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9 de junho de 2011
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20:31

Com a requisição da Rádio Guaíba é formada a Rede da Legalidade

Por
Sul 21
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Brizola requisita a Rádio Guaíba e forma a Cadeia da Legalidade, nos porões do Palácio - Foto: Acervo Fotográfico do Museu da Comunicação Hipólito José da Costa

Lorena Paim

Às 3h da madrugada do dia 27 de agosto de 1961, o governador Leonel Brizola fala pelo rádio. Denuncia o golpe que se preparava contra o vice-presidente João Goulart, o seu cunhado Jango, e pede mais mobilização. O Ministério da Guerra silencia as emissoras de Porto Alegre. Ao meio-dia, Leonel Brizola requisita a Rádio Guaíba e, em menos de uma hora, os transmissores são transferidos para os porões do Palácio Piratini. A Rádio Guaíba passa a liderar uma rede de 104 emissoras gaúchas, catarinenses e paranaenses, a Cadeia da Legalidade, que transmite as mensagens do governador.

Este resumo, feito pela revista do PDT/RS em 2004, diz também como surgiu a ideia de usar o rádio, o veículo de maior alcance na época, para espalhar a tese da Legalidade e arregimentar simpatizantes para a causa, em todo o Brasil e até mesmo fora do país. Era o terceiro dia da crise após a renúncia de Jânio Quadros e os militares ameaçavam com a prisão de João Goulart, assim que ele regressasse do exterior.

Um depoimento deixado por Hamilton Chaves, o assessor de Imprensa do governo Brizola em 1961, revela que após a divulgação do manifesto do marechal Lott, em defesa da posse de Jango, pelas emissoras de rádio de Porto Alegre, uma a uma elas foram sendo fechadas por ordem do Exército. A divulgação era feita como matéria paga, a pedido do governador, que incluía declarações suas como adendo às palavras de Lott. Pregavam a necessidade de dar posse ao sucessor legal de Jânio.

Naquele pronunciamento pelo rádio, na madrugada de domingo, 27 de agosto, Brizola enfatiza: “Nós, que governamos o Rio Grande do Sul, não aceitaremos quaisquer golpes. Não assistiremos passivamente quaisquer atentados às liberdades públicas e à ordem constitucional. Reagiremos como estiver ao nosso alcance. Nem que seja para sermos esmagados. Mas defenderemos a nossa honra e as nossas tradições. A Constituição do país tem que ser respeitada”.

Risco de isolamento

Hamilton Chaves, entre Brizola e Zé Geraldo: o jornalista alertou o governador sobre o possível isolamento - Foto: Reprodução

Hamilton Chaves ponderou com Brizola que, com a intervenção nas emissoras, eles corriam o risco de ficar isolados no Palácio Piratini, sem ter meios de comunicar o golpe que vinha sendo preparado contra a posse de Jango. Rapidamente, ainda conforme o relato do jornalista, o governador decidiu requisitar a Rádio Guaíba, que ainda estava no ar, por não ter transmitido o manifesto de Lott, no objetivo (conforme o ofício de requisição redigido pelo secretário da Justiça Francisco Brochado da Rocha) de “preservar a autonomia do Estado” e com a finalidade precípua de “assegurar a ordem pública”.

Nas páginas do Diário Oficial do Estado daquele período, a referência que se encontra, em termos de atos oficiais sobre a Legalidade, é o Decreto nº 12618, de 30 de agosto de 1961, que prevê a abertura de crédito extraordinário. O texto diz que é aberto, no gabinete do Governador, um crédito extraordinário de Cr$ 25.000.000,00 (vinte e cinco milhões de cruzeiros) destinados a atender a quaisquer despesas urgentes e imprevistas decorrentes da situação de emergência atual, cuja gravidade admite a previsão de possibilidade de perturbação da ordem pública. Assinam Leonel Brizola e nove secretários de Estado.

A Folha da Tarde (do mesmo grupo da Rádio Guaíba, a Companhia Caldas Jr.) publica na edição de 28 de agosto de 1961, segunda-feira, notícia com o título: “Rádio Guaíba requisitada pelo governo do Estado”. Diz que a direção da emissora havia recebido, em mãos, por volta do meio-dia de domingo, um ofício assinado pelo governador Leonel Brizola comunicando que, a partir daquele momento, a Rádio Guaíba passava à disposição da Secretaria da Segurança Pública. Segundo o jornal, o ofício acrescenta que a emissora passaria a ser operada diretamente da sala de Imprensa do palácio Piratini, determinando-se que, para este fim, fosse estabelecida ligação direta entre a sede do governo e o transmissor da rádio, na Ilha da Pintada, além da instalação do microfone e do equipamento de controle no Palácio do Governo. Uma foto mostra soldados armados dentro do prédio da Caldas Jr., para onde tinham ido com a disposição de fazer cumprir a ordem do governador.

A formação da Cidadela

Brigada Militar se posicionou para defender o Palácio Pirtini - Foto: Acervo Fotográfico do Museu da Comunicação Hipólito José da Costa

A transformação do Palácio Piratini na Cidadela da Legalidade, como denominou Brizola, estava consolidada. A multidão já tomava a Praça da Matriz, em frente à sede do governo. Durante todo o domingo, políticos e líderes da sociedade civil chegavam ao Palácio para expressar solidariedade a Brizola. Nesse dia começou a distribuição de armas à população. A Brigada Militar já havia tomado posição, com homens armados e barricadas. Enquanto isso, o cotidiano mais ameno em Porto Alegre era afetado, com a suspensão do Grenal marcado para aquele domingo, diante da gravidade dos acontecimentos. Estava previsto, até, que o presidente Jânio Quadros (agora ex) daria o pontapé inicial no jogo decisivo do primeiro turno do Campeonato Gaúcho.

No domingo à noite, Brizola concedeu entrevista aos jornalistas, transmitida pela Rádio Guaíba, transformada em emissora oficial do estado, diretamente dos porões do Piratini (sala de imprensa localizada no subsolo do prédio).


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