deve nos tranquilizar? Não. Mas também não deve dar vez à depressão ou à terra arrasada… O número do PIB revela exatamente, e exclusivamente, um fato: a economia brasileira está crescendo pouco. Mas esta conclusão, tomada isoladamente, não diz absolutamente nada. Vamos trazer à cena economias de tamanho parecido com a brasileira, em termos de PIB, para responder a seguinte pergunta: o que se passa aqui está totalmente fora de contexto?

Para tanto, tomemos as dez maiores economias do mundo, entre as quais o Brasil é a sétima, e vejamos o desempenho das nove economias que dividem com o Brasil este seleto grupo.

Apenas duas destas economias, China e Índia, tiveram crescimento médio anual acentuado entre 2009 e 2013 (pós-crise de 2008) e em valores superiores ao crescimento brasileiro. As demais cresceram, em média, muito abaixo do Brasil. Quanto a 2014: excetuando Estados Unidos, Índia e China, que tiveram crescimento acima de 1% ao trimestre em média, todas as demais economias registraram crescimento médio próximo a zero ou negativo. Veja:

Taxas de Crescimento do PIB no pós-crise de 2008 – 10 maiores economias do mundo
ANDRÉ PASSSOS - TABELA PIB
Fonte :1. 2009-2013: Banco Central, retirado de CGEE – 20 anos de economia brasileira.
2. 2014: http://pt.tradingeconomics.com/brazil/gdp-growth

Assim, em termos de crescimento econômico, não estamos em pior situação do que as outras nove maiores economias do mundo, considerando o período pós-crise de 2008. Sofremos o mesmo solavanco: em alguns anos crescemos mais, em outros menos. Mas, considerando o período todo, crescemos mais do que a média e mais do que a ampla maioria. E, em 2014, muitos estão sofrendo com um baixo crescimento, e o Brasil não é exceção.

Quando combinamos outros dois importantes indicadores – inflação e desemprego – ao indicador de crescimento, vemos melhorar o desempenho brasileiro. Observemos primeiro a média de 2009 a 2013. Neste período a inflação brasileira foi maior do que a média das outras nove maiores economias – um desvio de 2,1 pontos percentuais – e, no entanto, nosso crescimento foi maior que esta mesma média, e mais do que o dobro da maioria (à exceção de China e Índia). Além disso, o desemprego foi menor (à exceção de China, Índia e Japão) do que a média.

Entre as 10 maiores economias do mundo, a de melhor desempenho nestes indicadores é a China, com uma inflação mais baixa combinada a menor desemprego e maior crescimento. A maioria das restantes tem, claramente, um pior desempenho que o Brasil no período. Mantém somente a inflação baixa e penaliza suas populações nos outros dois indicadores, ou sequer controla a inflação: cinco economias apresentaram inflação mais baixa (EUA, Alemanha, França, Itália, Reino Unido), mas pagaram a conta disto com taxas de desemprego maiores e crescimento menor, e uma (Rússia) apresentou inflação mais alta, crescimento mais baixo e maior desemprego. As duas restantes (não estamos considerando o Brasil), Japão e Índia, apresentaram melhor resultado em dois quesitos: o primeiro obteve inflação mais baixa com menor desemprego, mas pagou o preço com mais baixo crescimento e o segundo, inflação mais alta com maior crescimento e menor desemprego. Resumindo, das sete economias que obtiveram inflação mais baixa que o Brasil, apenas uma não pagou o preço com mais baixo crescimento ou mais alto desemprego: a China.

Taxa de Inflação no pós-crise de 2008 – 10 maiores economias do mundo
ANDRÉ PASSOS - TABELA INFLAÇÃO

Taxa de Desemprego no pós-crise de 2008 – 10 maiores economias do mundo
ANDRÉ PASSOS - TABELA - DESEMPREGO

Como o crescimento econômico é base para o emprego, como sem emprego não há renda para dar conta das despesas necessárias à vida do ser humano e como um mau desempenho no controle da inflação torna mais difícil adquirir os bens e serviços que se necessita ou deseja, a agenda da política econômica (especialmente fiscal e monetária) tem que balancear seus objetivos levando em conta os três indicadores nos estreitos limites estruturais da economia nacional e da conjuntura internacional.

A resposta à questão que fizemos no terceiro parágrafo é, então: “o que ocorre no Brasil está dentro do contexto internacional”. Mais, dada a situação estamos com uma performance acima de outros países do mesmo porte no pós-crise de 2008.

Para concluir. Em 1977, 37 anos atrás, o Congresso americano estabeleceu quais os objetivos de sua política econômica, através de uma emenda do Congresso americano ao “The Federal Reserve Act”. Este statement ficou conhecido como Dual Mandate. Eis a emenda:

“The Board of Governors of the Federal Reserve System and the Federal Open Market Committee shall maintain long run growth of the monetary and credit aggregates commensurate with the economy’s long run potential to increase production, so as to promote effectively the goals of maximum employment, stable prices and moderate long-term interest rates.”1

Estavam, e ainda estão certos. Não faz mais nenhum sentido medir a saúde de uma economia por seu desempenho em um único indicador, seja ele taxa de inflação, crescimento ou emprego. É preciso medi-la, no mínimo, já que poderíamos incorporar outros indicadores mais, levando em conta a melhor combinação dos três a cada momento histórico. Aliás, está mais do que na hora de modificar o nosso sistema de metas de inflação, baseado unicamente na meta de stable prices e incorporar, formal e definitivamente, a outra ponta: maximum employment and moderate long-term rates.

1 “O Conselho de Governadores do Sistema da Reserva Federal e o Comitê Federal de Mercado Aberto deverão manter o crescimento de longo prazo dos agregados monetários e de crédito concomitante ao potencial de longo prazo da economia para aumentar a produção, de modo a promover eficazmente os objetivos de emprego máximo, preços estáveis e taxas de juros de longo prazo moderadas.”

* Economista, Mestre em Ciência Política


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