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14 de abril de 2011
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00:46

A Aliança Liberal e a ascensão e queda do Estado Novo

Por
Sul 21
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Getúlio Vargas chega ao poder com a Revolução de 40 - Foto : Claro Jansson

Rui Felten

Tão logo recebeu a chefia do Governo Provisório do Brasil, em 11 de novembro de 1930, Getúlio Vargas arrebatou três segmentos políticos. O primeiro era composto pelas oligarquias rurais, que tinham perdido as rédeas do poder. A outra força era formada por oficiais adeptos do Tenentismo, movimento originário de uma rebelião fracassada para impedir a posse do mineiro Artur Bernardes em 1922. E a terceira era a dos militares legalistas, defensores da preservação da ordem, e contrários à corrente tenentista, considerada mais radical.

Sem manifestar preferência por nenhuma dessas correntes, mas procurando harmonizar diferenças, Getúlio não deixou, no entanto, de render concessões aos tenentes, recrutando entre eles interventores para os estados. Doze regiões, do Espírito Santo para o Norte, estavam, entre 1931 e 1932, sob a intervenção do tenente Juarez Távora, que passou a ser chamado, por isso, de vice-rei do Norte. Mas no final daqueles anos 30, foram os militares legalistas os mais valorizados por Vargas.

Juarez Távora, Getúlio Vrgas e Juracy Magalhães - Foto: Fundação Pedro Calmon

A transição política produzida pela Revolução de 1930, que instituiu a República Nova, começou a se definir quando o governo do paulista Washington Luís — o último presidente da República Velha — chegava ao final, no início da década. Ele estava comprometido com a continuidade da política “café com leite”, que revezava representantes das oligarquias de São Paulo (produtor de café) e de Minas Gerais (produtor de leite) no poder federal. Portanto, deveria indicar um mineiro para sucedê-lo. Mas em vez disso, optou por proteger a oligarquia dos fazendeiros do café e deu apoio a outro candidato paulista, Júlio Prestes. Com isso, entrou em conflito com o presidente do Estado de Minas Gerais, Antônio Carlos, que esperava ser o próximo governante do país.

Apoio dos tenentes

A traição de Washington Luís ao esquema de alternância no poder entre o Partido Republicano Paulista (PRP) e o Partido Republicano Mineiro (PRM) resultou no rompimento entre as duas siglas. Revoltado, Antônio Carlos aliou-se ao Rio Grande do Sul na criação da Aliança Liberal, de onde o gaúcho Getúlio Vargas saiu candidato a presidente da República em oposição a Júlio Prestes, tendo como vice o paraibano João Pessoa.

Identificados com a plataforma política da Aliança Liberal, os tenentes integraram-se aos que apoiaram o nome de Vargas. Essa nova vertente defendia o voto popular secreto (como proteção a fraudes), anistia política, leis que regulamentassem a jornada de trabalho e assistência ao trabalhador, além de estímulo à produção industrial.

Júlio Prestes terminou eleito em 1º de março de 1930, resultado com o qual se resignaram alguns líderes políticos, como Borges de Medeiros, mas não outros como Oswaldo Aranha e Lindolfo Collor, que tinham a concordância dos tenentes Juarez Távora e Miguel Costa.

Mudança de rumo

Membro da Aliança Liberal e governante da Paraíba desde 1928, João Pessoa foi assassinado em uma confeitaria onde se reunia com amigos, em julho de 1930. A conclusão foi de que o crime se deu por razões pessoais, e não políticas. De qualquer forma, esse acontecimento mudou o rumo da história. Em 3 de outubro, a legião de opositores a Júlio Prestes ampliou a revolta armada que se organizou no Rio Grande do Sul e se expandiu para Minas Gerais, Paraíba e Pernambuco. No Sul, as tropas eram comandadas pelo tenente-coronel Góis Monteiro. No Nordeste, pelo tenente Juarez Távora. Faltando só algumas semanas para encerrar o mandato, Washington Luís foi deposto, no Rio de Janeiro, pelos generais Mena Barreto e Tasso Fragoso e pelo almirante Isaías de Noronha, no dia 24 de outubro. Líder do movimento da Aliança Liberal, Getúlio recebeu a chefia do Governo Provisório em 11 de novembro.

ashington Luís - Foto: Arquivo Nacional do Brasil

Depois da vitória, ele foi ao Palácio do Catete fardado. E agiu rápido para garantir o controle total da situação política. Fechou o Congresso Nacional, as Assembleias Legislativas Estaduais e as Câmaras Municipais. Suspendeu os partidos políticos e a Constituição Republicana de 1891 e indicou os tenentes como interventores de estados. Vargas ficaria no poder pelos próximos 15 anos e teria pela frente uma era de muitas tensões, entre elas a Segunda Guerra Mundial, da qual o Brasil tomou parte com o envio de uma força expedicionária, em 1942.

O governo Vargas passou por uma Revolução Constitucionalista (1932), por uma nova Assembleia Constituinte (1934), que restaurou o Poder Legislativo, pela Intentona Comunista (1935) e promoveu, em novembro de1937, um novo fechamento do Congresso Nacional, impondo um cerco militar à Câmara Federal e ao Senado. Na noite do dia 10, anunciou ao país uma nova Constituição, agora não mais liberal como a promulgada em 1934 e inspirada no modelo fascista que vigorava na Polônia. Por isso, essa Constituição — elaborada pelo jurista Francisco Campos, que seria nomeado ministro da Justiça — foi apelidada de “Polaca”. Inaugurou-se, aí, o Estado Novo, um período de ditadura que durou até 1945.

Farsa do plano comunista

As condições para o golpe foram abertas a partir de uma farsa em que Vargas divulgou uma suposta armadilha comunista — o Plano Cohen — para assassinar personalidades, derrubar o governo e assumir o poder. O anúncio na imprensa foi feito pelo general Góis Monteiro. Com o risco comunista que parecia ameaçar o país, o Congresso acabou concordando com a declaração de estado de guerra solicitado por Vargas, que enfim conquistou a presidência da República.

O Estado Novo começou a desmoronar arrastado pelos efeitos democratizantes da Segunda Guerra Mundial, que estourou em 1939. Quando terminou, em 1945, havia criado um ambiente favorável ao pensamento democrático que não condizia com o getulismo. Como já tinha acontecido na Primeira Guerra (1914-1918), a luta entre nações teve origem na crise do capitalismo liberal e na insatisfação com as desigualdades sociais e entre países. Isso estimulou, de um lado, o desenvolvimento do socialismo, que defendia a igualdade social e o total controle do Estado sobre a economia e os indivíduos. De outro lado, emergiu a resistência fascista, que não pretendia extinguir o capitalismo, e sim protegê-lo, só que utilizando também o autoritarismo e sufocando as liberdades individuais. E de outro, ficaram os países que queriam manter o liberalismo econômico (sem interferência do Estado) e a democracia. O militarismo violento dos governos alemães finalmente e o nazifascimo de Hitler fizeram explodir a guerra.

Segunda Guerra Mundial - Foto: reprodução

No bloco dos defensores da democracia liberal, destacaram-se a França, Inglaterra e os Estados Unidos (as potências Aliadas). Itália, Alemanha e Japão (as potências do Eixo) reuniram-se na trincheira fascista. Venceram os Aliados. Os Estados Unidos transformaram-se no maior gigante capitalista. E a União Soviética virou uma fortaleza comunista. As duas potências monopolizaram as divergências mundiais pelas décadas seguintes — o período de Guerra Fria.

Deslocamento e contradição

Com a vitória da democracia liberal na Segunda Guerra, o Estado Novo de Getúlio ficou deslocado nesse ambiente libertário. Além disso, opositores dele apontavam uma contradição: os 23.334 soldados que integraram a Força Expedicionária Brasileira (FEB) foram mandados à Itália para se unir ao 5º Exército dos Estados Unidos e combater o fascismo, mas enquanto isso, o governo de Getúlio era marcado pelo autoritarismo.

Antecipando-se a essa tendência desfavorável a ele, Getúlio promoveu uma reformulação constitucional antes de a guerra terminar. Fundaram-se os partidos UDN (União Democrática Nacional), PSD (Partido Social Democrático), PTB (Partido Trabalhista Brasileiro), PSP (Partido Social Progressista) e PCB (Partido Comunista Brasileiro). Também foram marcadas eleições presidenciais para 2 de dezembro de 1945.

Getúlio declarava apoio ao general Eurico Gaspar Dutra (PSD/PTB), mas estava por trás de um movimento popular para que ele continuasse no governo — o Queremismo (ou “Queremos Getúlio”). Também contava com apoio do Partido Comunista e esperava ser aclamado em um comício no dia 27 de outubro, que não se realizou por impedimento da chefia de Polícia do Distrito Federal. Ainda tentou colocar o irmão dele, Benjamim Vargas, em seu lugar no comício, mas não deu certo. Dia 29 de outubro, foi forçado a entregar o governo ao Poder Judiciário.


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