Opinião
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26 de fevereiro de 2021
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10:33

Petrobras: nem Bolsonaro, nem o Mercado (por Luiz Fernando Mainardi)

Por
Sul 21
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Petrobras: nem Bolsonaro, nem o Mercado (por Luiz Fernando Mainardi)
Petrobras: nem Bolsonaro, nem o Mercado (por Luiz Fernando Mainardi)
Deputado estadual Luiz Fernando Mainardi (PT) (Foto: Guilherme Santos/Sul21)

Luiz Fernando Mainardi (*)  

Do primeiro do ano para cá, o preço da gasolina pago na bomba do posto já teve uma evolução de 34%. O Diesel subiu quase no mesmo nível. Outros produtos subiram também: o óleo de cozinha chegou quase a dobrar de preço nos últimos meses; a carne aumentou, o arroz está subindo, o preço da energia elétrica está em alta etc etc. Vivemos um descontrole inflacionário que deveria preocupar.

Mas o que mobilizou mesmo os comentaristas políticos e econômicos na grande mídia foi a decisão de Bolsonaro de interferir na gestão da Petrobras. Um escândalo segundo o “mercado”, repetem os analistas. Bolsonaro, evidentemente, agiu, como sempre, de forma grosseira, rude, atabalhoada, contraditória. Ao mesmo tempo em que troca o presidente da estatal – colocando mais um general em um alto posto do Estado –, repete o compromisso com a mesma política de preço que vem sendo praticada na Petrobras nos últimos anos.

Ocorre que o gerador do atual ciclo de aumentos nos combustíveis está relacionado não com a pessoa do atual presidente da estatal, mas com a política que está sendo desenvolvida. Se não mudar a política, nada mudará. E assim segue a vida sob Bolsonaro. Ele age como um ilusionista para a sua plateia, fazendo de conta que muda a realidade, sem, entretanto, mudar qualquer coisa. Com general ou sem general, se a política de preços continuar a mesma, o ciclo de aumentos continuará.

A principal oposição à atitude de Bolsonaro veio do chamado Mercado, esta eminência desconhecida que tem até mesmo, como se sabe, uma mão invisível, vejam só, quase um super herói. A empresa perdeu algo em torno de U$ 100 bilhões em “valor de mercado”. Analistas mais racionais reconheceram ali nesse movimento o que se chama de Overshooting, uma reação exagerada com objetivos específicos; especulação, em bom português. Caso se confirme, significará lucros significativos para alguns poucos agentes, notadamente Fundos Internacionais e mesmo grandes investidores brasileiros, que negociam e enriquecem com o “valor de mercado” da nossa principal empresa pública.

O problema fundamental de Bolsonaro e do Mercado é que pretendem desvirtuar (desde o golpe contra Dilma) o sentido estratégico da Petrobras para o país. Para estes agentes políticos e econômicos, o ativo Petrobras só vale como instrumento de lucro. Os que apostam, inclusive, nesta política volátil de preços, visam, basicamente, lucros no curto prazo, como já explicou o ex-presidente Sergio Gabrieli, em artigo que se encontra neste endereço, em que explica que uma política de blindagem dos preços internos à volatilidade do câmbio e do preço internacional reverte em valorização do ativo no longo prazo.

O que interessa é que a política de preços “voltada para o mercado” desenvolvida pelos hiperliberais na gestão da Petrobras se fundamenta em uma visão que garante primazia do interesse privado sobre o público. Ninguém explica por que precisamos manter uma política de preços vinculadas aos preços internacionais se produzimos, refinamos e distribuímos com custos em real. A política atual na formação dos preços está submetida à necessidade de garantir lucro para os investidores e não o abastecimento e a autonomia energética, como tem sido a missão da Petrobras desde a sua fundação.

A “disputa” pela Petrobras, que envolve agentes externos e internos (não é o objetivo deste artigo, mas é muito importante analisar as relações da Lava Jato com os interesses internacionais sobre a cadeia do petróleo no Brasil), ganhou maior relevância a partir da descoberta das jazidas do pré-sal. Descoberto no governo Lula, através de investimentos e desenvolvimento tecnológico da própria companhia, o pré-sal responde, atualmente, por uma produção de quase 3 milhões de barris/dia, o que garante, com certeza, autonomia energética para o Brasil e o coloca entre as nações com alta capacidade exportadora do produto. Isso, evidentemente, gera redimensionamentos geoestratégicos que preocupam os países centrais, mesmo com a crescente transição de matriz energética que vivemos.

Dentro deste contexto, o enfraquecimento da Petrobras e a sua subordinação ao capital internacional é um movimento fundamental para uma estratégia de re-subordinação do Brasil. Ocorre que isso acaba por impactar o mercado interno, já que a estatal deixa de cumprir um papel como instrumento de desenvolvimento. É a partir desta realidade que se explica a venda das refinarias, instrumentos fundamentais para a garantia de produtos derivados mais importantes, como a gasolina e o diesel. Sem as refinarias, a Petrobrás rompe com a estratégia de “empresa integrada”, que vinha sendo desenvolvida pelos governos anteriores ao golpe de 2016 e que permitia uma regulação muito mais eficaz na relação custo e preço dos combustíveis no mercado interno.

A solução, portanto, para o atual problema na formação de preços dos combustíveis não é a troca de presidente da empresa, não é a isenção de impostos (um discurso mistificador dos hiperliberais sobre todos os problemas do Brasil) e nem mesmo algum tipo de tabelamento, mas a reorientação estratégia da estatal, que deve, além de ser uma empresa forte e estável, como sempre foi, cumprir um papel de ancorar o desenvolvimento brasileiro a partir da exploração racional e sustentável dessa enorme riqueza mineral que possuímos.

(*) Vice-líder da bancada do PT na Assembleia Legislativa do RS

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As opiniões emitidas nos artigos publicados no espaço de opinião expressam a posição de seu autor e não necessariamente representam o pensamento editorial do Sul21.


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