Opinião
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6 de março de 2020
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22:34

Magistério, mulheres e salário baixo (por Valdete Moreira)

Por
Sul 21
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 Foto: Luiza Castro/Sul21

Valdete Moreira (*)

A profissão do Magistério vem de um processo histórico que levou à supremacia das mulheres como professoras. Uma profissão onde majoritariamente temos mulheres no seu exercício em todos os níveis. Por ser uma atividade tipicamente feminina, fizemos parte de uma estrutura ainda mais desigual, pois o machismo patriarcal permeia nossa profissão.

Compreender a supremacia feminina nessa profissão exige-nos considerar, além dos paradigmas clássicos, a dimensão microestrutural e subjetiva. Os estudos sobre gênero apontam que enquanto carreira feminina, o magistério incorpora elementos da ideologia sobre a domesticidade e a submissão da mulher. O magistério, enquanto profissão “feminina” possui especificidades de gênero e sexualidade, que o diferencia das demais profissões.

A desvalorização salarial perpassa relações de gênero, que são estruturadas pelo vínculo das mulheres com a esfera doméstica ( o cuidado), situando-as em lugares subalternos na hierarquia entre os sexos e distanciando-as da esfera pública (política salarial).

O salário baixo de uma profissão exercida majoritariamente por mulheres está, por consequência, inserido nessa estrutura machista e patriarcal. Entender isso é compreender o porquê dessa profissão ser tão atacada e ter os menores salários.

Como profissionais da educação lutamos para diminuir as desigualdades no mundo e as injustiças do sistema capitalista. A questão do machismo é tão explícita no magistério que educar confunde-se com o cuidar, a lógica é “quem cuida é a mulher e ao fazer isso faz, por amor”.

O machismo institucional na definição dos salários de professoras se revela também no preconceito diante da presença masculina em sala de aula, principalmente na Educação Básica, tanto por parte da escola, quanto por parte dos próprios estudantes. Nada está isento de ideologia. Essa torna visível que estas práticas, são excludentes e reforçam a ordem estabelecida, sem que sequer seja feito o debate sobre o papel da mulher na sociedade que é, na nossa visão, de atuação em todos os campos da vida social.

Levantar este tema é contribuir para se entender que mulheres existem, são sujeitos sociais autônomos, e o quão necessário educar nossas filhas para que lutem pelo direito de existir e pela garantia de suas liberdades.

A profissão do magistério tem que ser respeitada. Nesses tempos de grandes retrocessos e retirada de direitos no campo da educação é mais do que necessário tratar temas como este nas escolas, pois este é um espaço de transformação e de geração novas possibilidades. Todos os projetos e políticas que visem impedir ou criminalizar práticas educativas que levem à reflexão profunda sobre as construções sociais dos gêneros reforçam estereótipos e mantém a categoria do magistério em condição de inferioridade.

Em sala de aula temos de ensinar Língua Portuguesa e Matemática, História, Filosofia… e temos que ensinar as questões de gênero, as questões raciais, as questões LGBT e trabalhar o machismo e suas implicações na desconstrução de um mundo mais justo e igualitário, porque todos esses temas são importantes nesse momento histórico em que estamos vivendo.

Quando se começa a estudar esses temas, estamos empoderando grupos, dando voz a quem nunca teve voz, pessoas que vão começar a reivindicar direitos, mobilizar-se e organizar-se criticamente, num exercício de cidadania. Isso significa questionar privilégios de quem está no poder e se vê com poder ilimitado de definir até pela existência ou não da Ciência.

Nesse dia 8 de março, que se debata sobre educação e a exclusão das mulheres, que também reflete na vida de todas e todos, porque como diz Paulo Freire “se a educação não muda o mundo tampouco o mundo muda sem educação …”

Que a luta seja no sentido de garantia de direitos e melhorias salariais, sem discriminação de gênero e que homens e mulheres possam se sentir valorizadas no seu fazer educativo.

(*) Professora e Diretora de Formação Política do CPERS Sindicato

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As opiniões emitidas nos artigos publicados no espaço de opinião expressam a posição de seu autor e não necessariamente representam o pensamento editorial do Sul21.


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