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10 de setembro de 2014
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18:01

Dois modelos disputam o Brasil

Por
Sul 21
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Enéas de Souza*

Nesta eleição, estão em disputa dois modelos de organização econômica: o modelo de desenvolvimento produtivo e o modelo neoliberal de expansão financeira. Claro, esse último querendo retornar ao tempo de 1994/2002, quando o Brasil flutuou e naufragou no mar da financeirização. Naquela época, fomos atingidos na política econômica por uma política financeira traçada pelo Banco Central (dirigido por Armínio Fraga de 1999 a 2002) e caucionada pela Fazenda, cujo ministro foi todo o tempo Pedro Malan. O resultado em oito anos foram juros altos, inflação oscilando com números chegando em duas vezes a dois dígitos: em 1995, a 22,41% e, em 2002, a 12,53%, e crescimento econômico médio desses oito anos de 2,2%, com revolta das empresas produtivas pela altura dos juros (José de Alencar candidatou-se a vice-presidente com o Lula por causa disso). A consequência natural foi um carnaval financeiro alargado e o começo de uma desindustrialização crescente. O BNDES virou instituição de aplicação financeira e deixou de ser banco de desenvolvimento. O país não tinha nenhuma estratégia mundial, apenas para o Mercosul, com um processo de abandono desse pela ALCA.

A equipe econômica daquela época parece nunca ter ouvido falar em 3ª Revolução Industrial. A sua vocação religiosa era o crescimento das rendas dos bancos nacionais e dos bancos e instituições financeiras internacionais. Por essa razão, tinham as empresas produtivas que, para terem lucros, magros ou gordos, se arriscar também e fortemente no mercado financeiro. Os salários entraram numa rota de constante perda, e a fase econômica trouxe desemprego continuado (lembram que Porto Alegre chegou a ter 17% e Salvador 25% de taxa de desemprego? Lembram que os jovens não tinham emprego, nem perspectiva?).

O modelo era o de expansão financeira; o Estado se endividava e reendividava para pagar juros e para pagar o FMI (hoje, a gente nem pensa nisso!); o investimento corria lomba abaixo; o consumo, apesar do bom início do Plano Real, andou ralo e restrito no fim de 2002. Foi contra isso que Lula ganhou e Dilma tornou-se presidente. Contra as finanças, contra o baixo investimento – por sinal muito escasso, quase inexistente, naquele momento – em infraestrutura. Como se pode concluir, havia também pouca renda para o consumo. Estávamos metidos na loucura de ativos financeiros públicos e privados em jogo. A privatização veio com as ondas soltas dos leilões e até venderam a Vale do Rio Doce, uma empresa estatal altamente lucrativa. Felizmente, o povo se deu conta, e Lula ganhou.

A economia que avança

É contra o modelo da expansão financeira que o Brasil construiu uma política econômica que propõe como projeto nacional uma integração na dinâmica produtiva da economia mundial. Economia que se dirige para a 3ª Revolução Industrial. E a passagem da 2ª para esta 3ª é uma luta muito agressiva por causa da queima de capital dos setores perdedores. E é por isso que as economias estão em transição, e aquelas avançadas como os Estados Unidos, como as economias europeias, encontraram grande dificuldade para se afirmar. Pois passar da especulação financeira desbragada para a esfera produtiva é uma trajetória longa e extremamente difícil e obviamente ainda não terminada. O capitalismo é uma serpente sedutora, mas que leva tempo para mudar de pele.

Nesta nova etapa do capitalismo, o Brasil conseguiu se encaminhar, durante a crise financeira, para a esfera produtiva. Trata-se de um processo em andamento, que começou na crise de 2007, por meio de uma política econômica capaz de acelerar o consumo, procurando ganhar tempo para refazer o investimento. A gente percebe uma dinâmica intermitente, por causa dos altos níveis dos financiamentos, da limitação dos recursos do setor público, sobretudo nos projetos de infraestrutura, indispensáveis para uma outra etapa da economia.

E todo o esforço do governo Dilma foi manter a direção da economia brasileira nesse caminho. Dois pontos já foram conseguidos fundamentalmente. O primeiro, a integração do agrobusiness e da economia da mineração ao contexto internacional, sobretudo atendendo à demanda da China. E o segundo, o grande lance do setor do petróleo, onde o regime de partilha dá ao país rendas adequadas inclusive para utilizar a extraordinária produção do pré-sal. Esse é o grande passaporte do Brasil para o futuro. O futuro não é a especulação financeira, o futuro é a construção de uma economia produtiva ligada à 3ª Revolução Industrial. A economia liderada pelas Novas Tecnologias de Comunicação e Informação.

Se os setores citados já proporcionaram a entrada do Brasil na base da 3ª RI, o problema é avançarmos no desenvolvimento dos setores líderes, entrarmos fundo nas citadas novas tecnologias de comunicação (NTCI). E aponta-se aí um dos papéis do pré-sal: fornecer os recursos imprescindíveis para, via educação, alcançar a capacitação indispensável, o custo a pagar para a entrada no baile da contemporaneidade. Isso significa poder desenvolver inovações nos setores eletrônicos, e, no longo prazo, quem sabe até chegar a invenções de tecnologias novas. Penetrará o Brasil com força, seguindo esse rumo, numa nova etapa industrial.

É obvio que o Brasil participará, por causa de sua atividade produtiva, do reposicionamento de indústrias líderes da 2ª RI, como a indústria naval, como a indústria automobilística. Estes são setores que se encaixam em cadeias globais de valor. E são capazes de puxar toda uma composição industrial brasileira, por causa da exigência de conteúdo nacional, integrada na economia mundial.

E é claro que a política econômica terá que ter um desdobramento decisivo na construção e na reconstrução da infraestrutura do país (rodovias, ferrovias, hidrovias, portos, aeroportos, mobilidade urbana, saneamento básico, aeroportos, portos, etc. E principalmente, a infraestrutura eletrônica para que o país amplie a sua participação nas conquistas das NTCI).

E para que tudo isso possa se desenvolver é fundamental que a política econômica seja emanada da presidência do Brasil, com a subordinação do Banco Central ao projeto nacional. E com a presença do financiamento ativo e pujante dos bancos públicos BNDES, BB e Caixa. Não fica descartada, em nenhuma hipótese, a atuação dos bancos privados, mas limitados pela concorrência dos bancos públicos, com reflexos fortes sobre o nível da taxa de juros. Aliás como aconteceu com sucesso recentemente, desde 2007.

A escolha eleitoral

Diante de dois modelos, já testados no país, o leitor/eleitor pode fazer a sua opção: ou o retorno do carrossel financeiro ou o desenvolvimento produtivo integrado na 3ª RI. Qual é a sua opção? Esta é uma hora maior e um momento histórico dos mais graves. Sua opção poderá sustentar a maioridade material do nosso país. E com essa maioridade é que você poderá discutir e propor todos os temas do destino da saúde, da segurança pública, da educação e da cultura. Você acha que o carrossel financeiro vai trazer alguma melhoria de vida para a sociedade brasileira? Você acha que o Banco Central Independente e sua política financeira e sua política econômica derivada vão lhe trazer saúde, educação, cultura, segurança pública? Lembram da CPMF que era para resolver o problema da saúde e foi para resolver o déficit do Estado e pagamento de juros? Se você é muito jovem, estude o Brasil e veja o que aconteceu. Discuta muito, antes de votar. A democracia é o reino da discussão e do debate. Discuta para votar. E vote sem raiva, vote esclarecido, vote em cima da verdadeira questão: ou expansão das finanças ou desenvolvimento econômico produtivo. E vem junto um aviso de melhora: ainda há tempo para boas discussões!

*Economista


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