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2 de junho de 2011
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00:39

Apoio mais importante entre os governadores veio de Goiás

Por
Sul 21
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Mauro Borges, ao lado de Juscelino Kubitschek: primeiro governador a apoiar a Legalidade

Lorena Paim

Leonel Brizola teve em um colega do Centro-Oeste a adesão mais efetiva ao movimento da Legalidade, entre todos os governadores do País. Mauro Borges, governador de Goiás pelo PSD e tenente-coronel do Exército, logo aderiu à causa e mobilizou as forças de seu estado, embora contasse com poucos recursos militares. Ultrapassou o mero discurso e partiu para a ação, baseado no preceito de seguir a Constituição. O próprio Brizola conta que a maioria dos governadores em 1961 “tergiversou” assim que ele pediu apoio. Mas, quando a situação já estava mais clara, muitos governantes também defenderam a Legalidade.

O único a se manifestar frontalmente contrário foi Carlos Lacerda (UDN), da Guanabara, que ordenou prisões e censura à imprensa. Nos contatos telefônicos que começou a fazer logo após a renúncia de Jânio, Brizola lembra: “Conseguimos falar com o governador Carvalho Pinto, de São Paulo. Encontrei-o frio e desinteressado, nenhuma resistência ao golpe”.

Quanto a Mauro Borges, nada foi combinado entre ele e Brizola. O goiano estava em São Paulo por ocasião da renúncia e chegou a se encontrar com Jânio, na tentativa de fazê-lo mudar de ideia. Estavam juntos, na ocasião, os governadores do Paraná, Minas Gerais, Piauí e Espírito Santo. Conforme o livro Brizola, da Legalidade ao Exílio (de Dione Kuhn), quando soube da manifestação dos ministros militares contra a posse do vice João Goulart, Borges começou a anotar as ideias para um plano de mobilização de seu estado. Nele constavam o esclarecimento da população por meio de comunicados em rádios e jornais e o preparo da defesa de Goiânia com ou sem a colaboração do Exército.

Voluntários e armas

Rede da Legalidade: rádio de Goiás foi uma das primeiras a aderir - Foto: Arquivo Museu de Comunicação Hipólito José da Costa

A primeira comunicação pela Rede da Legalidade foi quando Brizola, em Porto Alegre, leu o manifesto de Borges enaltecendo a “resistência legalista, democrática e patriótica”. A fala foi retransmitida pela Rádio Brasil Central. A emissora de Goiânia foi ocupada pela Polícia Militar e passou a ser operada diretamente sob o comando do governador. Com medo de interceptação das comunicações, este enviou emissários ao Rio Grande do Sul, para tratar dos preparativos para a resistência. O governador ainda se ofereceu para proporcionar o desembarque de João Goulart em Goiânia, caso isso não fosse possível em Brasília (levando-se em conta que a capital federal fica no território de Goiás).

O que Borges não dispunha em poderio militar e apoio das guarnições, sobrava em entusiasmo popular. Ele dizia contar com 40 mil voluntários, em caso de ser deflagrada uma guerra civil. Revistas ilustradas da época, como Manchete, mostram o entusiasmo do governador goiano “que em 48 horas organizou uma brigada de 10 mil homens”, além de ter confiscado armas para distribuí-las entre a população e de promover rápidos cursos de guerrilha. No grupo Maria Quitéria, organizavam-se as mulheres da Legalidade, lideradas pela primeira-dama Lourdes.

Alguns deputados estaduais cogitaram transferir todo o Senado e a Câmara de Brasília para Goiânia, diante do temor de fechamento do Congresso na capital federal. E ofereceram um teatro da cidade para a eventual instalação do Legislativo. O deputado Neiva Moreira deixou num depoimento, que está no livro A Rebelião da Legalidade (de Vivaldo Barbosa): “Um grupo de 100 deputados decidiu aceitar a oferta. Tivemos uma discussão ampla sobre a topografia da região. Teríamos guias para nos ajudar a superar as patrulhas militares, algumas vindas do Rio de Janeiro…”

Manifestações e reunião

Enquanto a organização em Goiás era palpável, em outros estados a situação era diferente. O paranaense Ney Braga, do PDC, também militar, lançou um manifesto pedindo a recondução de Jânio ao cargo. Sua atuação a seguir é dúbia. Na sessão do Congresso do dia 30, segundo publica a imprensa, o senador paranaense Oton Mader leu uma proclamação do governador Ney Braga dizendo que não se pronunciou pela posse de Goulart; que “apesar de seus insistentes telefonemas” não vinha falando com Brizola, “com cuja ação não se solidariza” e que confiava na posição do Congresso e dos chefes militares sobre a crise.

Ney Braga (E), governador do Paraná, pediu a recondução de Jânio ao cargo

Sobre a “estranha posição do governador Ney Braga”, Vivaldo Barbosa afirma que “ele não se engajou, pois era muito ligado a Carlos Lacerda e à UDN”. O autor considera esta postura contrária à do Exército no Paraná, sob a jurisdição do legalista III Exército, e à da prefeitura de Curitiba. Nesta capital, até mesmo, chegou a ser instalada uma Cadeia da Legalidade, transmitida diretamente da prefeitura e da Assembleia Legislativa.

Os jornais registram, em breve nota: “Preso o governador do Piauí”, seguindo-se a explicação: “O vice-governador do Piauí comunicou ao ministro da Guerra ter substituído na chefia do Executivo ao Sr. Chagas Rodrigues. Confirma-se, assim, a notícia da prisão daquele governador, após ter se manifestado favorável à posse do Sr. João Goulart”. Mais tarde, o Correio Braziliense, jornal de Brasília, divulga uma mensagem de Hibério Nunes, governador em exercício, dirigida ao ministro da Guerra. Nunes declara-se “substituto legal do governador do Estado que se encontra ausente” e acrescenta que o governo está “em perfeita harmonia com a guarnição federal, pela manutenção da ordem”.

No livro 1961- Que as armas não falem, os autores Paulo Markun e Duda Hamilton citam que uma das articulações políticas daquele período envolveria o impeachment do presidente e a eleição, por via indireta, do governador da Bahia, Juraci Magalhães. Este, respondendo aos jornalistas, declarou: “Rei morto, rei posto”. A frase não caiu bem e Juraci teve de lembrar seu passado em defesa da legalidade para evitar críticas.

Na noite de 31 de agosto, no Rio de Janeiro, reuniram-se com os ministros militares seis governadores: Carvalho Pinto (SP), Juraci Magalhães (BA), Magalhães Pinto (MG), Carlos Lindemberg (ES), Celso Peçanha (PA) e Cid Sampaio (PE), além de Carlos Lacerda (GB). Os representantes do Paraná e de Santa Catarina (Celso Ramos) chegaram quando o encontro já havia terminado. A interpretação sobre essa reunião é de que ela não foi conclusiva. Mais do que isso, talvez, mostrou que já havia sido fechado um consenso, que seria pela posse de João Goulart com o parlamentarismo.


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