Opinião
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17 de janeiro de 2020
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12:53

O capital, a tecnologia e o trabalho (por Franklin Cunha)

Por
Sul 21
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O capital, a tecnologia e o trabalho (por Franklin Cunha)
O capital, a tecnologia e o trabalho (por Franklin Cunha)
Foto: Guilherme Santos/Sul21

Franklin Cunha (*)

Vive-se hoje o maior acúmulo de capital e de tecnologia da história humana. Capital e tecnologia são irmãs siameses, um dependendo outro. No início da revolução industrial, com o advento das máquinas a vapor até nossos dias, tanto o capital quanto a tecnologia não pararam de crescer, pois ambos são processos acumulativos e um impulsiona o outro.

Nesse período também a população mundial cresceu, mas não no ritmo das acumulações do capital e da tecnologia. O ritmo do crescimento populacional está desacelerando em várias partes do mundo, inclusive no Brasil e mesmo no Terceiro Mundo em geral.( O RGS apresenta taxas de fertilidade igual às europeias, isto é, 1,6 filhos por mulher e há 30 anos que nossa população gira em torno de 12 milhões) Entretanto o ritmo de crescimento do capital e da tecnologia está em constante aumento.

No início da revolução industrial, os operários trabalhavam 16 horas por dia, sete dias por semana, por míseros salários que mal permitiam sua curta life span.

Aos poucos, com a organização da produção, das forças laborais, dos sindicatos trabalhistas e das novas tecnologias, o trabalho dos operários, aqui no Brasil baixou para 42 horas semanais e com melhores salários. Em outros países, como os europeus é de 35 horas e cinco dias da semana. Assim mesmo não há trabalho para todos. Em nosso país temos mais de 12 milhões de desempregados e 30 milhões de subempregados e 60 milhões de inadimplentes.. O país continua sendo o campeão mundial da desigualdade: 1% da população monopoliza quase 30% da riqueza, de acordo com o “Relatório sobre desigualdades globais 2018”.

As tecnologias, entretanto, continuam evoluindo e cada dia surgem novos equipamentos e sistemas para substituir a mão-de-obra humana.

Tendo-se em conta que os acúmulos de capitais e de tecnologias só se justificam em razão da existência humana (“A única finalidade da ciência é fazer o homem feliz “, Einstein), a questão que se coloca é de como, na atualidade, terá de se reinventar nova forma de divisão do capital enormemente acumulado),de sorte que beneficie com um mínimo de condições vivenciais, toda a população da Terra.

O trabalho é uma das formas de acesso ao capital, mas não a única, nem, ética e moralmente a melhor. As pessoas mais ricas do mundo, têm suas rendas oriundas da exploração do capital, não do trabalho. A discussão dessa matéria, outra coisa não é do que um jogo de forças sociais. Com mais ou menos urgência, entrará não ordem do dia em todos os países do mundo. É bom e saudável que comecemos logo a pensar nesse tema. É uma realidade de nosso tempo. As rendas continuarão crescendo e o trabalho humano diminuindo graças às tecnologias, sua inimiga apátrida e amoral. Não há como fugir deste dilema que poderá se tornar um drama social e uma tragédia global.

A questão que permanece é de como dividir a renda de forma a amparar os excluídos de qualquer trabalho ou de como reduzir as horas trabalhadas a fim de ocupar os sem-trabalho. A atual tendência comprovada na realidade do trabalho uberizado é a volta da escravidão primitiva do início do capitalismo, pois, por exemplo, os motoristas de aplicativos trabalham 15 horas diárias , sete dias por semana, sem qualquer vínculo, garantias, assistência médica por parte de patrões que empregam poucos dólares em seus investimentos e anonimamente se situam em lugares incertos e não sabidos. E as cidades agora estão sendo cruzadas por menores de idade carregando encomendas com seu único instrumento de trabalho: a bicicleta. Logo, os sem-bicicleta as estarão levando a pé. E temo que o serviço de transporte pessoal por cadeirinha, como na era da escravidão, seja restabelecido

No inicio do capitalismo, Charles Dickens, no livro Oliver Twist, descreveu admirável e factualmente este tipo de situação do trabalho humano.

E assim se cumpre o ciclo histórico previsto, no século 18, pelo gênio de Giambatista Vico.

(*) Médico, membro da Academia Rio-Grandense de Letras

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As opiniões emitidas nos artigos publicados no espaço de opinião expressam a posição de seu autor e não necessariamente representam o pensamento editorial do Sul21.


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