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6 de junho de 2011
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01:44

Lott liderou posição antigolpe entre os militares em 61

Por
Sul 21
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Lott, com Jango, em campanha pela presidência da República, em 1960 - Foto: CPDOC/FGV

Lorena Paim

O manifesto lançado pelo marechal Henrique Batista Duffles Teixeira Lott um dia após a renúncia de Jânio Quadros não foi um gesto intempestivo ou surpreendente. A atitude era coerente com uma longa trajetória profissional e política. Conhecido por sua posição em favor do nacionalismo e da ordem, ele foi o primeiro militar a sair publicamente em defesa da posse do vice João Goulart no lugar do presidente que abandonava o cargo.

O mineiro Lott havia sido ministro da Guerra em duas ocasiões: no governo de Café Filho e no de Juscelino Kubitschek. Em relação a este último, em 11 de novembro de 1955, conseguiu evitar o contragolpe militar que estava sendo tramado contra a posse de JK e de seu vice João Goulart. A partir desse episódio, seu nome foi sempre associado ao nacionalismo e à legalidade democrática. Ganhou popularidade e respeito. A tal ponto de, em 1960, ter sido candidato à presidência da República (pelo PSD-PTB), sendo derrotado por Jânio Quadros. O vencedor fez 48,3% dos votos, enquanto o marechal obteve 26%.

Lott não tinha pendores políticos nem para o jogo de bastidores; era um homem de caserna, um oficial e um ministro que foi responsável indiretamente pela politização dos subalternos das Forças Armadas. Quando ministro da Guerra, garantiu a estabilidade que os sargentos ainda não possuíam dentro do Exército e promoveu mudanças no quadro de oficiais. Com isso, novas forças emergiram na vida política e teriam sua importância evidenciada nos anos seguintes.

Agosto de 1961 chegou com a inesperada renúncia de Jânio e a pronta reação por parte do governador do Rio Grande do Sul. Leonel Brizola, entre os inúmeros telefonemas buscando respaldo, falou com Lott que, do Rio de Janeiro, o aconselhou a buscar apoio em chefes militares nacionalistas locais. No caso, os generais do Exército Oromar Osório, comandante em Santiago, e Peri Bevilacqua, em Santa Maria.

Manifesto leva marechal à prisão

Lott com Jango: marechal foi o primeiro militar a defender a posse do vice-presidente - Foto: Reprodução

O marechal, que já estava na reserva, dividia seu tempo entre a Serra fluminense e seu apartamento em Copacabana, no Rio de Janeiro. Mas não deixava de acompanhar a situação política nacional. Após o contato telefônico com Brizola, recorreu ao ministro da Guerra, Odílio Denys, a quem pregou a necessidade de se preservar a ordem constitucional em meio à crise. Como não obteve respaldo, redigiu, em 26 de agosto, um forte manifesto, que foi transmitido pelas emissoras de rádio do Rio Grande do Sul e reproduzido rapidamente em todo o País, pois havia censura à imprensa no Rio de Janeiro:

“Aos meus camaradas das Forças Armadas e ao povo brasileiro.

Tomei conhecimento, nesta data, da decisão do Senhor Ministro da Guerra, Marechal Odílio Denis, manifestada ao representante do governo do Rio Grande do Sul, deputado Rui Ramos, no Palácio do Planalto, em Brasília, de não permitir que o atual Presidente da República, Sr. João Goulart, entre no exercício de suas funções, e ainda, de detê-lo no momento em que pise o território nacional.

Mediante ligação telefônica, tentei demover aquele eminente colega da prática de semelhante violência, sem obter resultado. Embora afastado das atividades militares, mantenho um compromisso de honra com a minha classe, com a minha pátria e as suas instituições democráticas e constitucionais. E, por isso, sinto-me no indeclinável dever de manifestar o meu repúdio à solução anormal e arbitrária que se pretende impor à Nação.

Dentro dessa orientação, conclamo todas as forças vivas do país, as forças da produção e do pensamento, dos estudantes e intelectuais, dos operários e o povo em geral, para tomar posição decisiva e enérgica no respeito à Constituição e preservação integral do regime democrático brasileiro, certo ainda de que os meus camaradas das Forças Armadas saberão portar-se à altura das tradições legalistas que marcam sua história no destino da Pátria.”

Em função deste manifesto, Lott foi imediatamente preso, acusado de subversão, por determinação do Ministério da Guerra, e conduzido à fortaleza de Laje, no Rio de Janeiro. A pena: prisão de 30 dias (dos quais cumpriu 15). Nessa ocasião, inclusive, o marechal fez questão de que fosse cumprida a hierarquia militar. Estava em seu apartamento em Copacabana, com a família, quando chegaram militares para prendê-lo. Lott recusou-se a ser detido por um oficial de patente inferior à sua. Aguardou a chegada do marechal Nilo Sucupira, para finalmente sair.

Na frente do apartamento, pessoas se aglomeravam para vê-lo. Acenaram, cantaram o Hino Nacional e saudaram a posição adotada pelo “Marechal da Legalidade”. Lott saiu com traje civil e, respondendo a uma pergunta, disse que sua farda estava “enodoada”. Depois de solto, continuou se declarando pela Legalidade. Seu apoio, naquele período em que a situação nacional era crítica, foi valioso para reforçar a tese de que a solução deveria vir pela via constitucional.


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