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16 de junho de 2011
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22:41

Franklin Martins: movimento inspirou composições de Zé Kéti e Juca Chaves

Por
Sul 21
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Franklin Martins: em casa, respirava política. Seu pai, Mário Martins, renunciou ao mandato de deputado federal l Foto: Política Livre

Nubia Silveira

Ex-ministro da Comunicação Social, o jornalista Franklin Martins há muito tempo se dedica a relacionar músicas que falem sobre política e contem um pouco da história da República brasileira. O trabalho, ou hobby, que ficara abandonado, no tempo em que foi ministro do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, voltou, agora, na seção Som na Caixa de seu site Conexão Política. Ele também prepara um livro sobre o tema. O primeiro volume abrangerá o período que vai da proclamação da República ao golpe de 1964. Em suas pesquisas, Franklin encontrou, além do Hino da Legalidade, outras duas composições inspiradas no movimento de resistência ao golpe pretendido pelos ministros militares, em 1961: o Samba da Legalidade, de Zé Kéti e Carlos Lyra, e a modinha Legalidade, de Juca Chaves.

Capixaba, criado no Rio de Janeiro, o jornalista, apesar da pouca idade que tinha – 13 anos – quando Jânio renunciou, viveu intensamente a luta pela posse do vice-presidente João Goulart. Ele era aluno do Colégio Pedro II, onde cursava o 3º ano do antigo Ginásio. Era um menino politizado, preocupado com o que ocorria no Brasil. A política era tema permanente em sua casa. O pai – Mário Martins, também jornalista – havia renunciado, no início de 1961, ao mandato de deputado federal, que conquistara pela UDN do estado da Guanabara. Não concordava com as atitudes adotadas pelo partido. Mário voltou ao Jornalismo. Assumiu a direção do jornal carioca A Noite, que fora um sucesso nas décadas de 20 e 30.

Mário, lembra o filho, “se insurgiu contra a tentativa de golpe”. A Noite saiu na defesa da posse de Jango. O governador da Guanabara, Carlos Lacerda (UDN), tão inimigo de João Goulart quanto fora do presidente Getúlio Vargas, colocou o jornal sob censura. “Na minha casa vivemos intensamente a resistência”, afirma Franklin, que vai lembrando rapidamente todos os fatos que marcaram aqueles dias de 25 de agosto a 7 de setembro de 1961. “O Brizola se levantou no Sul, o III Exército aderiu e, a partir daí, houve uma resistência forte em outros estados. Mauro Borges, governador de Goiás, foi um dos que não aceitou a posição dos chefes militares”.

Terceira tentativa fracassada de golpe

Franklin ressalta que, em 1961, pela terceira vez, desde 1945, os militares tentavam dar um golpe. O primeiro foi contra Getúlio, que acabou se suicidando, na manhã do dia 24 de agosto de 1954, em seu quarto no Palácio do Catete, no Rio de Janeiro. O segundo foi quando tentaram impedir a posse de Juscelino Kubitschek. “Esta terceira tentativa foi abortada pela resistência popular. O governador Leonel Brizola teve um papel importante. E a Cadeia da Legalidade, escutada em ondas curtas, foi criando no país um ambiente de resistência ao golpe”, afirma o jornalista.

Os brasileiros aprenderam que o melhor é resolver seus problemas num ambiente democrático, diz Franklin l Foto: Notícias da TV Brasileira

Um fato marcante na movimentação pela posse de Jango foi a prisão do marechal Henrique Texeira Lott, que divulgou um manifesto, em favor da constitucionalidade. “O ministro do Exército, marechal Odílio Denys, que mandou prender Lott, era o mesmo que, em novembro de 1955, como comandante do I Exército (Zona Militar do Leste), pediu-lhe que se insurgisse contra os que não queriam dar posse a JK”.

A quarta tentativa de golpe, em menos de 20 anos, teve sucesso. Em 1964, quando os militares depuseram João Goulart, Franklin já trabalhava em Jornalismo e militava no movimento estudantil. Três anos depois, foi eleito secretário-geral do Diretório Acadêmico da Faculdade de Ciências Econômicas da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e vice-presidente da União Metropolitana dos Estudantes. No ano seguinte, como presidente do Diretório Central dos Estudantes da UFRJ, foi preso em Ibiúna, no interior de São Paulo, durante o Congresso da UNE. Libertado por um habeas corpus, entrou na luta armada. Integrou o grupo formado por militantes da Ação Libertadora Nacional e do Movimento Revolucionário 8 de Outubro, que sequestrou o embaixador americano Charles B. Elbrick. Viveu exilado em Cuba e no Chile. Pouco antes da morte de Salvador Allende, no golpe liderado pelo general Augusto Pinochet, que assumiu a presidência do Chile, Franklin voltou ao Brasil, onde viveu clandestinamente. Em 1974, voltou a exilar-e. Desta vez, na França. Retornou à clandestinidade três anos depois. Viveu escondido até 1979, quando foi promulgada a anistia.

A revolta dos conservadores, analisa o jornalista, começou quando sentiram que não venceriam na democracia. A volta de Getúlio Vargas pelo voto mostrou isso. O povo passou a participar das decisões política e o crescimento do eleitorado foi “assombroso”. Registrou-se, também, um grande crescimento do PTB no Congresso. Diz Franklin: “Nas eleições parlamentares de 1945, o PSD conquistou 151 cadeiras na Câmara dos Deputados, caindo para 112 em 1950 e se mantendo nesse patamar daí em diante (114 deputados em 1954, 117 em 1958 e 118 em 1962). A UDN tampouco experimentou oscilações notáveis. Elegeu 77 deputados em 1945, 81 em 1950, 74 em 1954, 70 em 1958 e 91 em 1962. Já o PTB em menos de vinte anos multiplicou por cinco seus assentos na Câmara: 22 em 1958, 51 em 1950, 56 em 1954, 66 em 1958 e 116 em 1962. Ou seja, a crescente incorporação dos trabalhadores à vida política nacional produziu concomitantemente um notável fortalecimento do PTB.”

Respeito à Constituição, marca da Legalidade

Para Franklin Martins, a grande característica do movimento liderado por Leonel Brizola foi o respeito à Constituição. Essa bandeira já seria suficiente, segundo ele, para a vitória da Legalidade. Mas, ressalta, à defesa da Constituição se somaram a firmeza de Brizola e a adesão do comandante do III Exército, general Machado Lopes. Franklin está certo de que se os militares conseguissem dar o golpe em 1961 haveria uma guerra civil no Brasil. “O golpe só poderia ser dado de surpresa”.

Ao analisar o golpe vitorioso de 1964, o jornalista diz que os 20 anos de ditadura “fizeram a sociedade brasileira amadurecer”. Segundo ele, “o país aprendeu que é melhor resolver seus problemas num ambiente democrático”.

As composições inspiradas na Legalidade

Franklin Martins enviou ao Sul21 as músicas relacionadas à Legalidade.

“Hino da Legalidade” (1961).
Autor: Lara Lemos. Intérprete: Paulo César Pereio. Gravação especial

Este hino abria as transmissões da Cadeia da Legalidade, formada a partir da emissora que funcionava no próprio Palácio Piratini, que convocava o povo a resistir ao golpe militar contra a posse de Goulart.

“Avante brasileiros de pé,
Unidos pela liberdade,
Marchemos todos juntos com a bandeira

Que prega a igualdade

Protesta contra o tirano
Recusa a traição
Que um povo só é bem grande
Se for livre sua Nação”.

LEGALIDADE – HINO DA LEGALIDADE by Nubia Silveira

“Samba da Legalidade” (1961).
Autores: Zé Kéti e Carlos Lyra. Intérpretes: Idem. Gravadora: ?

A Campanha da Legalidade logo deu o mote para outras músicas, como este samba de Zé Kéti e Carlos Lyra, que, nos anos seguintes, se destacariam como compositores engajados – como se dizia na época.

“Dentro da legalidade,
Dentro da honestidade,
Ninguém tira o meu direito.

Quando querem a anarquia,
Elimino a teimosia,
Mostrando todo defeito.
Se o samba está errado,
Eu não vou ficar calado,
Consertando a melodia.
Sou poeta popular.
Dentro da honestidade,
Ninguém pode me calar.

Eu não sou politiqueiro
Meu negócio é um pandeiro
Dentro da legalidade
Sou poeta popular
Dentro da legalidade
Ninguém pode me calar

Laiá, laiá, laiá, laiá
Laiá, laiá, lalá, laiá, laiá”

LEGALIDADE – SAMBA ZE KETI by Nubia Silveira

“Legalidade”(1961). Modinha
Autor: Juca Chaves. Intérprete: Idem. Gravadora: RGE

Constituição, constituição
Acabou-se que tormento
Já temos o parlamento
Falta o rei, que papelão.

Que papelão, que papelão
O canhão foi superado,
Pois Brizola, com Machado
Foi fazer revolução.

Revolução, revolução
Foi as armas, o gaúcho
O Lacerda deu o repuxo
E o Denys ficou na mão.

Ficou na mão, ficou na mão
Pois prendia todo mundo
O regime foi pro fundo,
Marechal foi pra prisão.

Foi pra prisão, foi pra prisão
E o Brizola nem deu bola,
O Jango botou cartola
E acabou a revolução.

E viva a Constituição!

LEGALIDDE – MÚSICA JUCA CHAVES by Nubia Silveira


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