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20 de julho de 2011
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22:28

Teatro de Equipe agregou artistas de várias formações

Por
Sul 21
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Milton Mattos e Ivette Brandalise faziam parte da equipe do Teatro de Equipe, que aderiu à Legalidade l Foto: bobbahlis.blogspot.com

Lorena Paim

A atuação do Teatro de Equipe no movimento da Legalidade resultou da ampla mobilização de seus integrantes e de gente de fora que ali chegou para dar sua colaboração. A casa de espetáculos criada em 1958 já era um centro agregador em Porto Alegre, reunindo não apenas a classe teatral, como também o pessoal das artes plásticas, da música, arquitetos e intelectuais. Entre eles, Bruno Kiefer, Xico Stockinger, Glênio Bianchetti, Carlos Scliar.

O arquiteto Milton Mattos e a jornalista Ivette Brandalise participaram dos acontecimentos de agosto de 1961, como integrantes do Teatro de Equipe — do qual ele foi um dos fundadores. Além de encenar espetáculos, o local era palco para laboratórios, debates, conferências, abrindo o leque para diversas manifestações. “Havia um movimento permanente de influência na vida da cidade”, dizem.

Mattos conclui que, diante desse quadro, a formação do Comitê dos Artistas e Intelectuais Pró-Legalidade foi espontânea. “Em 24 horas nos mobilizamos. Já fazíamos um teatro engajado, com objetivo de que funcionasse também politicamente, não apenas como lazer. Queríamos, pretensiosamente, fazer algo que pudesse interferir no país”, analisa. “Por isso, quando Brizola levantou-se em defesa da Legalidade, interrompemos o espetáculo que fazíamos, a peça O Despacho, e instalamos o comitê”. Segundo Ivette, “foi automático” o engajamento.

Logo que foi transmitido o anúncio pelo rádio de que estavam abrindo o Comitê, começaram a chegar voluntários ao prédio situado na Rua General Vitorino, no Centro — inclusive radioatores que, até então, não faziam parte do grupo habitual de frequentadores. O Comitê começou a funcionar como núcleo de resistência, cumprindo, também, tarefas específicas: a produção de desenhos, faixas, cartazes, slogans para a Legalidade. Tudo de acordo com a aptidão de cada colaborador. “No camarim dos homens, ficavam os intelectuais, que faziam os slogans e textos de chamamentos; no camarim das mulheres, aqueles que confeccionavam faixas e cartazes”, lembra Ivette.

"No camarim dos homens, ficavam os intelectuais, que faziam os slogans e textos de chamamentos" l Foto: coletiva.net

Ivette diz que muitas pessoas levavam lanches e bebidas para alimentar os artistas, já que a maioria dormia no próprio Teatro. Como obter gasolina era um problema, naquele período, o ator Paulo César Pereio e outros colegas saíam para a rua e pediam a ajuda de motoristas que passavam. Pereio puxou tanta gasolina com uma mangueira que, certa vez, ficou “de porre”, afirma Mattos.

Os contatos dos coordenadores do Comitê com o Palácio Piratini eram os jornalistas Josué Guimarães e Hamilton Chaves (chefe de Imprensa do Governo). Como morava perto da sede do Governo, quando ia em casa tomar banho Ivette levava o material produzido no Teatro e, de volta, buscava alguma requisição de trabalho. “Esse serviço, fazia indo de carona em uma Lambretta”.

Inscrição de voluntários

Quando correu a notícia de que haveria bombardeio contra o Palácio, Milton Mattos estava no prédio, juntamente com dirigentes de outros comitês. Segundo ele, os diretores aguardariam ordens vindas do Piratini sobre como agir. Ele carregava seu revólver calibre 48. “Lembro de Josué Guimarães; cada um de nós estava em uma janela, armado. Como o anunciado bombardeio demorava, Josué foi até o porão, onde ficavam a rádio e a imprensa, e ficou sabendo que os sargentos estavam sabotando os aviões na Base Aérea de Canoas, para que não voassem. Foi um alívio”. Ivette recorda que, enquanto isso, no Teatro de Equipe, surgia a seguinte dúvida, exposta por alguns participantes: “é mais seguro para todos ficarmos no andar de cima ou no porão?”

Josué Guimarães: portador de uma boa notícia l Foto: paginadogaucho.com.br

Em uma mesa colocada no Teatro para a inscrição de voluntários, ficava o artista plástico Léo Dexheimer. Era encarregado de registrar o nome, dados como endereço e telefone e, importante, indagar se possuía arma. O objetivo era que cada comitê instalado tivesse um grupo armado. “Foi quando viu um velhinho entrando para se inscrever. Perguntou se ele possuía arma e se sabia usar, se tinha experiência, enfim. Tenho, sim, fiz a Guerra Civil Espanhola contra Franco, respondeu o senhor. Que recomendação! Era o já renomado escritor gaúcho Dyonélio Machado, autor de Os Ratos, militante comunista, que havia, efetivamente, lutado contra a ditadura franquista”, conta Mattos.

Avaliação sobre a vitória

"Em 61, Brizola era o Lula que nós tínhamos”, afirma Milton Mattos l Foto: Acervo Fotográfico do Museu da Comunicação Hipólito José da Costa

Depois do apoio do comandante do III Exército à causa da Legalidade, Mattos e Ivette dizem que o movimento ganhou mais força, pois era hora de divulgar também para outros estados a mobilização pela posse do vice-presidente João Goulart, o qual estava em viagem ao exterior. Um dos meios de propagação das ideias foi o Hino da Legalidade, composto por Lara de Lemos e Paulo César Pereio. “Um momento emocionante foi quando Brizola apareceu na sacada para falar ao povo, uma multidão que se aglomerava em frente ao Palácio. Glênio Peres colocou no alto-falante o som da Rádio da Legalidade e todo mundo cantou o Hino, isso três dias depois de ele ter sido composto”, diz Mattos. A música era tocada como prefixo sempre que Brizola ia discursava pela Cadeia da Legalidade e também no momento do encerramento da fala. Isso facilitou a sua memorização por todos. Até algumas emissoras do Rio de Janeiro tocavam o Hino.

Logo após o término da Legalidade, com a posse de João Goulart na presidência da República, houve decepção. Explica Milton Mattos: “Fomos traídos, com a adoção do parlamentarismo. Tínhamos a sensação de dever cumprido, mas sem o desfecho que esperávamos. Mais tarde, analisando a Legalidade, acredito que funcionou a Revolução Farroupilha que está em cada um de nós e onde não houve vitória. Em 1961, me julguei derrotado, mas depois vi que foi uma vitória monstruosa, na qual enfrentamos o País outra vez. Mais tarde, assistimos à formação de um partido novo na década de 70, o PT. Em 61, Brizola era o Lula que nós tínhamos”.


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