Opinião
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10 de dezembro de 2020
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11:21

Pela rejeição do PLE 036/2019 pela Câmara de Vereadores de Porto Alegre

Por
Sul 21
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Autolicenciamento ambiental atropela legislação federal e estadual, alertam entidades. (Foto: Ramiro Furquim/Sul21)

Coletivo de entidades (*)

O Projeto de Lei do Executivo Municipal de Porto Alegre (PLE 036/2019), referente à Licença por Adesão e Compromisso (LAC), também chamado como autolicenciamento ambiental, atropela a legislação federal e estadual, liberando atividades que hoje passam obrigatoriamente pelo crivo do órgão ambiental municipal, no caso a SMAMS.

Recente representação jurídica da Associação Brasileira de Membros do Ministério Público de Meio Ambiente questiona a LAC, inserida no novo Código Estadual de Meio Ambiente do Rio Grande do Sul (Lei Estadual no 15.434/2020). Tal ação foi encaminhada à Procuradoria Geral da República (PGR), que acatou o pleito e abriu uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) junto ao Supremo Tribunal Federal (STF) a fim de que sejam anulados artigos da referida Lei, em especial o inciso VI do Art. 54, no que toca a LAC. Segundo a ação, “Ao ser concedida apenas com base na unilateral declaração do empreendedor prestada por meio eletrônico, a LAC não se reveste das necessárias garantias exigidas para a proteção ambiental”. O documento destaca ainda que este tipo de autolicenciamento é um “simulacro de avaliação ambiental” e acusa o Estado de renunciar ao poder de polícia.

Ou seja, a atribuição do licenciamento é exclusiva de órgãos de estado, não estando sequer legalmente regulamentada no Brasil qualquer proposta de flexibilização do tema. Em nível federal, existem projetos de lei na Câmara de Deputados referentes à matéria, porém não submetidos à deliberação devido à grande polêmica decorrente do assunto. O LAC é contestado por entidades do Ministério Público, associações de técnicos da área ambiental, organizações ambientalistas e por especialistas em ecologia, e, além de ser considerado ilegal, implica em conflito de interesses por parte de técnicos privados contratados pelos requerentes das licenças, em substituição ao processo de licenciamento público levado a cabo pelo setor técnico dos órgãos ambientais, desde a Política Nacional de Meio Ambiente (Lei Federal no 6.938/1981) e a Constituição Federal de 1988 (Art. 225).

No projeto do executivo municipal (PLE 036/2019), o empreendedor e o responsável técnico assumiriam, por meio das informações contidas em estudos, relatórios e declarações, o compromisso de cumprir as condições e restrições estabelecidas pelo órgão ambiental, podendo gerar uma licença eletrônica automática, ou Declaração de Adesão e Compromisso – DAC. O procedimento eletrônico autorizaria a localização, a instalação e a operação da atividade ou do empreendimento. Entretanto, o tema dependeria também de Resolução específica de parte do Conselho Estadual do Meio Ambiente (Consema), até agora não existente. O parágrafo 1º do Artigo 54 da Lei 15.434/2020, também contestado pela PGR, determina que o Consema estabeleceria previamente os empreendimentos e as atividades que serão licenciados na forma prevista nos incisos IV e VI do “caput” deste artigo. Atualmente, inclusive, o tema da discussão da LAC foi interrompido em todas as Câmaras Técnicas do Consema, após a recente ação da PGR. Ou seja, o tema está sendo contestado na Justiça, não tendo amparo por parte de leis e normas de âmbito estadual como federal. As demais informações e critérios tampouco existem no município. A ausência de amparo legal, portanto, é evidente.

Cabe destacar também que a experiência de autolicenciamento, inicialmente incorporada nos Estados de Ceará, Bahia e Minas Gerais, além de sua fragilidade legal, mostrou-se um fracasso pela ausência de estrutura de fiscalização, gerando enorme insegurança jurídica pela falta de controle efetivo, tendo como consequência o retorno ao sistema de licenciamento por parte dos órgãos ambientais. Cabe lembrar que algumas tragédias socioambientais derivadas do autolicenciamento implicaram em evidentes crimes de negligência, resultando na morte de centenas de pessoas quando do rompimento das barragens de rejeitos de mineração de ferro nos municípios de Brumadinho e Mariana, em Minas Gerais.

Desta forma, concordando com o encaminhamento dado tanto pela Associação Brasileira de Membros do Ministério Público de Meio Ambiente como pela Procuradoria Geral da República ao STF, consideramos que o PLE 036/2019, referente ao Licenciamento por Adesão e Compromisso (LAC), é inconstitucional, representando profundo retrocesso em matéria ambiental. Assim sendo, solicitamos que o Legislativo Municipal de Porto Alegre considere as consequências prejudiciais, inclusive pela insegurança jurídica que geraria aos empreendedores, e rejeite o PLE 036/2019!

Porto Alegre, 09 de dezembro de 2020

Assinam

Acesso Cidadania e Direitos Humanos

Assembleia Permanente de Entidades em Defesa do Meio Ambiente do RS (Apedema-

RS)

Associação Gaúcha de Proteção ao Ambiente Natural – AGAPAN

Associação de Amigos de Meio Ambiente – AMA

Associação dos Funcionários da Fundação Zoobotânica do Rio Grande do Sul – AFFZB

Associação Ijuiense de Proteção ao Ambiente Natural – AIPAN

Associação de Servidores da Fundação Estadual de Proteção Ambiental

Henrique Luis Roessler – ASFEPAM

Associação Nacional de Docentes do Ensino Superior na UFRGS – RS (ANDESUFRGS-

RS)

CCD – Centro Comunitário de Desenvolvimento da Tristeza, Pedra Redonda, Vilas

Conceição e Assunção

Central Única dos Trabalhadores do RS

Centro de Estudos Ambientais – CEA (Pelotas)

Cooperativa de Trabalho Mista Solidária Utopia e Luta – Coopsul

Coletivo Cidade Mais Humana

Coletivo Prosperarte

DAIB/UFRGS – Diretório Acadêmico do Instituto de Biociências – UFRGS

Frente Pelo Clima

Grupo de Extensão Viveiros Comunitários (GVC- UFRGS)

Grupo de Voluntários do Greenpeace – Porto Alegre

GUAYÍ – Democracia, Participação e Solidariedade

Instituto Brasileiro de Direito Urbanístico – IBDU

Instituto Econsciência

Instituto Gaúcho de Estudos Ambientais – Ingá

Instituto Mira-Serra

IGRÉ – Associação Socioambientalista

Laboratório de Políticas Públicas e Sociais – LAPPUS

Marcha Mundial das Mulheres

Movimento de Mulheres Olga Benário

Movimento Preserva Belém Novo

Movimento Preserva Zona Sul – Porto Alegre

Movimento Preserva Arroio Espírito Santo

Movimento de Justiça e Direitos Humanos do RS – MJDH

Movimento de Luta nos Bairros Vilas e Favelas – MLB

Movimento Resistência Indígena do RS

Movimento Roessler para a Defesa Ambiental

Movimento dos Trabalhadores Sem Teto – MTST

NAT/Brasil – Núcleo Amigos da Terra Brasil

Núcleo de Ecojornalistas do RS – NEJ/RS

ONG Madre Tierra

ONG Resistência Participativa/Despertar Coletivo

Região de Planejamento Urbano de Porto Alegre – Região 1 (RP1) (Reg. Central de POA)

União Pedritense de Proteção ao Ambiente Natural – UPPAN

União Protetora do Ambiente Natural – UPAN (São Leopoldo)


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